Dos 30 futebolistas que apareceram no primeiro dia de treinos no estágio nortenho do Sindicato dos Jogadores só três já foram profissionais. A vergonha é a principal explicação.

Aos 17 anos, foi contratado pelo Real Madrid, aos 18 estreou-se na então Superliga ao serviço do Vitória de Setúbal. Jogou no Salgueiros, Felgueiras e Leça, foi para Coreia, Bulgária e Grécia. O currículo impressiona e destoa da grande parte dos jogadores que participam no estágio do sindicato. Aos 31 anos, Filipe Cândido não vive do passado.

«Já joguei com o Eto’o, Simão Sabrosa, Deco e não consegui chegar ao patamar que eles alcançaram, mas mantenho muita ambição e muita paixão pelo jogo e é isso que me faz estar mais uma vez a dar a cara pelo sindicato», explica Filipe Cândido.

Nas três épocas anteriores, foi graças ao estágio com os jogadores desempregados que arranjou contrato.

«Nos últimos três anos fiz mais de 30 jogos, golos e boas exibições, mas, infelizmente, chega ao final da época e, por indefinições de direcção, treinadores, os clubes tardam muito em contratar jogadores e isso provoca que cheguemos a esta fase sem trabalho. A esperança é que apareça um clube com um projecto aceitável», refere o jogador que actuou na temporada passada ao serviço do Vila Meã, da II divisão.

Em Vila Nova de Gaia, entre as três dezenas de atletas que participam no estágio, só ele e mais dois jogadores são profissionais. Filipe sabe porquê.

«Conheço alguns colegas meus com mercado para as ligas principais e não aparecem nesta altura aqui porque pensam que mancha a imagem. Parece que não é muito boa onda, mas acreditem que é. Estamos numa fase de férias e isto faz com que consigamos treinar em vez de andar pelos parques da cidade», analisou.

Nandinho, o treinador do sindicato, pensa também que «o jogador profissional sente um bocado de vergonha de vir para o estágio do sindicato, pois sentem que é um desprestígio».

«Mas nós temos exemplos bem recentes de jogadores que passaram por aqui e que hoje estão no topo do futebol português. È o caso do Miguel Garcia, Paulo Santos, do Hugo Moraes que tiveram a humildade de vir estagiar e mostrar o valor deles. Se ficarem em casa à espera que o telefone toque as coisas não acontecem», garantiu.

Do Brasil, Juninho veio há quatro anos. O sonho era o de jogar futebol e de ajudar a família.

«Vim para jogar no Cabeceirense, da III divisão, mas quando cá cheguei, o clube já tinha o destino traçado da descida. Em clube que desce, geralmente não se olha para os jogadores, pois acham que são fracos», começou por explicar o jovem brasileiro, de 24 anos.

Jogou futsal dois anos e na última época representou o Cavez, clube dos distritais de Braga. Sente-se «um bocado» frustrado.

«Todos queremos vencer na vida», afirma, ao mesmo tempo que confessa ser complicado ligar para o Brasil e dizer à mãe que está tudo bem.

Neste estágio vai “brigar” por um contrato melhor, até porque a «esperança é a última a morrer». Lucas, ex-jogador do Boavista, e agora delegado do sindicato já lhe viu potencial. Assim estejam atentos os ‘olheiros’ dos clubes.