José Manuel Meirim não tem dúvidas quanto a clareza do ponto quarto do art.º 18 do Regulamento Disciplinar da FIFA. O jurista português e especialista em Direito Desportivo sublinha que a FIFA deverá manter a sua decisão de excluir Cabo Verde dos play-off de acesso ao Mundial, a não ser que a Federação Cabo-verdiana de Futebol tenha outros argumentos.

Em entrevista telefónica ao SAPO Desporto, o professor da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa afirma que a FCF pode ter matéria suficiente para recorrer para o Tribunal Arbitral do Desporto, na Suíça.

«A leitura que faço é baseado nas notícias e nas normas da FIFA. E o artigo 18 no seu número 4 do Regulamento Disciplinar da FIFA diz que os efeitos disciplinares decorrentes de um encontro que venha a ser anulado, ou abandonado ou outra situação do género, havendo uma expulsão automática, como foi o caso do Fernando Varela, os efeitos da suspensão também contam para os jogos a seguir. A não ser que haja outros elementos na posse da Federação Cabo-verdiana de Futebol, não vejo como se pode ultrapassar isto. A leitura que faço é a mesma da FIFA», afirmou Meirim ao SAPO Desporto.

A FCF alega que recebeu um relatório da FIFA onde o nome de Fernando Varela não consta no mapa de castigos. Um lapso do organismo máximo do futebol mundial que poderia ser usado nas alegações de Cabo Verde mas que é logo "desarmado" pelo artigo 8 do Código Regulamentar do Mundial2014. Mas, em caso de recurso para o Tribunal Arbitral do Desporto, Meirim diz que a FCF pode usar esse lapso da FIFA a seu favor.

«O artigo 8 do próprio código regulamentar do Mundial2014 é claro ao atribuir a responsabilidade total quanto a elegibilidade dos jogadores às respetivas associações nacionais. Se houve um erro da FIFA, de alguma forma aquela norma do artigo 8 desculpa a FIFA. Independentemente dos erros ou não da FIFA, a responsabilidade final cabe sempre às associações, ou seja, a FIFA desculpa-se de qualquer erro e coloca o problema do lado das federações. É uma resposta que pode ser considerada incorreta, abusiva, mas a FIFA, nesse quadro, funciona assim. Pode até haver fundamento para recurso da decisão do Tribunal de Apelo da FIFA para o Tribunal Arbitral do Desporto, caso a decisão seja contra as pretensões de Cabo Verde», sublinhou.

Ainda sobre a diferença entre nulo ou anulado, que poderia ser usado na argumentação cabo-verdiana, Meirim chama a atenção para a leitura da FIFA neste tipo de situações, diferente daquela que poderá ser feita por juristas. E sublinha que dificilmente Cabo Verde ganhará este caso.

«Para a FIFA, não há espaço para leituras jurídicas do regulamento. Para eles, nulo ou anulado é a mesma coisa. É um quadro que os juristas podem funcionar em termos internos nos Direitos Nacionais, para raciocínio. Mas na FIFA não. Em princípio, a decisão da FIFA vai-se manter. Era bom que não mas não vejo como contornar isto...», afirmou ao SAPO Desporto.

Se o Comité de Apelo da FIFA não der razão a Cabo Verde, o organismo presidido por Mário Semedo poderá recorrer para o Tribunal Arbitral do Desporto na Suíça, onde será possível usar outras argumentações a favor da causa cabo-verdiana.

«Saltando das instâncias disciplinares da FIFA, a fundamentação jurídica poderá ter um outro espaço de manobra no TAS, uma resposta positiva, que a meu ver, dificilmente, terá dentro da FIFA. Ou seja, o único quadro de saída é o TAS de Lausanne, onde a FCF pode apresentar outros argumentos, como por exemplo, o tal relatório dos mapas de castigos onde não constava o nome de Fernando Varela», declarou José Manuel Meirim.

A FIFA atribuiu derrota a Cabo Verde no jogo frente a Tunísia, que os Tubarões Azuis venceram por 2-0, depois de um protesto dos tunisinos, alegando utilização irregular de Fernando Varela. O organismo máximo do futebol mundial deu razão aos tunisinos e colocou Cabo Verde fora da corrida ao Mundial2014.