Vilão para uns, herói para outros, Rui Pinto quebrou o silêncio depois de ter sido alvo de detenção em Budapeste. Em entrevista no seu apartamento à revista alemã 'Der Spiegel', partilhada pelo 'Expresso', o português assume a identidade de john, como whistleblower do processo Football Leaks, responde às acusações de chantagens à Doyen e falou ainda do Benfica.
Como conseguiu obter mais de 70 milhões de documentos confidenciais sobre a indústria do futebol?
"Iniciei um movimento espontâneo de revelações sobre a indústria do futebol. Não sou o único envolvido. Ao longo do tempo mais e novas fontes de informação foram aparecendo e partilhando material comigo e a base de dados foi crescendo. Isto mostra que há muita gente preocupada com este assunto".
Considera-se um hacker?
"Não me considero um hacker, mas um cidadão que agiu em nome do interesse público. A minha única intenção era revelar práticas ilícitas que afetam o mundo do futebol".
Acusações de chantagem por parte da Doyen.
"A única razão pela qual contactei a Doyen foi para confirmar a ilegalidade das suas ações, com base na quantidade de dinheiro que estivessem dispostos a pagar para que os documentos não fossem divulgados. Queria perceber o quão valiosos e o quão importantes eram os documentos para a Doyen. Achei que conseguia descobrir isso se soubesse o quanto a Doyen estava disposta a pagar pelo meu silêncio. Nunca foi minha intenção aceitar o dinheiro. Só queria expor a Doyen. Quis perceber quanto lhe ofereciam. (...) Por isso escrevi à Doyen e disse-lhes para ficarem com o dinheiro. Não me pagaram um único cêntimo. O que fiz foi muito ingénuo. Olhando para trás, arrependo-me. Mas repito, nego ter cometido qualquer crime".
Qual a verdadeira origem para o que sucedeu?
"Não estou autorizado a falar sobre essas circunstâncias específicas porque assinei um contrato de confidencialidade com o banco. Uma coisa é certa: se tivesse cometido um crime, o banco ter-me-ia levado a tribunal. O caso nunca foi a tribunal e o meu registo criminal está limpo até hoje, em Portugal e em qualquer parte do mundo".
Suspeitas que passou emails sobre Benfica
"Não li nenhuma declaração das autoridades sobre uma relação entre mim e o escândalo do Benfica. Uma revista publicou a história do Benfica no outono passado. Isso mudou a minha vida. A minha fotografia estava nas primeiras páginas dos jornais por todo o país. A minha conta de Facebook e o meu e-mail foram inundados com ameaças de morte".
Porque não quer ser extraditado para Portugal?
"Tenho quase a certeza que não terei um julgamento justo em Portugal. O sistema judicial português não é inteiramente independente; existem muitos interesses escondidos. Claro que há procuradores e juízes que levam o seu trabalho a sério. Mas a máfia do futebol está em todo o lado. Querem passar a mensagem que ninguém se deve meter com eles".
Origem do site 'Football Leaks'
"Sou fanático por futebol desde criança e já tinha percebido, desde o Caso Bosman, que o futebol estava a caminhar na direção errada. Os melhores dos jogadores jovens estavam a ir para as melhores equipas; toda a competição estava a dar vantagem aos clubes de topo. O grande impulsionador para mim foi o escândalo da FIFA em 2015. Além de todas as detenções que foram feitas na FIFA, vi que havia irregularidades em muitas transferências dentro de Portugal. Que mais e mais investidores invadiam o mercado. Comecei a recolher dados".
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