Os abusos contra os trabalhadores migrantes no Qatar continuam, um ano depois do Mundial de futebol de 2022, denunciou o ONG, Amnistia Internacional, esta quinta-feira (16).

Antes, durante e depois Campeonato do Mundo de futebol, esse emirado rico em gás enfrentou várias críticas pelo seu histórico em matéria de direitos humanos e pelo tratamento dispensado aos trabalhadores migrantes.

Para tentar resolver essa situação, o Qatar, com a ajuda da Organização Internacional do Trabalho (OIT), reformou a sua legislação do trabalho, introduzindo um salário mínimo e reformas em matéria de saúde e de segurança. Também eliminou o polémico sistema de patrocínio 'Kafala', que dava ao empregador um excessivo poder sobre os trabalhadores.

Para a Amnistia Internacional, no entanto, essas reformas são insuficientes.

"O facto de o Qatar continuar sem pôr fim aos abusos sofridos pelos trabalhadores migrantes, sem protegê-los adequadamente da exploração trabalhista, está a manchar o legado" do Mundial um ano depois, afirmou a ONG em comunicado.

"A persistente incapacidade do Qatar para implementar, ou reforçar, essas reformas põe gravemente em risco todo o benefício potencial para os trabalhadores", afirmou o diretor do programa de Justiça Económica e Social da Amnistia Internacional, Steve Cockburn.

"O governo deve renovar, com urgência, o seu compromisso de proteger os trabalhadores, e a Federação Internacional de Futebol (FIFA) e o Qatar devem chegar a um acordo sobre planos de reparação. Hoje, um ano depois do Mundial, muito pouco foi feito para corrigir todos esses erros, mas os trabalhadores que tornaram o Campeonato do Mundo de 2022 possível não devem ser esquecidos", acrescentou.

Em diferentes ocasiões, a Amnistia Internacional e outros grupos de defesa dos direitos humanos pediram ao Qatar e à FIFA que criassem um fundo para os feridos e familiares dos trabalhadores mortos nas obras do Mundial.

Em comunicado divulgado esta quinta, a FIFA disse que um dos seus subcomités continua a estudar o impacto das reformas realizadas pelo Qatar.

"É inegável que houve progressos significativos, mas também está claro que a implementação de reformas tão profundas leva tempo e que é necessário um maior esforço para garantir que beneficiem todos os trabalhadores do país", acrescentou a FIFA.

O Qatar questionou o número de mortes em acidentes de trabalho, que as organizações de direitos humanos estimavam em milhares, e acusou os seus críticos de praticarem uma política de dois pesos e duas medidas.

- "Muito pouco foi feito" -

A ONG criticou que se tenha mantido o salário mínimo no nível de 2021, apesar do aumento do custo de vida, e declarou que persistem disparidades em termos de não pagamento de salários e de mobilidade dos trabalhadores entre diferentes empregos.

Num relatório publicado no início da semana, o escritório da OIT no Qatar revelou casos de represálias por parte dos empregadores para com trabalhadores que pediram para mudar de emprego, como o cancelamento de vistos de residência, ou mesmo denúncias falsas de fuga.

A agência da ONU observou, contudo, que as queixas sobre esse tipo de casos "diminuíram consideravelmente em relação aos anos anteriores".

O Escritório Internacional de Imprensa do Qatar, um órgão governamental, reagiu esta quinta-feira ao comunicado da Amnistia Internacional, declarando que o Campeonato do Mundo "acelerou" as reformas sociais no país, deixando um "legado duradouro".

Afirmou, ainda, que as reformas introduzidas constituem "um exemplo para outros países sobre como um sistema pode ser reformado com sucesso".

Importantes grupos de direitos humanos convidaram a Arábia Saudita, que pretende receber o Campeonato do Mundo de 2034, a assumir compromissos em matéria de direitos humanos.

Segundo a Amnistia Internacional, "os abusos ligados ao Mundial-2022 deveriam servir para lembrar às organizações desportivas que os direitos humanos devem estar sempre no centro das decisões tomadas durante a atribuição dos eventos".