A 7 de janeiro de 1985 morria, aos 56 anos, uma das mais importantes figuras do futebol português e do FC Porto, José Maria Pedroto. Conhecido nas lides do futebol por “Zé do Boné”, Pedroto elevou o nível do futebol português, e do FC Porto, para patamares estratosféricos com uma nova abordagem e aperfeiçoamento da combinação entre os príncipios de jogo e o treino físico.

Antigo médio do FC Porto, José Maria Pedroto pertenceu à célebre equipa portista que conquistou a primeira dobradinha para o emblema do dragão em 1956/1957. Natural de Lamego, Pedroto marcou desde logo o futebol português pela sua rectidão no trabalho, coragem nas suas ideias, inteligência na leitura de jogo e muita polémica devido à frontalidade como comunicava com companheiros de equipa e adversários.

Depois de oito anos como jogador do FC Porto, Pedroto colocou um ponto final na sua carreira de atleta em 1960 para iniciar o seu caminho de treinador. Em 1961, Pedroto assume o comando técnico das camadas jovens do FC Porto depois de ter tirado um curso de treinador na AF Porto, ministrado pelo mítico Cândido Oliveira, e de ter concluído com mérito o curso de técnico da Federação Francesa de Futebol onde foi o único estrangeiro a receber o diploma de um total de 87 alunos no curso.

Coimbra foi o primeiro passo

Mas foi na Académica de Coimbra que a aventura de José Maria Pedroto como treinador de uma equipa na I Divisão começa. Foi entre 1962 e 1964, que Pedroto começa a dar os primeiros passos na alta roda do futebol nacional. No entanto, o seu temperamento e a sua frontalidade enquanto treinador acabam por pautar a sua saída de Coimbra consumada após uma derrota por 2-1 frente ao FC Porto, em que José Maria Pedroto insurge-se contra um comentário de um jornalista com um soco.

No Mar, Pedroto ganha estômago de marinheiro

Encerrado o ciclo em Coimbra, José Maria Pedroto regressa a Matosinhos para treinar o Leixões em 1964/1965. No clube do Mar, Pedroto impõe um futebol ofensivo que é aplaudido pela crítica, mas que acaba por ser questionado pelos próprios resultados, uma vez que o sector defensivo do Leixões deixava muito a desejar devido ao seu pendor atacante. Pedroto acaba por ser substituído e pouco depois assume o comando do Varzim em 1965/1966.

De sensação na Póvoa de Varzim ao regresso às Antas

No Varzim, os métodos introduzidos por José Maria Pedroto começam a dar frutos, e o primeiro sinal de que uma revolução no futebol português estava a caminho foi a transformação de um modesto clube da Póvoa de Varzim na primeira grande revelação do campeonato nacional com um sétimo lugar à frente de clubes com o Belenenses, CUF e SC Braga.

Pedroto começava a dar então nas vistas, e o FC Porto não perdeu a oportunidade de fazer regressar a casa o antigo jogador para comandar a equipa portista na época de 1966/1967. O objetivo da direção era claro: o FC Porto precisava de regressar aos títulos rapidamente uma vez que o último troféu tinha sido conquistado na época de 1958/1959 no célebre “Campeonato do Calabote”.

Logo na época de estreia no comando técnico do FC Porto, Pedroto leva os azuis e brancos ao terceiro lugar do campeonato, atrás apenas de Benfica e Académica de Coimbra, comandada por Mário Wilson. Na época seguinte, o FC Porto bate na final da Taça de Portugal o Vitória de Setúbal, detentor do troféu, e regressa aos títulos depois de ter afastado o Benfica nas meias-finais com um triunfo categórico nas Antas por 3-0 em jogo da 2ª mão.

Em 1969, Pedroto sai do FC Porto em conflito com a direção liderada por Afonso Pinto Magalhães e chega mesmo a ser banido do clube numa Assembleia-Geral realizada a 19 de maio devido a um caso disciplinar com quatro jogadores após uma derrota por 3-0 com o Benfica.

As ideias do Mestre na ascenção do Sado na Europa

Sempre confiante nos seus métodos de trabalho e na visão que tinha para o futebol, Pedroto assume o comando técnico do Vitória de Setúbal na época 1969/1970 onde inicia uma era gloriosa de vitórias europeias levando o clube do Bonfim por duas vezes aos quartos-de-final da Taça UEFA.

