A falta de apoios governamentais às modalidades em plena pandemia de COVID-19 reflete a “desvalorização política constante” do “valor social” do desporto, defenderam hoje as federações de andebol, canoagem, ciclismo e natação.

“Nesse ponto, o país é um desastre e nem agora temos sinal de que algo possa mudar. Precisamos de uma ‘bazuca’ à séria ou, daqui a uns anos, a Direção-Geral da Saúde vai chorar que os níveis de atividade física e desportiva estão a baixar outra vez”, frisou o presidente da Federação de Andebol de Portugal, Miguel Laranjeiro.

Numa videoconferência organizada pela Associação Portuguesa de Gestão de Desporto, o dirigente elogiou a “atitude cívica” mostrada pelo setor “desde a primeira hora”, ao acordar a suspensão global das provas antes da declaração do estado de emergência, em 18 de março, o que destapou “realidades dramáticas” para clubes, atletas e treinadores.

“Temos trabalhado para acelerar a retoma, mas não podemos ser uma das últimas atividades a desconfinar. Estamos a passar essa imagem brutalmente negativa e esperamos que o Estado perceba o valor social do desporto, sendo que precisamos de uma campanha de reforço de confiança no regresso à atividade física”, apontou.

Se o andebol antecipou o desfecho da época em 29 de abril, a Federação Portuguesa de Canoagem vai concentrar as competições no Centro de Alto Rendimento de Montemor-o-Velho a partir de julho, após o desporto ter ficado ausente do Programa de Estabilidade Económica e Social do Governo, publicado em 06 de junho, em Diário da República.

“Aparece um valor de 30 milhões para apoio à cultura e nem uma referência ao desporto, que tem clubes com graves dificuldades de tesouraria e sem qualquer encaixe de receita. Felizmente, o Estado garantiu às federações o financiamento prolongado dos contratos-programa de 2019, mas sem saber o que virá aí”, admitiu o líder federativo Vítor Félix.

Já Delmino Pereira, da Federação Portuguesa de Ciclismo, que recebeu hoje autorização do Governo para realizar a Volta a Portugal, entre 29 de julho e 09 de agosto, considerou que “é fácil ignorar o desporto social e politicamente”, uma vez que o setor apenas “adquire notoriedade” e deixa de estar “acantonado” em anos de Jogos Olímpicos.

“Há uma dificuldade e uma oportunidade, porque o futuro reserva pessoas com mais tempo livre para exercitar mais. O desporto para todos é fundamental e tem dado novas gerações ao ciclismo. Aliás, os filhos dos praticantes são ótimos atletas e vêm já com uma cultura virada para o desporto e temos de apanhar a tutela desta atividade”, anotou.

Alertando para a carência de “uma comunidade que goste de desporto”, Delmino Pereira deseja maior cooperação nas reivindicações do setor junto do poder estatal, tal como António José Silva, da Federação Portuguesa de Natação, que nota “pouca convergência dos organismos de cúpula e algum autismo do Governo” sobre a missão do desporto.

“Portugal contraria a generalidade dos países europeus com dimensões similares, onde existem apoios ao desporto que vão dos 22 aos 80 milhões de euros. Se as federações conseguirem integrar a prática da atividade física sistemática irão alargar muito mais o leque de abrangência e a esfera de intervenção”, afiançou o líder do organismo.

Após o fim do estado de emergência, em 03 de maio, o Governo autorizou apenas o regresso da I Liga de futebol e a prática de desportos individuais, ao ar livre e sem contacto, na sequência da declaração da pandemia, em 11 de março, que adiou, suspendeu ou cancelou as competições de quase todas as modalidades.

Portugal contabiliza pelo menos 1.534 mortos associados à COVID-19 em 39.392 casos confirmados de infeção, segundo o último boletim da Direção-Geral da Saúde (DGS).