A província do Cuando Cubango conheceu em 2016 um dos momentos mais altos no capítulo desportivo, marcado pela participação do Futebol Clube 4 de Abril no campeonato angolano da Primeira Divisão. Porém, foi também neste ano que viveu a desilusão da descida.

A promoção desta formação ao Girabola2016 encerrou um período de "defeso" de 18 anos consecutivos, uma vez que a última vez que a província teve presença na I divisão foi em 1997, com o Clube Desportivo Chicoil do Cuando Cubango, que não fugiu à regra: subiu e desceu no mesmo ano.

Numa odisseia de muitos "altos e baixos", a derrocada do 4 de Abril consumou-se na última (trigésima) jornada ao perder por 0-2 frente ao Atlético Sport Aviação (ASA), numa altura em que bastava o empate para a manutenção.

De ouvidos no rádio e olhos no televisor, os aficionados do desporto-rei na província, que não se conseguiram deslocar à capital do país para apoiarem a sua equipa do coração, seguiam atentos e ansiosos ao desenrolar da contenda que ao intervalo era favorável ao 4 de Abril (0-0).

O golo de Minguito aos 50 minutos começou por destronar o aguerrido conjunto que nunca “virava a cara” à luta, mesmo em situações adversas. Em desvantagem, a equipa lançou-se completamente ao ataque, já que a derrota significava despromoção.

Na corrida para o empate, o 4 de Abril voltou a ser apanhado em contramão com o dianteiro do ASA Amarildo a marcar o segundo golo, aos 63 minutos, selando o resultado favorável ao único totalista do Girabola, a par do 1º D'Agosto, por terem participado nas 38 edições da prova já realizadas.

Em Menongue, os adeptos do "Clube da Paz" já preparavam uma passeata, mas a inexperiência dos pupilos do decano dos treinadores nacionais, João Machado, não permitiu.

O apito final do árbitro Armando da Silva confirmou a despromoção. Apesar da dor, souberam aceitar a realidade num verdadeiro espírito de fair play.

A tradição mantém-se: coincidência ou acaso, as equipas do Cuando Cubango ascendem e não conseguem manter-se na competição.

Numa equipa forjada no espirito de união e ajuda mútua, sem estrelas conhecidas, a única que mais cintilava era justamente o técnico João Machado. O nome representa a personalidade de um indivíduo que conhece profundamente o futebol angolano e que deu o melhor de si, quer para a ascensão do clube, como para a manutenção deste no Girabola.

Apesar da força de vontade dos atletas e equipa técnica, a falta de salários, prémios de jogo e incoerência administrativa não conseguiram acompanhar a dinâmica desportiva, tendo contribuído significativamente para o insucesso da equipa na parte final da competição.

O técnico João Machado não poupou críticas à direção do clube, tendo mesmo atribuído culpas à gestão do clube pela descida por não cumprir com as suas responsabilidades financeiras.

O percurso rumo ao Girabola

Para ascender ao campeonato angolano da Primeira Divisão, o clube teve um percurso de sucesso fruto da dinâmica e trabalho empreendido pela equipa técnica, atletas e os membros co-fundadores.

O facto tornou-se possível depois de uma aposta do governo provincial, que gizou um programa dirigido tecnicamente pelo consagrado técnico e também apelidado "decano dos treinadores nacionais", João Machado, que passou a dirigir o Clube Desportivo 4 de Abril do Cuando Cubango nas competições da segunda divisão desde 2013.

De lá para cá, crescia a expectativa dos dirigentes da província, profissionais de futebol envolvidos na odisseia, adeptos e população em geral, que ansiosos de verem o seu clube a ascender à primeira divisão, mantiveram sempre a crença na concretização de tal desejo.

Entre 2013 a 2014, a equipa disputou com todo zelo e dedicação a segundona, imbuída no espírito de participação, mas sem lograr a subida para a maior prova de desporto coletivo do país.

Em 2015, depois de um considerável traquejo e entrosamento no plantel, a equipa redefiniu os objectivos com uma estratégia técnica virada exclusivamente para a ascensão à primeira divisão.

O Clube Desportivo 4 de Abril disputou neste ano, o campeonato nacional de futebol da segunda divisão, na série B, ao lado da Casa Militar também do Cuando Cubango, 1º de Maio e Jackson Garcia de Benguela e JGM do Huambo, tendo obtido o segundo lugar no grupo.

Dada a posição, disputou a "liguilha", jogada em duas mãos com o Ismael FC do Uíge, tendo vencido num agregado de 4-0, sendo na primeira mão em casa 2-0 e na segunda no Uíge com o mesmo resultado.

