Deu que falar pela primeira vez no Sporting com um fantástico golo na estreia pelos 'leões', na Liga Europa, em Eindhoven, frente ao PSV (uma das melhores memórias que diz guardar na sua ainda curta carreira). Na temporada passada brilhou na II Liga, com dez golos na caminhada do Rio Ave rumo ao regresso ao 'convívio dos grandes' (mais outro momento especial, confidenciou-nos). Esta temporada seguiu para Itália, para uma segunda experiência no estrangeiro (passou pelos espanhóis do Almeria em 2019/20), contratado pelo Ascoli, da Serie B, onde já marcou presença em quatro jogos
Foi a partir da sua nova casa, a cerca de 20 minutos da cidade de Ascoli Pisceno, que esteve à conversa com o SAPO Desporto para falar sobre os primeiros tempos num país onde nunca tinha estado e onde viveu já algumas aventuras, mas de que está a gostar bastante e no qual diz ter sido bastante bem recebido.
A mudança: um país desconhecido e as desventuras dos primeiros dias em Itália
"Os primeiros tempos estão a ser bons. Receberam-me bem! Acho que as pessoas aqui em Itália são muito 'terra a terra', são muito como em Portugal. Gostam de ajudar, de receber e, portanto, fui muito bem recebido aqui. Não estava a espera que corresse tão bem e gostei muito. Agora que já acabaram as mudanças - já estou na casa onde vou ficar, já tenho carro e tudo - posso focar-me a 100 por cento no futebol", começou por nos dizer, mostrando sempre boa disposição.
Itália era um país onde Pedro Mendes nunca tinha estado, mas que tinha muita curiosidade em conhecer. Agora tem oportunidade de o fazer e não esconde o seu contentamento por isso.
"Por acaso Itália era um dos países que nunca tinha visitado e já fui a vários países, em lazer ou mesmo com clubes e seleções, mas em Itália nunca tinha estado. Agora certamente irei ficar a conhecer. Estou a gostar! Ascoli é uma cidade maior do que esperava, muito rústica, muito bonita e com muita histórica. Mas eu por acaso estou numa parte mais perto da praia, a 20 minutos, e estou a gostar bastante", sublinha.
"Felizmente, tinha propostas um pouco de todo o mundo, de vários países, mas Itália é, claro, um país muito chamativo em termos de futebol e eu já via muito futebol italiano. Surgiu esta hipótese de jogar na Serie B e aqui em Itália dão muito valor à Serie B. Não sabia falar italiano, por isso é também uma boa forma de vir aprender. Foi fácil dar o 'sim' ao Ascoli. Foi uma boa solução. E aqui estamos…", acrescentou.
Mala retida, o stress dos primeiros dias e...chuteiras emprestadas pelos colegas
Habituado a viver longe de 'casa' desde que saiu de Guimarães, sua cidade natal, para se mudar para Lisboa e para o Sporting, Pedro Mendes garante que não estranhou mais esta mudança de ares.
"Eu saí de casa aos 18 anos, por isso já estou habituado e isso ajudou a acostumar-me a estas mudanças rápidas e drásticas, do tipo 'Ah, agora tenho de ir para aquele país viver…'. Claro que a família e os amigos me perguntaram 'Então vais para Itália assim, do nada?'. E eu expliquei que sim, que tinha de ser, que era o meu futuro. Mas foi bom, acabou por ser fácil. Acho que foi uma boa escolha", reforça.
Mesmo preparado para a mudança e confiante na escolha tomada, não faltaram, claro, as peripécias que sempre acabam por surgir nestas alturas. E, quando aterrou em Itália, para uns primeiros dias "de correria de um lado para o outro", as suas malas não chegaram consigo.
"Os primeiros dias foram um pouco stressantes, como em todos os clubes. Mal assinei e viajei para Itália tive de seguir com a equipa para Palermo", explica Pedro Mendes.
