O médio André Martins, que atua nos polacos do Legia de Varsóvia, assumiu esta segunda-feira “emoções mistas” pelo primeiro jogo disputado à porta fechada na carreira, um “mal necessário” presente na retoma da I Liga de futebol.

“Foi diferente de tudo aquilo que já vivi. O futebol perde muita emoção, até porque os adeptos trazem várias vezes uma motivação extra. Por muito que os jogadores queiram, às vezes, é impossível atingir aqueles níveis de motivação e concentração típicos dos jogos com público. Foi como se estivesse num amigável de pré-época contra uma equipa que não tem adeptos”, admitiu à agência Lusa o centrocampista internacional português.

André Martins, de 30 anos, cumpriu 67 minutos no sábado, quando um tento solitário do avançado checo Tomás Pekhart selou o triunfo no terreno do Lech Poznan (1-0) e permitiu aos ‘militares’ cimentarem a liderança isolada do campeonato polaco, suspenso desde 13 de março devido à pandemia de covid-19 e reatado ao fim de 77 dias.

“Até nos têm pedido atenção para festejar os golos, mas o futebol é tão emocional que é muito difícil que os jogadores não se abracem nestes momentos. Celebrámos o golo, mas sem a mesma alegria que temos quando há adeptos no estádio. Apesar de nunca ser a mesma coisa, é sempre um golo e uma vitória importante que fica na história”, valorizou.

No estádio de Poznan, que alberga cerca de 44.000 espetadores e recebeu três partidas do Euro2012, o médio com formação repartida entre Argoncilhe, Feirense e Sporting defrontou o compatriota Pedro Tiba com “pouco mais de 20 pessoas” à volta do relvado e ficou surpreendido pela ausência de adeptos em torno do recinto.

“Até pensámos que alguns adeptos do Lech iam estar nas imediações do estádio para apoiarem a equipa deles e tentarem destabilizar-nos um pouco, mas as pessoas têm cumprido à risca as regras impostas pelo Governo. Talvez seja por isso que não haja tantos casos quanto se esperava”, abordou, sobre um país com 1.064 mortos em 23.686 infetados.

De acordo com o desconfinamento proposto pelo executivo de Mateusz Morawiecki, o Legia teve de prescindir de alguns membros da estrutura e trocou a habitual deslocação num comboio de alta velocidade por um autocarro de dois andares, mesmo efetuando duas viagens de cinco horas entre Varsóvia e Poznan sem exames ao novo coronavírus.

“Na terça-feira fiquei no banco no jogo dos quartos de final da Taça [vitória sobre o ‘secundário’ Miedz Legnica, por 2-1] e foram seis horas para lá e para cá. As viagens são muito longas e não é fácil fazer a despistagem com tantos jogos num curto período. Para já fizemos quatro baterias, mas seremos testados regularmente”, apontou André Martins.

Os jogos à porta fechada também vão assinalar o regresso da I Liga, que vai ser reatada sob fortes restrições na quarta-feira, com o embate entre Portimonense e Gil Vicente, o primeiro dos 90 jogos das últimas 10 jornadas, que decorrem até 26 de julho e vão estimular “trabalho de habituação” a um “contexto estranho e que não desconcentra”.

“Temos de jogar um jogo atrás do outro e perceber que as coisas vão ser assim. Após dois meses em casa, os futebolistas tiveram poucas semanas de preparação, mas os jogos e treinos ajudarão a atingir os níveis físicos pretendidos. No plano mental é a mesma questão e o nosso primeiro jogo em casa vai colocar-nos à prova”, assumiu.

A receção ao Arka Gdynia, em 10 de junho, será o último desafio do Legia em Varsóvia para a fase regular da Liga, que lidera com 54 pontos, mais oito do que o campeão Piast Gliwice, antes do ‘play-off’ com os sete primeiros classificados, em que os ‘militares’ apontam ao 14.º título, igualando os recordistas Wisla Cracóvia e Górnik Zabrze.

“Os adeptos enchiam o estádio, apoiavam do início ao fim e, muitas vezes, ajudavam a virar resultados menos positivos. A porta fechada é sempre uma pequena desvantagem para quem joga em casa, mas não influencia o rendimento nem será por aí que os visitados irão perder ou ganhar”, frisou o ex-médio de Real Massamá e Belenenses.

A viver a segunda temporada na capital polaca, na companhia do compatriota Luís Rocha, André Martins procura repetir o sabor da conquista experimentado em 2016/17 pelos gregos do Olympiacos, aguardando com expectativa pela execução da promessa governamental de reabrir 25% da capacidade dos estádios a partir de 19 de junho.

“Esperamos e queremos que as coisas melhorem muito para que seja permitido ter alguém no estádio na altura de festejar o título. Não me imagino de maneira nenhuma celebrar um campeonato só com os meus colegas e sem adeptos. No fundo, é por estas pessoas que nos apoiam todos os dias que jogamos e queremos ganhar”, avaliou.

A medida foi solicitada pela federação há uma semana e anunciada pelo Governo na sexta-feira, fixando a Polónia como a quarta nação europeia a permitir a presença condicionada de público nas bancadas depois da paragem competitiva motivada pela covid-19, depois de Ilhas Faroé (16 de maio), Hungria (dia 28) e Sérvia (01 de junho).

“Também mereciam festejar connosco, mas vai ser o que tiver de ser e temos de estar mentalizados para isso”, terminou André Martins, que ainda coabita na ‘Ekstraklasa’ com os lusos Tiago Alves (Piast Gliwice), Rafael Lopes (Cracóvia), Tomás Podstawski (Pogon Szczecin), Flávio Paixão e Zé Gomes (Lechia Gdansk) ou Ricardo Guima (Lodzki).