O presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP) disse hoje ter uma leitura contrária à do Governo, que considerou ser “de enorme gravidade”, sobre as orientações da Direção-Geral da Saúde (DGS) para a retoma da atividade desportiva.

Numa carta enviada às federações desportivas, na terça-feira, o gabinete do Secretário de Estado da Juventude e do Desporto refere que “a realização de testes para diagnóstico de COVD-19 poderá ser considerada pelas federações e clubes”, numa interpretação das normas da DGS que José Manuel Constantino disse à Lusa que seria “uma completa demissão das autoridades de saúde pública” do país.

“Fico surpreso com a interpretação que está a ser dada à norma [da DGS] pelo gabinete [do Secretário de Estado, João Paulo Rebelo] e espero que se esclareça qual é o sentido. Eu tenho outra leitura, mas se essa é a do gabinete, isso coloca outro problema de enorme gravidade, porque a vontade da sua realização [dos testes à covid-19] passaria a depender das federações, que não tendo meios e recursos são quem corre os riscos das atividades”, comentou o presidente do COP.

José Manuel Constantino apontou ainda que “as autoridades públicas devem encontrar soluções” para o problema que o desporto está a atravessar, porque “sabem que as entidades desportivas não têm meios para o fazer”, mas sublinhou que “não se pode é deixar ao critério das federações” a realização dos testes.

O dirigente apoiou também a criação de um grupo do acompanhamento da situação que foi sugerido no âmbito da Cimeira das Federações Desportivas e lembrou que essa proposta “mereceu a concordância do Secretário de Estado” mas que, desde então, “não aconteceu mais nada”.

Constantino considerou que a tipificação do risco das várias modalidades “deve ser feita com as federações” e lembrou que estas têm um conhecimento “do ponto de vista técnico que pode escapar às autoridades de saúde pública”.

“Faz sentido colocar os katas, do karaté, as artes marciais chinesas, que são realizadas individualmente, ou as disciplinas de gestos técnicos no grupo de modalidades de alto risco? Isso só acontece porque quem tem de pensar nos riscos desconhece a tipicidade e se houver diálogo é possível às federações indicarem as especificações”, exemplificou.

Além disso, o presidente do COP assinalou que as orientações publicadas pela DGS são gravosas “sobretudo para o desporto jovem”, porque, com “exceção das modalidades de baixo risco”, todas as outras continuam a “carecer de orientações de retoma quer do treino, quer da competição”.

“É uma parte muito significativa da vida desportiva nacional. As competições seniores acolhem 20% da prática desportiva, sendo 80% os escalões de formação. Destes, apenas as modalidades de baixo risco têm a situação resolvida, portanto cerca de 65% da atividade desportiva nacional está por regulamentar”, analisou Constantino.

Os números, no entender do presidente do COP, são “muito significativos em termos numéricos e da vida desportiva nacional”, uma vez que os escalões de formação “são a fonte de abastecimento e sustentabilidade das organizações”.

A Direção-Geral da Saúde (DGS) atualizou na terça-feira as normas para a retoma das competições de modalidades desportivas coletivas, incluindo o râguebi, os desportos de contacto e modalidades como o polo aquático e a ginástica acrobática, entre outras, no grupo de alto risco.

As modalidades incluídas no grupo de alto risco devem, ao abrigo das normas da DGS, realizar testes até 48 horas antes da competição, dos quais estão dispensadas as modalidades do grupo de médio risco, sempre que se trate de treinos ou "competições entre equipas de zona(s) sem transmissão comunitária ativa".

Mais tarde, uma carta envidada às federações pelo gabinete do Secretário de Estado do Desporto (SEJD), João Paulo Rebelo, referiu que a atualização das normas que regem a retoma do desporto em Portugal, publicada pela DGS, não pressupõe a obrigatoriedade de realização de testes.

"A realização de testes para diagnóstico de COVID-19 poderá ser considerada pelas federações e clubes, sendo que, para este efeito, a DGS enquadra critérios com o objetivo de os auxiliar na decisão de realizar ou não os referidos testes", pode ler-se na missiva.

A Confederação do Desporto de Portugal já pediu à SEJD uma audiência com caráter de urgência para debater as últimas orientações e reiterar junto do Governo a necessidade de formar um grupo de trabalho com técnicos da DGS, tendo em visa a retoma das competições desportivas.