"Aterrei em Roma, segui para Ascoli e fomos logo para Palermo, porque tínhamos um jogo e o 'mister' e o clube decidiram que eu ia direto, para estar com a equipa e ver o jogo. Foi decidir o número de camisola, ver do que precisava, escolher a casa. Mas foi tudo muito bom da parte do Ascoli", conta.
"E ainda me ajudaram mais, porque vivi uma situação que agora acho engraçada, mas não teve graça nenhuma: as minhas malas ficaram retidas em Madrid, as duas, onde eu tinha chuteiras, tinha tudo. Tive de ir fazer a requisição, mas em Itália não falam muito bem inglês e eu ainda não falo italiano. Então foi complicado e nos primeiros cinco dias andei sem malas! Vestia roupa do clube, fatos-treino e calçava chuteiras de colegas. Só tinha o meu 'necessaire' e coisas de higiene básicas. O que me safou foi mesmo a roupa do clube!", recorda a sorrir.
O dia a dia em Itália: pizzas e muita massa, passeios à beira mar e jogos de computador online com os amigos
Peripécias ultrapassadas e questões mais prementes resolvidas, Pedro Mendes começa agora a ter oportunidade de conhecer melhor as redondezas. O seu dia a dia é passado, em grande parte, na Academia do clube, mas sobra tempo para ocupar os tempos livres e passear. E o avançado está a gostar do que tem visto.
"Agora já está tudo mais tranquilo. De manhã acordo cedo, tenho de me levantar às 7h30 para estar na Academia. Tomamos lá o pequeno almoço, fazemos os pré-treinos (ginásio, vídeos e palestra) depois temos o treino (a Academia tem excelentes condições) e depois almoçamos lá no clube. À tarde fazemos mais ginásio e depois volto a casa, por volta das 15h00", resume, explicando como é o seu dia-a-dia no Ascoli.
"À tarde, depois de chegar, ou vou dar uma volta ali à praia, ou fico por casa a jogar. Eu gosto muito de jogar, que também é uma forma de estar em casa descansado. Jogo muito FIFA e 'FPSs' como 'Call of Duty 'ou 'Counter Strike'. Também jogo MotoGP. Gosto de vários tipos de jogos até porque jogo online com os amigos, estou em videochamada com eles e é uma forma de descansar e ao mesmo tempo estar em contacto com eles", conta.
Ascoli Piceno, uma cidade "rústica, com muita histórica"
Ascoli Pisceno é uma cidade italiana com cerca de 50 mil habitantes (93 mil contando com os arredores) e fica situada no Centro Este de Itália, a menos de 40 Km do Mar Adriático e praticamente em linha com Roma, mas do lado oposto do país (a capital fica a cera de 200km de distância de carro). Pedro Mendes fala de uma cidade e de uma região que vale a pena visitar.
"É uma cidade com muita gente, comparada com outras cidades desta dimensão em Portugal. É uma cidade rústica, com muita histórica. Eu estou mais na parte para o lado da praia e durante a tarde tenho conseguido ir lá dar uma volta à praia quase todos os dias. Se estiver chateado ou aborrecido basta ir à praia passear e dá para ver muitas coisas. Quem vier para estes lados não pode deixar de visitar o centro da cidade, muito ao estilo do que se pensa das cidades italianas, com monumentos clássicos e históricos. Mas sugiro que vejam também esta parte da praia, que para além de ser muito bonita e ter uma água muito boa, tem bastantes sítios para passear", aconselha.
Mas, claro, não há nada como a nossa cidade natal. "Eu gostava muito de viver em Guimarães, apesar de quando era mais novo dizer que queria ir para Lisboa. Mas quando fui, percebi o quanto gostava de viver em Guimarães. Porque Guimarães também tem um pouco de tudo. É uma cidade pequena, mas tem tudo o que precisas. Até tem praia a 20 minutos, mais ou menos...claro que a água é bem mais fria", brinca, antes de acrescentar. "Naturalmente que senti diferenças ao vir para aqui, mas em termos de 'lifestyle' a diferença não é assim muito grande", salienta.