Já no comando da seleção nacional de Portugal desde 1972/1973, Pedroto sai do Vitória de Setúbal em conflito com a direção sadina e indignado contra aquilo que apelidou “lei da rolha”, depois do presidente do Vitória de Setúbal ter proibido os jogadores de falar à imprensa, ir à praia, e imagine-se, de casar, sem a sua autorização.

De regresso ao norte para preparar o "xeque" a Lisboa

Na época 1974/1975, José Maria Pedroto concilia o cargo de selecionador nacional com o de treinador do Boavista. No emblema axadrezado, Pedroto faz história ao levar o Boavista à conquista de duas Taça de Portugal consecutivas, uma proeza outrora alcançada apenas pelos clubes de Lisboa, Benfica e Sporting.

Em relação ao campeonato nacional, o Boavista de Pedroto luta pelo primeiro lugar com o Benfica até ao fim na época de 1975/1976 numa temporada que ficou marcada pela troca de palavras azedas com o Mário Wilson, treinador dos encarnados e um ódio de estimação já de outros tempos do “Zé do Boné”.

Em 1976, Pedroto regressa ao FC Porto com a condição de ter Pinto da Costa como responsável do futebol nas Antas já depois da direção de Américo Sá ter aprovado em Assembleia Geral uma proposta para conceder amnistia ao treinador banido do clube desde 1969.

O final do jejum de 19 anos seguindo-se uma "revolução adiada"

No FC Porto, José Maria Pedroto e Pinto da Costa são os rostos da mudança no futebol português. Em ano de estreia, Pedroto leva o FC Porto à conquista da Taça de Portugal frente ao SC Braga e fixa o recorde de vencer três Taças de Portugal consecutivas. No campeonato, o 3º lugar a 10 pontos do campeão Benfica não tiram a confiança de Pedroto nas suas ideias que na temporada seguinte ajudam o FC Porto a quebrar o longo jejum de 19 anos sem conquistar o título de campeão nacional com apenas uma derrota e sete empates. Já na temporada seguinte, o FC Porto volta a conquistar o campeonato nacional sagrando-se bicampeão, algo que já não acontecia desde a época 1938/39 e 1939/1940. O segundo lugar do campeonato na época 1979/1980 abrem um fosso na união do FC Porto que culmina com o mediático caso do Verão Quente em que a direção de Américo Sá afasta Pinto da Costa do cargo de responsável do futebol e coloca Stessl para o lugar de Pedroto. 14 jogadores do FC Porto entram em ruptura com a direção portista e fazem a pré-época em Matosinhos. No entanto, o regresso do “mestre” seria adiado por dois anos.

Em 1982, Pinto da Costa vence as eleições presidenciais do FC Porto e promove o regresso de Pedroto ao estádio das Antas. Apesar de já saber da doença que o viria a vitimar, José Maria Pedroto aceita o desafio Pinto da Costa para regressar ao clube do coração depois de uma passagem de duas épocas no Vitória de Guimarães.

Na época 1983/1984, o FC Porto vence a Supertaça de Portugal mas acaba em segundo lugar atrás do Benfica. A 1 de novembro de 1982 Pedroto é operado a um cancro em Inglaterra e regressa ao banco do FC Porto assim que começa a dar sinais de melhoria. Senta-se no banco de treinador do FC Porto pela última vez a 4 de dezembro de 1983 no estádio 15 de abril num jogo que os “dragões” vencem o Penafiel por 1-0. Uma semana depois, a doença volta a dar sinais e Pedroto é substituído por António Morais. Nessa época, o FC Porto fica em segundo lugar do campeonato, vence a Taça de Portugal e alcança a sua primeira final europeia frente à Juventus na Taça das Taças, jogo que Pedroto acompanharia pela televisão.

A 7 de janeiro de 1985, José Maria Pedroto morre com 56 anos rodeado pela família e amigos, mas a sua lenda continua imortalizada na matriz vencedora do FC Porto, pois um mestre nunca parte realmente enquanto os seus ensinamentos continuarem a produzir novos discípulos e tornarem-se numa instituição. Em 1987, a visão de Pedroto para o FC Porto ganhou forma na primeira conquista europeia frente ao Bayern Munique na final da Taça dos Clubes Campeões Europeus. Artur Jorge apresentou-se como um digno sucessor do “mestre” numa linhagem seguida por José Mourinho e André Villas-Boas.