A b-girl Vanessa já se sente pioneira no breaking português, mas reconhece que “é muito mais doloroso a nível mental” o processo de apuramento para os Jogos Olímpicos, onde a modalidade terá uma inédita plataforma para se mostrar.

“O lugar pelos Jogos Olímpicos é sempre um bocado difícil. Nos Olímpicos, o processo é muito mais doloroso a nível mental. Nós estamos sempre habituados a treinar o físico e esquecemo-nos da parte mental”, admitiu no final de um ‘media workshop’ da modalidade, que aconteceu em Lisboa.

Vanessa Marina será uma das 40 b-girls – classificou-se no 11.º lugar - que estarão nas Olympic Qualifier Series (OQS), os torneios de qualificação olímpica para as modalidades de breaking, skateboarding, escalada desportiva e BMX freestyle, agendados entre 16 e 19 de maio, em Xangai (China), e 20 e 23 de junho, em Budapeste.

“Da média dessas duas, passam 10. Tentar ao máximo ter um bom resultado nessas duas e depois juntar ao top-6 diretamente convidado para os Jogos Olímpicos”, antecipou relativamente ao que espera das OQS.

A b-girl lusa, de 31 anos, não programou a temporada a pensar nesses dois momentos decisivos, preferindo sim encarar a qualificação como “um processo contínuo”.

“Não gosto de pensar muito além, porque, cada vez que olhamos para cima, tropeçamos num degrau e a queda é mais forte. Diria que sempre olhei para uma competição individual[mente] e acho que foi isso que me levou a ser uma das 40. Neste momento, acabei em 11.º, por isso, acho que é um bom resultado a nível mundial”, avaliou.

Vanessa confessa nunca ter pensado que o breaking pudesse tornar-se olímpico, mas defendeu que, apesar da reticência com que a notícia foi recebida por parte da comunidade da modalidade, será positivo.

“Ninguém gosta da mudança, porque ninguém sabe o que vai acontecer. Ninguém gosta de meter o pé na imprevisibilidade e no desconhecido. Eu acho que é disso que as pessoas têm mais medo. Mas o break sempre foi muito adaptado à nova geração. […] Acho que o breaking agora vai ter uma plataforma para [se] mostrar”, completou.

O breaking fará a estreia no programa olímpico em Paris2024, agendado entre 26 de julho e 11 de agosto, algo que a atleta lusa considera importante, “principalmente para as meninas”.

“Nós, num espaço muito reduzido [de tempo], no espaço dos últimos seis anos, conseguimos uma plataforma de equidade de break, que já é supermasculino, nos Jogos Olímpicos. É quase um feito histórico”, reforçou, lembrando que, aos poucos, as mulheres conseguiram afirmar-se num mundo essencialmente masculino, porque “os meninos” perceberam que estas não iam “tirar nada a ninguém”, só adicionar.

Esperando que o Comité Olímpico Internacional reequacione a decisão de retirar este desporto do programa de LosAngeles2028, até porque há cada vez mais marcas a investir no breaking, depois de terem visto que era “muito mais do que limpar o chão”, a b-girl portuguesa congratulou-se por finalmente (e desde o ano passado) poder dedicar-se a ‘full time’ à sua paixão.

“Agora, tenho tempo para fazer tudo, para ser bailarina a tempo inteiro. Eu acho que tem de haver muito uma combinação de mente e corpo. Eu não tinha terapia, por exemplo. Não sabia lidar com a pressão, já que agora temos um ambiente muito mais competitivo. Então, comecei a ter sessões de terapia, sessões de personal training, mais focadas no tipo de movimentos que fazemos mais acrobáticos. Eu não sou uma b-girl tão acrobática. Então, também resolvi com este apoio praticar e investir numa das minhas fraquezas”, revelou.

Para Vanessa, tem sido “super interessante” ter a possibilidade de ser bailarina a tempo inteiro, mas nem por isso sente o peso de poder ser pioneira para o país em Jogos Olímpicos.

“Acho que já sou pioneira em Portugal em muitas coisas. É através do exemplo que incentivamos mais meninas a tentar. Claro que é sempre muito mais difícil quando somos a primeira, acho que levamos com muitas afrontas, obstáculos, mas é esse o objetivo: tentar pavimentar uma área não tão difícil para a nova geração”, realçou.