Mário Esteves Coluna nasceu a 6 de agosto de 1935 em Magude, na província de Maputo. Quando adolescente vivia no bairro do Alto Maé, quando do outro lado, no bairro da Mafalala, Eusébio brincava ainda com outras crianças.

Bicampeão europeu pelo Benfica, Mário Coluna sempre acreditou na sua equipa e partilhava com prazer a sua experiência no mundo do futebol: 'No meu tempo nós não éramos profissionais, porque o Salazar não deixava que houvesse profissionalismo no desporto”, recordou à Lusa o “Monstro Sagrado”.

Enquanto jogador, Mário Coluna revivia sempre “a grande alegria” que tomou conta dele e dos colegas, em 1961, minutos depois do apito final do encontro Benfica – Barcelona, no final da Champions. A equipa da luz venceu por 3-2 a equipa espanhola.

A conquista da Taça dos Campeões Europeus de futebol, frente ao FC Barcelona, há 50 anos, tornou o Benfica numa “equipa temível” e merecedora de “respeito internacional”, recordava Mário Coluna, autor do terceiro golo “encarnado” na final.

A vitória por 3-2 sobre o “Barça”, em Viena, a 31 de maio de 1961, foi o primeiro grande feito do Benfica a nível europeu e internacional, quebrando a hegemonia do Real Madrid, na então Taça dos Campeões Europeus.

“Houve mais respeito, temeram o Benfica, porque nós tínhamos uma boa equipa e ganhámos logo a seguir a outra Taça, contra o Real Madrid, uma das grandes equipas da Europa”, contou Mário Coluna à Agência Lusa, em Maputo, evocando a segunda vitória consecutiva, desta vez frente ao Real Madrid, na edição 1961/62.

Mas Coluna também não deixava de ter presente tristeza provocada pela desilusão das três derrotas seguintes em finais europeias. “A tristeza é natural: se uma equipa chega a uma final, é porque é boa e merece, e quando vai à final vai jogar para ganhar e assim aconteceu nessas três últimas finais. Ganharam eles, nós aceitámos, porque somos desportistas”, dizia o ex-jogador.

Segundo Mário Coluna, o mérito desse período áureo das “águias” estava nos “bons treinadores” (Bélla Guttmann e, depois, Otto Glória) e também nos próprios jogadores, todos “portugueses, da metrópole e das colónias”.

“Nós tivemos bons treinadores, eram bons psicólogos, conheciam o carácter dos jogadores que tinham. Diziam ‘o Real Madrid e o FC Barcelona não são mais do que vocês, vocês são tão bons como eles’”, recordava o ex-jogador.

O antigo futebolista do Benfica Mário Coluna foi agraciado várias vezes, com especial destaque para a atribuição do Colar de Honra ao Mérito Desportivo, que lhe foi entregue pelo Governo Português. Mário Coluna foi ainda eleito um dos 100 melhores jogadores de futebol do Séc. XX pela FIFA, instituição que o apoiou na construção de uma academia de futebol em Namaacha. A dedicação ao desporto do Monstro Sagrado traduzia-se também ao nível do empenho na formação das camadas jovens.

A amizade com Eusébio

Como Eusébio, Mário Coluna jogou com bolas feitas de trapo, como Eusébio, a ida para Portugal foi marcada pela competição entre Benfica e Sporting.

Tudo começou com uma vinda a Moçambique da equipa de Alvalade, cujos representantes falaram com o pai de Mário Coluna, um “benfiquista ferrenho”, manifestando interesse no jogador.

Isto bastou para que o pai do ex-jogador contactasse o Benfica com a seguinte mensagem: “Os lagartos querem o meu filho”. A resposta foi imediata: “Mete esse miúdo no primeiro avião”.

A ida de Eusébio para Portugal há 50 anos, lembra hoje Mário Coluna, também foi marcada pela rivalidade entre as duas equipas de Lisboa. Mas o acaso, na história de Eusébio teve um papel importante.

Eusébio queria jogar no Desportivo, ligado ao Benfica, mas acabou no Sporting de Lourenço Marques: “O roupeiro [do Desportivo], não sei porquê, disse que não havia mais equipamento para lhe dar e como o Eusébio queria jogar à bola saltou o muro”.

Os campos eram pegados e estão hoje quase abandonados, na baixa de Maputo. No meio do relvado, Mário Coluna lembrava que foi ali que o jovem jogador “foi crescendo, crescendo, foi-se desenvolvendo”, até que em 1960 “houve uma informação para o Benfica de que havia um jogador que se chamava Eusébio e era bom jogador”.

Perante o também interesse do Sporting, o representante do Benfica em Maputo levou à mãe do jogador o dinheiro que esta pedia para deixar que o jovem fosse para Lisboa. Em troca, recebeu uma carta assinada em que a mãe de Eusébio autorizava o filho a jogar em Portugal, mas só no Benfica.

Na altura, a mãe do jogador escreveu uma segunda carta, esta dirigida a Mário Coluna. “O Eusébio chegou lá e entregou-me a carta que era da mãe. Eu abri a carta à frente dele, li e quando acabei dei-lha para ele ler. O Eusébio leu a carta [e disse]: ‘A mãe está a pedir para o senhor Coluna tomar conta de mim, que aqui não conhecemos ninguém’”.

Mário Coluna assim fez. No dia seguinte levou-o à Caixa Geral de Depósitos para preencher os formulários de abertura de conta. “Eu é que fiquei com a caderneta. Todos os meses, quando ele recebia, íamos juntos à Caixa fazer o depósito e eu dava-lhe 500 escudos”, contava o histórico jogador moçambicano.

 Seguiu-se outra etapa obrigatória: “Depois levei-o ao meu alfaiate e mandei fazer dois fatos para ele. Mandei que ele escolhesse, para ele andar vestido igual aos colegas”.

Mário Coluna foi padrinho de casamento da mulher de Eusébio e foi também ele quem lhes arranjou casa, perto de onde morava na altura, em Linda-a-Velha. “[Depois do casamento] Convidei-os para irem jantar lá em casa e depois do jantar sentámo-nos na sala, trouxe a caderneta e disse: vocês agora são chefes de família, a partir de agora são vocês que vão orientar o vosso dinheiro no banco”, recordava.

O resto faz parte da história. Eusébio e Mário Coluna mantiveram-se amigos até ao fim e sempre que o “Pantera Negra” estava em Maputo encontravam-se.

Com 78 anos, Mário Coluna, o primeiro africano a erguer uma Taça dos Campeões Europeus, deixa-nos com um legado incomparável que eternizará a sua memória no coração de moçambicanos e portugueses.

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