O Benfica está a viver um momento de incerteza, exponenciado pelas derrotas com Sporting (Taça de Portugal) e FC Porto (I Liga), que apenas foram o culminar de um período de exibições fracas e resultados amenos. Tendo em conta que as águias investiram muito para formar o atual plantel, com nomes como Kokçu, Trubin, Di María, Arthur Cabral ou Marcos Leonardo, fica difícil compreender como é que o nível exibicional sofreu tamanho decréscimo.

Para tentar descortinar este mistério, o SAPO Desporto tentou perceber quais os pecados capitais do treinador alemão, que tiveram um papel decisivo para o menor fulgor do Benfica nas várias competições.

1 - Caos posicional

Se em 2022/23, Roger Schmidt conseguiu encontrar estabilidade no onze durante a primeira parte da temporada, cobrindo o "buraco" deixado pela saída de Enzo Fernández na etapa complementar, nesta época que está perto do fim parece ainda não ter encontrado uma base. Na defesa Morato foi o sacrificado para suprir os problemas na esquerda e não tem convencido, enquanto que na direita Aursnes tem sido pronto socorro para combater as lesões de Bah, sendo impedido de dar o contributo mais no centro do terreno.

No meio-campo o alargado leque de opções tem dado mais dúvidas do que soluções a Schmidt e tem variado quase em todos os jogos, sendo que jogadores como João Mário e João Neves já experimentaram várias posições, quando parece evidente onde podem render mais (pelo que já demonstraram). Já na frente o problema é bem maior: se Rollheiser e Prestianni ainda pouco (ou nenhum) tempo tiveram para se mostrar, fica difícil compreender porque é que num dos melhores momentos de forma de Arthur Cabral e Marcos Leonardo, o treinador do Benfica os decidiu deixar no banco. Além disso, a confusão tática em que Kokçu se transformou torna mais complicado perceber a real qualidade daquele que foi o melhor jogador da Eredivisie em 2022/23, enquanto capitão da equipa campeã.

A solução, em alguns jogos, tem passado por uma frente de ataque mais móvel, com Rafa no vértice, o que permite a defesas mais capazes de sair a jogar sem grandes problemas e tira presença na área. este é o caos posicional que impede os jogadores encarnados de ganhar rotinas de jogo e faz com que muitas vezes os mecanismos não estejam automatizados.

2 - Problemas com jogos grandes

Embora seja factual que o Benfica de Roger Schmidt triunfou nos primeiros embates com FC Porto (Supertaça e I Liga) e Sporting (I Liga) - embora sempre em superioridade numérica - também é verdade que desde então não mais conseguiu dar uma boa resposta nos jogos, teoricamente, mais complicados. A fase de grupos da Liga dos Campeões foi um desastre, sofrendo derrotas duras com Real Sociedad, Inter Milão e Salzburgo, mas ainda deu para resgatar alguma coisa com a qualificação para a Liga Europa. Daí para a frente, as águias iam convencendo no campeonato, mas com inexplicáveis alternâncias de personalidade nos desafios mais complicados, como se de Dr. Jekyll e Mr. Hide se tratasse.

As fracas exibições com Estoril (Taça da Liga), Vitória de Guimarães (I Liga) Toulouse (Liga Europa), Sporting e FC Porto foram sintomas de uma aparente falta de estratégia em jogos de maior grau de dificuldade, uma vez que as águias nunca demonstraram o bom futebol e o domínio avassalador que já deixaram claro terem capacidade para conseguir. Obviamente que também há muito mérito dos adversários, mas esperava-se mais de uma equipa que é campeã nacional e que realizou um dos mercados de maior investimento da história, que quase chegou aos 100 milhões de euros.

3 - Dificuldade em mudar o rumo dos jogos

Outra das críticas insistentemente apontadas a Roger Schmidt é a forma como promove substituições, que pecam por tardias ou que deixam a dúvida sobre a intenção do treinador com a alteração. Pegando em exemplos recentes, na meia-final da Taça de Portugal, com o Sporting, e com a equipa em desvantagem, tirou Bah e lançou Morato, que pouco acrescentou em termos ofensivos. Uns minutos mais tarde, e já a perder 2-0, fez entrar Tengstedt para ter uma referência ofensiva (numa altura em que Arthur Cabral parecia muito mais em forma) e só no desespero deu minutos a Tiago Gouveia e ao brasileiro.

Já contra o FC Porto, voltou a apostar em Tengstedt, desta vez de início, mas recorreu a Arthur Cabral pouco depois do intervalo, numa altura em que já tinha reconhecido a falha com a titularidade de Morato na esquerda, lançando Álvaro Carreras para o seu lugar. Obviamente que a avaliação das substituições está inerente ao impacto dos jogadores no encontro, mas, quando os jogos são a doer, Schmidt tem revelado alguma falta de criatividade e pouco acerto nesse capítulo em específico.

Estas são as três principais razões pelas quais o Benfica não tem conseguido atingir o nível exibicional demonstrado na primeira metade de 2022/23, com Roger Schmidt como principal culpado, uma vez que parece ter desaprendido o que ensinou aos colegas de profissão nesse período. Numa fase em que não faltam opções viáveis, de presente e de futuro, o treinador alemão mostrou-se mais certeiro quando as dificuldades eram maiores.

Embora ainda esteja na luta por campeonato, Taça de Portugal e Liga Europa, as próximas semanas serão decisivas para perceber se Roger Schmidt é que está certo e tem capacidade para "conduzir este Ferrari" ou se está na altura de Rui Costa começar a pensar em alternativas.