José Costa e Jorge Lima, os únicos qualificados da vela para Tóquio2020, manifestaram a sua apreensão pelo estado da modalidade em Portugal, lamentando que se tenha delapidado o passado de uma ‘geração de ouro’.

“Houve uma ‘geração de ouro’ da vela portuguesa. Eu, que neste momento sou mais velho, fui o benjamim, o último que, ‘à rasquinha’, por sorte ou por azar, conseguiu beber dessa ‘geração de ouro’ os últimos resquícios de conhecimento, atitude, perseverança, que me levaram a estar aqui. Dessa geração, pouco foi passado”, lamentou José Costa.

O velejador algarvio responsabilizou a anterior direção da Federação Portuguesa de Vela por esta situação, defendendo que a equipa presidida por José Manuel Leandro fez “um trabalho pobre” e que a política seguida “não foi a mais correta”, em termos “não só de apoio, mas na canalização dos mesmos” para resultados em “classes que não têm expressão” e não para a vela olímpica.

“Deixa-me mesmo muito triste, até porque estou com 39 anos e não vou andar aqui muito mais tempo. Provavelmente, serão os nossos últimos Jogos. Até ao momento, somos a única equipa qualificada e isso é, inequivocamente, o reflexo da vela nacional”, afirmou Jorge Lima, ao ser questionado sobre o facto de ele e o seu parceiro terem a única embarcação apurada para Tóquio e serem os únicos velejadores do projeto olímpico.

O irmão mais novo de Gustavo Lima, o velejador que foi quarto classificado na classe Laser nos Jogos Olímpicos Pequim2008, apontou a emigração dos velejadores da ‘geração de ouro’ – além do seu irmão, também Hugo Rocha e Álvaro Barreto, bronze na classe 470 em Atlanta1996, e Álvaro Marinho, quinto na mesma classe em Sydney2000, estão a trabalhar noutros países – como outro dos reflexos do estado da modalidade.

“Outro pormenor que não ajuda muito é que os treinadores que estão em atividade não são ex-velejadores que tenham tido grandes resultados. Os nossos grandes velejadores estão a trabalhar para o estrangeiro, estão a dar a outros aquilo que deviam ser os nossos a receber”, sustentou.

Jorge Lima defendeu que se as equipas mais jovens pudessem receber conhecimento dos grandes velejadores do passado recente, dariam “um salto enorme”.

“Penso que, neste momento, da parte da federação [presidida por António Roquette], existe um esforço para tentar inverter isso, no entanto, penso que a filosofia mudou há alguns anos e ainda não conseguiu ser revertida. Institucionalmente, há sempre muitas burocracias, muitas complicações, muitas guerras, que é uma coisa que eu lamento, mas acho que o maior problema passa pelas camadas mais jovens. Acho que os clubes não estão a conseguir motivar crianças para prosseguir quando se iniciam na vela e, nesse aspeto, parece que há uma desmotivação geral”, analisou.

Para o velejador de Cascais, a solução passaria por haver “mais dinheiro” e “mais empenho de quem está, neste momento, em atividade”, enquanto para José Costa deveria haver uma menor intransigência quanto à formação de técnicos.

“Ao tentarmos implementar uma carreira de treinador, com uma formação específica, tão regulamentada e restrita, estamos a subaproveitar essa ‘geração de ouro’, [velejadores] que são sobejamente conhecidos em todo o mundo e que toda a gente quer contratar, e Portugal diz que até os reconhece, mas sem o curso não podem fazer nada”, justificou, estimando que não deveria haver tanta intransigência com “aqueles que têm o maior grau de conhecimento no país” e que se vêm forçados a emigrar, deixando a vela entregue a treinadores “medianos ou medíocres”.

Jorge Lima e José Costa asseguraram uma vaga na competição de 49er em Tóquio2020, com a classificação para a regata das medalhas nos Mundiais de classes olímpicas de vela de 2018, em Aarhus, na Dinamarca.

Nos Jogos Olímpicos Rio2016, Portugal esteve representado na vela pelo duo agora qualificado, assim como por Gustavo Lima (Laser), João Rodrigues (RS:X) e Sara Carmo (Laser radial).