A tradição já tem mais de 60 anos e não tem uma explicação específica, a não ser o respeito por uma figura incontornável da história do Belenenses: sempre que o FC Porto joga no Restelo, homenageia Pepe, antigo jogador dos 'azuis' e da Seleção portuguesa. Esta segunda-feira não será exceção. Momentos antes de entrar em campo, o capitão dos ‘dragões’ colocará uma coroa de flores no monumento dedicado àquele que foi o primeiro 'menino de ouro' do desporto-rei nacional.
José Manuel Soares Louro, mais conhecido como Pepe, começou a jogar oficialmente no Belenenses em fevereiro de 1926, aos 18 anos. Marcou, de penálti, o golo da vitória da sua equipa contra o Benfica. Era um miúdo franzino, mas extremamente habilidoso com a bola nos pés, pelo que não demorou muito a dar nas vistas. Com ele, a equipa do Restelo venceu o Campeonato de Portugal (antiga Primeira Liga) em 1927 e 1929, conquistando ainda o Campeonato de Lisboa em 1926, 1929 e 1930. O recorde de golos marcados num jogo oficial ainda lhe pertence: uma dezena no triunfo sobre o Bom Sucesso.
Faleceu prematuramente a 24 de outubro de 1931, com apenas 23 anos, protagonizando um dos episódios mais dramáticos do panorama desportivo português. Pepe sentiu-se mal no trabalho - era reparador mecânico no Arsenal da Marinha, longe da profissionalização do futebol – e foi levado para o Hospital da Marinha, com fortes dores abdominais. “Cortem-me as pernas, mas salvem-me a vida” terão sido as suas últimas palavras, conforme recordou hoje o jornal A Bola. Acabou por morrer no dia seguinte.
As causas que levaram ao seu desaparecimento não são conhecidas ao certo: falou-se à data em carências de ordem alimentar, envenenamento ou suicídio, tendo esta última hipótese sido imediatamente afastada. A versão mais conhecida fala de um erro trágico da mãe do jogador, que confundiu sal com soda cáustica na preparação do jantar para a família. Pepe acabou por levar para o trabalho uma sandes de chouriço que sobrara da véspera, tendo oferecido parte a uma gata, que também morreu pouco depois. As irmãs do antigo jogador chegaram a ser internadas, enquanto a mãe e os irmãos mais novos tiveram de passar pelo hospital, o que daria ainda mais força à tese de intoxicação alimentar.
O funeral do jogador foi notícia de capa de jornal. "Morreu Pepe! Honremos a sua memória dignificando o football", escreveu o semanário Notícias Ilustrado, a 1 de novembro. Pepe chegou, viu e venceu tão rapidamente como veio a desaparecer. Mas o futebol português não deixou, a espaços, que o esquecessem.
Um ano após a sua morte, em dezembro de 1932, foi inaugurado um mausoléu para eternizar a memória do jovem belenense, no campo das Salésias, o qual seria, posteriormente, transferido para o Restelo por ocasião da inauguração do estádio em 1956. E é desde aí que o FC Porto deposita uma coroa de flores junto à lápide do malogrado jogador, quando se desloca a Belém.
A partir de 1974, o Belenenses passou a ter o mesmo gesto em homenagem a Pavão, ex-jogador portista que teve como Pepe um final trágico. Com apenas 26 anos, o médio caiu inanimado ao minuto 13 da partida com o Vitória de Setúbal, na sequência de uma paragem cardio-respiratória, acabando por falecer já no hospital. Assim, em quase todas as deslocações à cidade Invicta - a tradição apenas não se cumpriu na temporada passada -, os azuis do Restelo fazem questão de colocar uma coroa de flores no busto de Pavão, junto aos balneários, e entram em campo exibindo uma bandeira do FC Porto. Uma forma de evidenciar a boa relação entre os dois clubes.
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