No início do século XX, num período de desenvolvimento do futebol em Portugal, nasceram dois clubes em Lisboa que deram início à rivalidade mais emblemática do desporto português. Desde a criação dos dois emblemas, houve várias mudanças tanto no Sporting como no Benfica. No entanto, a rivalidade vivida entre os dois manteve-se transversal ao longo dos tempos. A questão coloca-se, portanto: de onde surgiu a rivalidade entre os dois clubes?

Os primeiros anos de uma rivalidade com mais de 100 anos

Os primórdios da rivalidade entre ‘leões’ e ‘águias’ datam do início em 1907 quando o Sporting recrutou oito jogadores do Benfica. Na altura, os atletas que representavam os ‘encarnados’ foram seduzidos pelas regalias que o clube de Alvalade apresentava. O que hoje se toma por garantido, em 1907 eram questões que não existiam no futebol.

José da Cruz Viegas, Emílio de Carvalho, Albano dos Santos, António Couto, António Rosa Rodrigues, Cândido Rosa Rodrigues, Daniel Queirós dos Santos e Henrique Costa foram os primeiros a trocar o na altura denominado, Sport Lisboa pelo Sporting, aliciados pelo facto de o clube de Alvalade possuir à sua disposição um balneário com água quente, um campo de futebol próprio e camisolas para combater o frio. Os equipamentos também pesaram na decisão, uma vez que, no Benfica, as bolas de futebol eram de segunda mão face às bolas novas que o Sporting dispunha.

A saída dos jogadores para o rival agudizou uma séria crise que o Sport Lisboa atravessava durante a primeira década de 1907. A situação do clube ‘encarnado’ viu o seu apogeu quando não tinha fundos para pagar a sua inscrição no Campeonato de Lisboa. À beira da extinção, Cosme Damião, Félix Bermudes e Manuel Goularde foram os responsáveis que angariaram o dinheiro necessário para manter o Sport Lisboa em funcionamento. Goularde era um dos donos da Farmácia Franco, em Lisboa, um local emblemático para a fundação do Benfica.

Primeiro Dérbi terminou com uma vitória leonina
Numa rivalidade com mais de 100 anos, o primeiro encontro entre as duas equipas é conhecido como o ‘dérbi eterno’. Em Carcavelos, decorria o mês de dezembro de 1907 quando as duas equipas se enfrentaram pela primeira vez. O Campo da Quinta Nova foi o reduto que opôs ‘águias’ e ‘leões’ pela primeira vez.

Para a história fica registada a vitória do Sporting por 2-1 no jogo que ditou o primeiro embate dos oito jogadores que deixaram a equipa ‘encarnada’ por Alvalade. Na Quinta Nova, o Sporting apresentou o seu equipamento que ficou para a história. Antes desse encontro, a equipa leonina jogava de branco. Frente aos ‘encarnados’, surgiu a primeira camisola com uma faixa verde na vertical.

Em Carcavelos, o Sporting colocou-se em vantagem cedo com um golo de Cândido Rodrigues, Eduardo Corga fez o empate para o Sport Lisboa. O golo decisivo foi marcado por Cosme Damião na própria baliza. Desde então, nos mais de 100 anos de rivalidade, os dois emblemas voltaram a enfrentar-se com vitórias para ambos os lados. No total, foram 299 encontros entre as duas equipas que atravessaram várias competições.

Rivalidade que opõe ecletismo e o povo

Uma das características da rivalidade entre os clubes da segunda circular passa pela representação popular. Tanto Benfica como Sporting são, desde os primórdios, ligados a estratos sociais diferentes. Enquanto os ‘leões’ e os respetivos adeptos estão ligados à alta sociedade de Lisboa, os adeptos do Benfica estão associados à classe mais baixa.

O elitismo do Sporting deriva do ato da sua fundação. José de Alvalade, em 1906, depois de uma querela numa assembleia geral do Campo Grande Sport Clube, decidiu que iria fundar um outro clube feito para pessoas de boa conduta. Nos estatutos de criação do clube, a boa conduta é uma das questões mais patentes. O artigo número 1 defende que o Sporting é um clube feito para “indivíduos de boa sociedade e conduta irrepreensível”.

Eusébio colocou novamente a rivalidade à prova
Na década de 60, a rivalidade entre Benfica e Sporting já estava bem enraizada na cultura desportiva dos dois clubes. Ambos os emblemas tinham crescido ao ponto de serem duas das maiores potências nacionais no desporto em Portugal. A chegada de um jovem jogador moçambicano voltou a abrir um capitulo na já longa história de disputas entre ‘águias’ e ‘leões’.

Eusébio da Silva Ferreira jogava no Sporting Lourenço Marques, atua Maputo, Moçambique. O avançado de apenas 17 anos tinha tudo tratado com o Sporting para se juntar à equipa leonina, mas os dirigentes ‘encarnados’ conseguiram ‘roubar’ o jogador ao rival. Quando Eusébio chegou a Portugal, o Benfica enviou alguns dirigentes que intercetaram o jogador e afastaram-no do Sporting.

Instalado num hotel em Lisboa, Eusébio, que vinha acompanhado pela mãe, acabou por assinar pelo Benfica deixando para trás o interesse do Sporting. A história encarregou-se do resto, uma vez que Eusébio acabou por se tornar num dos maiores símbolos do Benfica e do futebol português. O ‘King’ representou o Benfica durante grande parte da sua carreira onde esteve presente nos grandes momentos do clube ‘encarnado’.

Separados por apenas alguns quilómetros, a rivalidade entre Benfica e Sporting é uma das produtivas do futebol português. No próximo sábado, as duas equipas voltam a opor-se naquele que será o jogo 300 entre os dois emblemas. No Estádio de Alvalade está em causa um dos jogos grandes deste campeonato. Em caso de vitória, o Benfica pode dar um passo em frente rumo à conquista do tetra. Uma vitória do Sporting pode deixar o título nas mãos do FC Porto.