A comida e a língua: pizzas, massa com tudo menos com vitela e italianos com pouco jeito para o inglês
A mudança para um novo país implica sempre o encontro com uma nova cultura, seja a nível linguístico, seja a nível gastronómico. E em Itália, naturalmente, Pedro Mendes não escapou às pizzas e às massas. Mas há algo de que tem saudades e que em Itália não conseguiu ainda comer.
"Por falar em comida...as pessoas quando pensam em Itália pensam 'Ah, isso é só pizzas e massas'. É mesmo assim, têm toda a razão!", brinca Pedro Mendes.
"É pizza e massas a torto e a direito. Aqui, em cada dez restaurantes, oito são de pizzas. Tudo tem pizzas e massas. É obrigatório! Eles não comem muito arroz, só o risoto. A equipa, quando vais ao restaurante, variam no 'anti-pasti', mas depois vem sempre a massa. Massa com isto, massa com aquilo", revela.
"Claro que também já fui comer as famosas pizzas. Mal cheguei, perguntei a uns colegas: 'Olha, diz-me aí uma pizza boa, num bom restaurante!'. E também levei lá os meus pais, porque irem a Itália e não comerem pizza ficava um bocado mal. E, realmente, há que dar valor, porque são diferentes e realmente boas!", reconhece.
Mas não há nada como a comida portuguesa. "Tenho saudades de comer uma boa vitela! De comidas mais caseiras, regionais. Porque isso aqui não se encontra muito. Não posso ir a um restaurante aqui e pedir vitela. Massas sim, eles fazem com tudo. Massa com vitela é que acho que não…", lamenta, novamente em jeito de brincadeira.
Quando às barreiras linguísticas, à chegada também não foi fácil, mas agora Pedro Mendes já está mais ambientado.
"Eles aqui não falam muito bem inglês. Nem o usam muito. Sabem o básico: 'good, bad, no, yes'…por isso nem em inglês consigo falar muito bem com eles. Mas há alguns jogadores que são estrangeiros ou jogaram no estrangeiro e sabem falar outras línguas. E também tenho aqui o Eric Botteghin, que é brasileiro, e o [Chris] Lungoyi, que jogou no Porto B e fala bem português", lembra.
"Mas o italiano é uma língua que eu sempre quis aprender e agora tenho essa oportunidade! Não é fácil, mas eu sei falar espanhol e a construção das frases não é muito diferente, por isso vou misturando espanhol com italiano. A primeira semana foi mais complicada, mas agora já vou dizendo umas frases. Fiz alguns apontamentos das coisas mais básicas e já me desenrasco. Perceber, vai-se percebendo. Falar é mais complicado, mas já vou falando", conclui.
PEDRO MEDES 'ENSAIA' O ITALIANO
Um pouco de futebol: o adeus ao Sporting, as melhores memórias e as vantagens de conhecer várias realidades futebolísticas
Pedro Mendes falou também connosco sobre a sua carreira até ao momento e olhou para as diferenças que tem encontrado no futebol italiano.
"Os jogadores aqui são muito fortes, muito desenvolvidos em termos físicos, mas a verdade é que a II Liga portuguesa também já tem jogadores com grande condição física e é jogada com muito ritmo. Aqui há muito futebol direto, passes longos, mas também depende sempre do treinador. No fundo, acho que acaba por não ser muito diferente. Nos treinos é sempre a abrir: dois dias depois de um jogo já estamos a correr 7 quilómetros, mas acaba por ser semelhante", começa por explicar.
"Aqui, o que também me surpreendeu foram os adeptos. É muito mais gente…num jogo normal, somos capazes de ter 10 mil pessoas no estádio. Na II Liga portuguesa não era assim", destaca Pedro Mendes.
