Roberto Martínez prometeu estreias e cumpriu. Francisco Conceição e Dany Mota terão de esperar, talvez só até terça-feira, aguentem, mas Jota Silva sorriu mesmo pela primeira vez com a camisola da seleção A, num jogo tremendamente feliz para Portugal. Tudo correu bem, ou quase tudo continua a correr bem, com 11 vitórias em 11 jogos ao leme do técnico espanhol. Frente à Suécia, deu para tudo: dar palco à prata da casa, testar a defesa diante de um monstro nórdico, e marcar golos, muitos golos. Ninguém assume o favoritismo para o Euro 2024, mas caramba, como não sonhar?

O Leão é mesmo o Rei da Selva

'Aqui nasceu Portugal': é a frase inscrita no Castelo de São Mamede, em Guimarães. No D. Afonso Henriques, o passado de Portugal foi honrado - e de que maneira - no palco predileto dos conquistadores, perspetivando-se, cada vez mais, um futuro verdadeiramente promissor. Resta saber se o futuro de que falo chega já em Junho, na Alemanha.

A crónica que agora lê começou tarde, muito tarde, já a bola rolava perante a presença de quase 30 mil nas bancadas, a abarrotar de verde, vermelho e amarelo (o de Portugal, não o da Suécia). Lá fora, faltavam poucos minutos, as filas em torno do estádio, de pessoas e de carros, faziam aumentar os buzinões impacientes, ou não estivéssemos nós a falar de portugueses.

Pelo caminho, já fora do carro, que lá acabou por encontrar um sítio para ficar, muitos cachecóis - aos ombros e nas muitas bancadas de venda. A maioria? De Portugal? Logo a seguir? De Gyokeres. Sim, cachecóis de Gyokeres, esse deus sueco que já merece ser carregado aos ombros dos adeptos, ele que tantas vezes carrega os portugueses, mas só os de coração verde e branco.

Lá entrámos e a tempo do hino - arrepiante, Guimarães! E nisto o jogo começou e com sinal mais para a Suécia, seleção em reconstrução, que pela segunda vez nas últimas três edições está fora do Europeu. Mas até foi a equipa escandinava a primeira a criar perigo, ainda havia adeptos a sentarem-se. Isak cruzou para a área e Rúben Dias com um desvio acidental quase colocava a bola na própria baliza. Valeram o reflexos de Patrício, titular, um ano após a sua última aparição por Portugal, em 26 de março do ano passado, no Luxemburgo.

O início fulgurante da Suécia não teve continuidade. Depois de quase quinze minutos algo mastigados, Rafael Leão engoliu Holm, antes de desencantar Ramos, logo ali ao lado, que assistiu Matheus Nunes. O médio disparou para a defesa apertada de Olsen para canto.

O lance animava a seleção, quase sempre à boleia do rei da selva, sim, o Leão, que aos 25 minutos fez levantar o estádio. Bernardo Silva, numa excelente iniciativa individual, atirou em arco ao poste e na recarga Rafael Leão fuzilou Olsen, que não podia ter feito mais. Quarto golo pela seleção para o avançado do AC Milan.

Estava bonita a festa pá, a da seleção, que por esta altura já era presenteada com a tradicional 'Ola' mexicana. O público animava-se, a equipa deixava-se contagiar e nem dez minutos depois voltava a gritar-se golo em Guimarães. Matheus Nunes foi progredindo no terreno sem oposição, avançou, avançou, e já na área sueca rematou rasteiro para 2-0. Enorme facilitismo da defesa sueca, impávida e serena a ver Matheus jogar, e o médio não perdoou. Sem hipóteses para o guardião sueco, muito chateado com os colegas de equipa. E com razão.

E como alguém dizia, qual filósofo, 'os golos são como o ketchup', se são, e a equipa lusa não ia para o intervalo sem festejar o terceiro. Trabalho delicioso na direita de Nélson Semedo a passe de Palhinha. Acelerou até à linha e travou a tempo de levantar a cabeça e encontrar Bruno Fernandes, feliz só e abandonado, que só teve de encostar. O médio do United chegou aos 20 golos em 64 internacionalizações por Portugal.

Primeira parte de sonho: nenhuma alma lusa, em Guimarães, podia pedir mais à seleção portuguesa. Letal e incisiva quase sempre que chegou à baliza da Suécia, raras vezes capaz de se aproximar da baliza de Patrício.

A perfeição não existe. Mas a existir, seria muito próxima disto

Ao intervalo, Martínez mexeu. Mexeu e com três alterações de rajada. E ninguém diria, pelo fulgurante recomeço da partida, com a equipa igualmente coesa, ligada e segura. Portugal passeava conforto e foi já com Bruma em campo que a seleção das quinas dilatou a vantagem. Bruno Fernandes ganhou a bola a Hien, e na cara de Olsen optou por deixar ao lado para Bruma, que só teve de encostar.

O D. Afonso Henriques ainda estava ao rubro com o quarto golo português quando um estranho silêncio se abateu sobre o relvado. Sim, golo da Suécia. Sim, pelo suspeito do costume. Gyokeres não consegue mesmo acabar um jogo sem marcar, pois não? 4-1.

Um golo que caía do céu, lugar que Portugal voltaria a visitar poucos minutos depois. Aos 61 minutos, desmarcação de Nélson Semedo pela direita, cruzamento tenso para Gonçalo Ramos e 5-1 para Portugal. Tão simples que até parece mentira.

E se já era difícil escolher o momento da noite, o que dizer aquando da entrada de Jota Silva em campo aos 63 minutos? Em uníssono, Guimarães inclinou-se para fazer uma vénia à estreia do pequeno grande conquistador da cidade Berço. Ele, que aos 86 minutos esteve a uma unha negra do golo, mas Olsen impediu o apogeu da odisseia lusa na Cidade Berço.

Se a crónica parece ter apagado a Suécia do jogo, lamentamos, mas não deu para mais. Estávamos nos 78 minutos quando Nilsson, com um remate de calcanhar à Madjer, fez tremer Rui Patrício, reconheça-se, com uma exibição sólida depois da longa ausência.

Até ao final, e já com o jogo algo adormecido, o golo que faltava era para a Suécia. Mesmo em cima dos 90', era o 5-2 final.

Contas feitas: 11 jogos, 11 vitórias, 41 golos marcados e 4 sofridos.

Chegava ao fim uma noite verdadeiramente épica, em que não faltou mesmo nada. Aliás, faltou: o golo de Jota.