O antigo presidente do Sporting Luís Godinho Lopes disse hoje em tribunal que sabia da vigilância que era feita aos futebolistas do clube e disse ter sido "demasiado 'naif'" em certos aspetos, nomeadamente na delegação de competências.
"Passados quatro anos estou a reconhecer que posso ter cometido erros (...), fui demasiado ‘naif’ em certos aspetos (...), talvez tenha delegado de mais", disse Godinho Lopes durante o julgamento do ‘Caso Cardinal’, que envolve Paulo Pereira Cristóvão, antigo vice-presidente do clube.
Ouvido na qualidade de testemunha, Godinho Lopes admitiu que o Sporting contratou uma empresa para fazer “um acompanhamento dos jogadores, algo que também era feito noutros clubes”, mas assegurou que “o objetivo não era ir atrás da vida íntima dos jogadores”.
Godinho Lopes disse ter falado com Luís Duque, então responsável pelo futebol, para contactar uma empresa que fizesse “um trabalho de acompanhamento e não de espionagem”.
“O Sporting tinha um conjunto grande de jogadores estrangeiros, jovens e pertencentes a várias seleções, foi decidido fazer um enquadramento de forma a que a sua prestação desportiva fosse a melhor e não fosse afetada por, por exemplo, se deitarem a horas tardias ou beberem demasiado”, explicou.
Godinho Lopes, que assumiu a presidência do clube em 2011, admitiu que os jogadores “poderiam não saber desse serviço de forma organizada”, acrescentando: “Não sei se lhes foi comunicado pelo Luís Duque”.
O antigo vice-presidente do clube referiu ainda que ia sabendo “dos resultados desse trabalho [de vigilância] de forma rotineira” e admitiu que “também chegou a haver, em determinada altura, um acompanhamento no futsal e no andebol”.
Godinho Lopes afirmou não se recordar de muitos pormenores do contrato com a empresa Businlog - contratado pelo clube para o serviço -, referindo no entanto que o “mesmo nunca foi decidido ao nível do conselho de administração do Sporting”".
O antigo presidente admitiu só ter sabido ‘a posteriori’, durante as investigações levadas a cabo pela Polícia Judiciária, que a Businlog tinha subcontratado uma outra empresa, a Right Expert - com ligações a Paulo Pereira Cristóvão - para efetuar o trabalho de vigilância.
No que se refere ao depósito de 2.000 euros na conta do árbitro assistente José Cardinal, que posteriormente chegou ao conhecimento do Sporting através de uma denúncia anónima, Godinho Lopes disse ter recebido uma chamada de Paulo Pereira Cristóvão alertando para a existência de um envelope manuscrito em seu nome no estádio José Alvalade.
“O Paulo Pereira Cristóvão abriu a carta e ao ler achou que tínhamos de nos encontrar (...). Reunimo-nos em Alcochete com o Luís Duque e o Carlos Freitas”, explicou.
O antigo presidente ‘leonino’ referiu ter entrado em contacto com o presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Fernando Gomes, dando conta da carta que denunciava um alegado suborno ao árbitro assistente que deveria ter integrado a equipa de arbitragem de um jogo entre o Sporting e o Marítimo.
“Fui a Lisboa entregar a carta ao Fernando Gomes e disse que achava que o assunto devia ser investigado. Ele disse que o ia fazer”, referiu, admitindo nunca ter suspeitado de que a iniciativa pudesse ter partido do interior do Sporting.
Também hoje foi ouvido Carlos Freitas, à data diretor desportivo do Sporting, que disse nunca ter tido conhecimento formal de uma vigilância organizada aos jogadores, facto que posteriormente Godinho Lopes classificou como “estranho”.
Carlos Freitas admitiu, no entanto, que Paulo Pereira Cristóvão lhe dava “informação verbal sobre alguns jogadores” e disse não ter estranhado, pois a anterior atividade do vice-presidente [que tinha sido inspetor da Polícia Judiciária] lhe devia permitir ter bons contactos.
“Para nós sempre foi bom ter informações sobre os jogadores”, referiu, acrescentando que muitas vezes essas são obtidas através das redes sociais e de pessoas conhecidas.
No âmbito do ‘caso Cardinal’, Paulo Pereira Cristóvão, que está detido desde março no âmbito de um outro processo, é acusado de um crime de burla qualificada, outro de branqueamento de capitais, dois de peculato, mais um de devassa por meio informático, um de acesso ilegítimo e, por fim, um de denúncia caluniosa agravada.
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