"Acho que aqui a Serie B tem muito apoio da Serie A e há muita visibilidade. E este ano há umas oito equipas que são reais candidatas à subida. Isso dá mais visibilidade, mais valor e mais competitividade, claro", sublinha.
Quanto a expetativas para esta temporada, Pedro Mendes destaca a aprendizagem que está a experienciar num campeonato diferente. "Tenho boas expetativas. O treinador é uma pessoa que gosta de ensinar, mas também gosta de ouvir. O clube é muito bom para novos jogadores e acho que vai ser bom para mim, para evoluir, conhecer outra cultura futebolística e isso acaba por ser bom para mim: ter 23 anos e já ter jogado numa Liga, noutra e noutra é bom", realça o avançado.
A saída do Sporting, "um dos maiores clubes do mundo"
Pedro Mendes viveu em 2021/22 a sua melhor temporada como jogador sénior, pelo menos a nível de golos, com dez marcados em 43 jogos pelo Rio Ave rumo à subida à I Liga. "Disse que não assinava com outro clube sem falar com o Rio Ave, pelo respeito que tinha por eles, porque me acolheram e porque os ajudei a conseguirem os objetivos, como eles me ajudaram a concretizar os meus. Mas as coisas acabaram por não se concretizar, e surgiram outras oportunidades. Juntamente com o Sporting e o meu empresário, vimos que o Ascoli seria a melhor opção", explica.
A ida para o Ascoli coincidiu, então com o final da ligação contratual ao Sporting e a um período que, naturalmente, o marcou. "Estive cinco anos ligado ao Sporting, joguei lá três anos e foi o primeiro clube em que estive depois de sair de casa, onde aprendi a viver sozinho. A ser mais responsável", lembra.
"Como disse na despedida, o Sporting foi o clube que me tornou homem e é muito por ele que agora estou preparado para qualquer desafio, como este de vir para Itália", agradece Pedro Mendes.
"É um dos maiores clubes do mundo, tem um nome muito grande e aqui em Itália quando me perguntam ‘Jogaste no Sporting? Jogaste com este jogador? E com aquele?' Eles dão muito valor a isso. Mas o futebol é assim: um dia sai-se, outro volta-se", termina.
FOI ASSIM QUE PEDRO MENDES SE DESPEDIU DO SPORTING
Os momentos marcantes e o futuro
Apesar de ter apenas 23 anos, Pedro Mendes já viveu alguns momentos inesquecíveis na carreira.
"Ser campeão com o Rio Ave, da II Liga, foi especial, foi muito bom! Ter feito o golo na Liga Europa, claro, na estreia pelo Sporting… só foi pena não ter sido em Alvalade, com os adeptos, mas depois tive uma receção calorosa no Estádio de Alvalade quando lá joguei pela primeira vez: 40 mil adeptos a aplaudir-me. São momentos que ficam. Também ter ganho a Taça da Liga com o Moreirense foi um marco muito grande para mim. Tinha 16 aos e fui chamado à equipa A. Não imaginava ter essa oportunidade tão cedo, mas tive oportunidade de jogar na Final Four e ganhá-la. E mesmo a ida para o Almeria, pode não ter corrido bem em termos de números, mas é sempre um momento marcante na carreira, é sempre uma aprendizagem", lembra.
RECORDE O GOLO DE PEDRO MENDES NA ESTREIA PELO SPORTING
Quanto ao futuro, a fechar, Pedro Mendes prefere não olhar muito para a frente e concentra-se apenas no presente:
"Gosto de pensar dia a dia, jogo a jogo. Claro que há sempre quem pergunte ‘e depois’, vais para onde, vais jogar onde?’ e claro que eu tenho a perspetiva de jogar na Champions League, de representar a seleção. Mas isso são sonhos a alcançar. Agora quero focar-me no Ascoli com tudo o que tenho. É sempre assim que tenho feito na minha carreira!"
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