Ponto prévio: o Leicester que esteve no Estádio do Dragão não foi aquele que fez história na Liga inglesa da última época. Também não foi aquele que, em época de estreia na Liga dos Campeões, assegurou de forma brilhante o primeiro lugar do grupo com uma jornada por disputar. Não houve Vardy, houve Musa. Não houve Mahrez, houve Gray. Nem sequer houve Kasper Schmeichel ou Islam Slimani, este último uma aquisição já da época atual. Foi outro Leicester, sim, com segundas linhas e, além disso, pouca motivação para evitar o desfecho que se verificou.

Agora que o elefante metafórico já não está na sala, foquemos em algo inegável: o FC Porto fez um jogo de alto nível e podia até ter marcado mais. Depois de uma série de cinco jogos com apenas um golo marcado - o 'tal' golo de Rui Pedro - os 'dragões' fizeram uma exibição imaculada a nível ofensivo e presentearam os adeptos com uma saborosa goleada. Ainda mal o hino da Champions havia acabado de tocar e já controlavam a partida e demonstravam indícios daquilo que se verificaria ao longo de 90 minutos, um domínio avassalador coroado com a eficácia na finalização que tantas vezes faltou nos últimos tempos.

A grande nota de destaque no onze portista deu pelo nome de Yacine Brahimi, o tal que brilha nos palcos da 'Champions' mais do que em qualquer outro e que, novamente, correspondeu neste contexto, trazendo aos portistas a memória do compatriota Rabah Madjer. Mas já lá vamos.

Apito inicial, de imediato mais posse para o FC Porto. O Dragão começava desde cedo a fixar os olhos na presa, uma raposa menos habilidosa do que o habitual mas igualmente apetecível. E o primeiro golpe não tardaria. Corona bate um canto pouco depois dos cinco minutos e André Silva cabeceia a crise de golos a nível individual com veemência, abrindo o marcador. Desde logo se via que este FC Porto não estava para brincadeiras nem com vontade de esperar para ver o desfecho do outro jogo do grupo, na Bélgica.

Entrou o primeiro, procurou-se o segundo para deixar os 'oitavos' mais próximos. Diogo Jota falhou por pouco, Danilo falhou por muito e Corona...Corona acertou em cheio. Um cruzamento de Alex Telles encontrou o pé esquerdo do destro mexicano e a bola dali partiu rumo ao canto da baliza (pouco) defendida por Ben Hamer. O segundo golo do jogo e o primeiro golaço.

Da arte mexicana passaríamos à arte magrebina ainda antes do apito para intervalo. Corona lançou Maxi, que cruzou rasteiro e Brahimi lá apareceu com o tal toque 'à Madjer'. Um desvio de calcanhar de grande classe a fechar uma primeira parte de luxo e a transportar os quase 40 mil adeptos para o Prater de Viena.

Com o resultado avolumado a intervalo, o FC Porto podia ter abrandado o ritmo na segunda parte. Podia, mas não o fez, porque a caça à raposa corria demasiado bem e os adeptos iam apreciando o espetáculo. O Leicester ainda deu um pequeno ar da sua graça nos primeiros cinco minutos, permitindo a Okazaki e Gray mostrarem-se a Ranieri, mas pouco durou. Diogo Jota ameaçou o quarto do jogo, Brahimi fez o mesmo e Drinkwater puxou André Silva em zona proibida. Foi precisamente o '10' portista que transformou a leve goleada (3-0) em goleada a sério (4-0), com um penálti bem convertido para o 'bis' no encontro.

E haveria ainda tempo para completar a mão cheia de golos, com assinatura de Jota, também ele um dos elementos em destaque no ataque portista, assim como Silva e Corona. André Silva assistiu o seu já habitual parceiro no ataque e o remate forte acabou no fundo das redes de Hamer. Não havia já quaisquer dúvidas: esta era uma noite de festa no Dragão e ainda houve tempo para o jovem Rui Pedro se juntar às celebrações da passagem aos oitavos-de-final da prova milionária.

O momento do jogo:

O golo de Brahimi: O golo inaugural de André Silva alterou o rumo do jogo por ter sido o primeiro e o de Corona foi direto para o 'best of' do jogador mexicano, mas por ter transportado os adeptos de volta a 1987 o toque de Brahimi merece ser destacado em lugar privilegiado. O argelino não parece ter sempre uma relação fácil com adeptos e equipa técnica, mas quando é este Brahimi que aparece não há como negar o talento do jogador argelino.


Os melhores:

Jesús Corona: Um pouco como Brahimi - embora não de forma tão gritante - continua a guardar o seu melhor para as noites de Liga dos Campeões. Na noite de quarta-feira viu-se a melhor versão do mexicano, que juntou a técnica à vontade e à eficácia, com um grande golo pelo meio. Assistiu André Silva para o primeiro golo e de seguida apontou um golaço de primeira, "com o pé que estava mais à mão", citando uma referência da história do clube. Foi ainda parte essencial do lance do golo de Brahimi e saiu aos 76 minutos perante uma ovação mais do que merecida.

André Silva: Já a grande referência do ataque do FC Porto aos 21 anos de idade, o avançado atravessava uma seca talvez relacionada com o nível de pressão do árduo papel que lhe foi imposto. Mas tal como no caso de Corona, viu-se no Dragão a melhor versão do ponta-de-lança, frio e eficaz como nas suas melhores noites. Logo aos seis minutos cabeceou para o primeiro do jogo e no segundo tempo bateu uma grande penalidade com a eficácia que faltara nas duas últimas tentativas a partir da marca de 11 metros.


Os piores:

Leicester, no geral: A equipa inglesa tinha já o primeiro lugar assegurado e apresentava-se no Dragão sem muitas das suas principais referências, mas um detentor do título da Premier League tem de honrar esse rótulo. Os jogadores menos utilizados por Ranieri tiveram uma oportunidade de ouro para reforçarem a candidatura ao 'onze' e, no geral, desperdiçaram-na. Não houve convicção, não houve disputas de bola acesas, não houve nada daquilo que fez com que fãs do desporto por todo o mundo dissessem, na última temporada, com orgulho: "Este ano sou do Leicester".

As reações:

Nuno Espírito Santo: "É motivo de orgulho para todos"
Óliver Torres: "Todos juntos conseguimos o objetivo"
Maxi Pereira: "Vitória contra o Sp. Braga deu um empurrão anímico"
Brahimi: "Vitória vai dar mais confiança para os próximos jogos"
Corona: "Estamos a libertar toda a pressão"

Curiosidades:

- André Silva não marcava desde 2 de novembro, dia em que decidiu o encontro frente ao Club Brugge, também na Liga dos Campeões.
- O '10' portista converteu com sucesso uma grande penalidade depois de tentativas falhadas contra Sp. Braga e Chaves, no segundo caso no desempate a partir da marca de 11 metros.
- Desde 1993/94 que o FC Porto não estava durante três jogos consecutivos de uma fase de grupos da Liga dos Campeões sem sofrer golos.
- Iker Casillas passou a ser o jogador com mais vitórias na Liga dos Campeões, incluindo qualificação e fase final, somando 97. O guarda-redes espanhol ultrapassou o compatriota Xavi.
- Esta foi a maior goleada de sempre do FC Porto frente a uma equipa inglesa e a derrota mais pesada de sempre de uma equipa inglesa na história da Liga dos Campeões.