Neste último jogo, um dado curioso foi o facto de a partida ter sido disputada em dois dias, ou seja, no sábado, 3 de outubro até aos 75 minutos de jogo, tendo sido interrompida pelo árbitro da partida devido à enorme chuva que impedia a prática normal do futebol, sendo que no domingo 4, o jogo reatou para a conclusão dos últimos 15 minutos de consagração do 4 de Abril.

Receção do único representante da província ao Girabola

Naquele dia (10/10/2015), a sua chegada à província a equipa que tinha como presidente o empresário Humberto George foi recebida em apoteose, como campeã. Aliás, foi mesmo a campeã da "liguilha".

Daí, com a merecida taça na mão e medalhas ao peito, os jogadores e equipa técnica foram recebidos no terminal militar do aeroporto Comandante Cuenha, em Menongue, pelo vice-governador para o setor político e social, Pedro Camelo, distintos diretores provinciais, membros da defesa e segurança, atletas de distintas modalidades e população em geral, que após a receção, dirigiram-se para uma passeata pela cidade.

A passeata que anunciava a ascensão e participação da equipa na primeira divisão estendeu-se por longas horas, pelas principais artérias de Menongue, oferecendo momentos únicos de muita alegria e euforia, que convidava a participação de todos os munícipes, num momento que ficará para sempre na memória dos amantes do desporto rei.

Crianças, jovens e adultos, cada um à sua maneira, faziam tudo para eternizar aquele momento, através das famosas "selfies" que eram imediatamente enviadas e partilhadas pelas redes sociais.

Naquele célebre momento, o município de Menongue ficou pintado com as cores do clube, todos falavam a mesma linguagem, defendiam os mesmos ideais e confirmaram ser adeptos de um clube: o 4 de Abril do Cuando Cubango.

O 4 de Abril é sem dúvida um clube cuja alegria e entretenimento que proporcionava à sociedade "menonguense" vai certamente proporcionar saudades aos aficionados do futebol da I divisão.

O percurso da equipa no Girabola

Em 30 jornadas disputadas, o repesentante do Cuando Cubango classificou-se na 14ª posição, obteve seis vitórias e averbou 11 derrotas e 13 empates, tendo marcado 21 golos e sofrido 27, um saldo negativo de seis.

Envolvido numa crise financeira, o clube, que tudo fez na luta pela sobrevivência, experimentou muitas situações anómalas e de difícil prognóstico. Em muitos casos, os jogadores disputavam os desafios apenas pela sua própria honra e por respeito aos adeptos e massa associativa.

A verdade porém é que muitas vezes não existiam as condições objetivas que motivassem os jogadores e equipa técnica a exercer o seu papel. Para dar sustentar este argumento, basta lembrar que a relação entre equipa técnica e direção não gozava de boa saúde. O incumprimento no pagamento de salários e prémios de jogo, era apontado como a principal razão.

Ainda assim, os jogadores não deitaram por terra a possibilidade de granjear alegrias aos adeptos que acorriam às centenas ao estádio municipal de Menongue, brindando-os com exibições de encher os olhos, como a vitória sobre o poderoso Kabuscorp do Palanca por 3-1 e o nulo com o então líder 1º de Agosto.

Nesta fase, já não suavam pelo dinheiro. Aliás, este já não existia. Trabalhavam no entanto com esforço e abnegação, apenas por "amor-próprio, à camisola e aos adeptos".

A crise financeira que assolava o clube viria a ser publicamente conhecida no dia 18 de julho do corrente ano, quando o presidente da mesa da assembleia-geral do clube, Ernesto Kiteculo, durante uma conferência de imprensa, anunciou a possível desistência por razões financeiras.

Na altura a equipa ocupava a 14ª posição do Girabola2016 com 16 pontos em 17 jogos, fruto de três vitórias, sete empates e igual número de derrotas.

A desistência não foi oficialmente endereçada à Federação Angolana de Futebol (FAF), por isso persistia a dúvida em cada partida disputada, ao mesmo tempo que os patrocinadores foram ajudando a manter a equipa na prova.

Foi num clima de dúvida quanto à continuidade ou desistência e de falta de pagamentos de salários e prémios de jogo que o 4 de Abril lutou até à última jornada, que terminou com derrota 0-2 ante ao ASA.

Em face de tudo isso, é caso para questionar se o 4 de Abril tem como sobreviver na "segundona", e para quando novamente o Cuando Cubango na Primeira Divisão?