O milésimo golo na carreira de um jogador é algo mágico e não está ao alcance de todos. Pelé atingiu a brilhante marca dos três zeros na véspera do Campeonato do Mundo de 1970, onde levaria o Brasil ao terceiro título mundial.

A 19 de novembro de 1969, quis a história que Pelé alcançasse o milésimo golo da sua carreira na conversão de um penálti em pleno Estádio do Maracanã, num jogo entre Santos e Vasco da Gama a contar para o Torneio Roberto Gomes Pedrosa, o campeonato brasileiro da época.

Naquela noite de quarta-feira, mais de 65 mil adeptos deslocaram-se ao Estádio do Maracanã na expectativa de assistir ao milésimo golo do Rei Pelé, mas os deuses do futebol têm o condão de trocar as voltas aos mortais e de proteger os imortais, e por isso Pelé marcou o seu golo 1000 através de uma grande penalidade quase defendida por outro mortal que acabou por se eternizar: Edgardo Andrada.

O guarda-redes argentino do Vasco da Gama, que se vestia sempre de preto, sabia que se sofresse um golo de Pelé ficaria para a história, mas Andrada não queria tal destino, preferindo ser reconhecido pelos golos que travava. Com a alcunha de “El Gato”, o argentino era um autêntico felino entre os postes com grande agilidade e reflexos. Os adversários viam-no como o guardião do azar cada vez que falhavam um golo e naquela noite, Pelé teria que enfrentar “El Gato” na eterna linha dos onze metros.

O Vasco da Gama adiantou-se no marcador aos 17 minutos por Benetti. O Santos perdia, mas nas bancadas as atenções estavam todas voltadas para Pelé. Andrada não dava hipóteses ao Rei, mas acabou por ser traído por Rêne, aos 50 minutos, com um auto-golo. Menos mal, terá pensado Andrada no momento em que viu um companheiro de equipa assumir o papel predestinado ao Rei.

Mas as bancadas exigiam a coroação do Rei naquela noite de quarta-feira e num lance ainda hoje debatido no Brasil, o árbitro pernambucano Manoel Amaro de Lima, assinala grande penalidade contra o Vasco da Gama aos 79’ minutos por alegada falta de Vasco Rêne, esse mesmo que marcou o auto-golo, contra Pelé.

«Naquele dia eu enfrentei o mundo. Em campo, não se conseguia escutar sequer a respiração dos adeptos. Até os adeptos do Vasco torceram contra mim», afirmou na altura Andrada.

«Pelé cobrou. Eu bati na bola, mas não consegui defender. Depois, com o tempo, as coisas foram mudando. Já me acostumei com o facto e hoje convivo de uma forma muito boa com aquele milésimo golo», acrescentou recentemente o guarda-redes argentino.

Após a cobrança do penálti, uma autêntica massa humana invadiu o relvado para coroar o Rei do Maracanã. Entre adeptos e fotojornalistas, Pelé viu-se subitamente prisioneiro no seu próprio golo marcado precisamente às 23h11 de uma noite de quarta-feira. O jogo teve de ser interrompido, Pelé vestiu uma camisa do Santos de número 1000 e deu a volta olímpica no Maracanã e afirmou ao jornalistas: «Pensem no Natal. Pensem nas criancinhas».

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