Os valores das apostas desportivas que as federações recebem servem para “agravar o fosso” entre as modalidades, por beneficiarem as mais apostadas, disse hoje à Lusa o presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP).

“Como as escolhas incidem apenas em algumas modalidades, isso agrava um fosso muito significativo no financiamento entre aquelas que são escolhidas e as que o não são”, explicou José Manuel Constantino.

Como a escolha de quais competições são alvo de apostas desportivas é comercial, e da responsabilidade de quem explora este tipo de jogos, é “justo que as modalidades que cedem esses direitos de aposta” sejam ressarcidas por isso, adiantou o dirigente.

Segundo Constantino, o COP propôs “há vários anos ao Governo um fundo de solidariedade que contemplasse as modalidades que estão fora destes jogos sociais”, com o objetivo de “esbater as disparidades criadas”.

Questionado sobre se este sistema beneficia o desporto nacional ou apenas as modalidades mais populares, o dirigente afirmou que “o modelo atual beneficia apenas modalidades e entidades contempladas nas escolhas”.

Sobre propostas de alterações, o presidente do COP lembrou as várias posições no ecossistema das apostas e reforçou a necessidade de um “fundo de solidariedade a partir do Orçamento de Estado”.

Esta medida podia “corrigir a atual situação e introduzir fatores corretivos às modalidades que não são contempladas” e, segundo o dirigente, “bastaria para tanto que não fosse parte das receitas dos jogos sociais a pagar uma parte da estrutura de pessoal da administração pública desportiva e de juventude”.

As federações nacionais receberam 245 milhões de euros (ME) entre 2018 e 2022 provenientes de apostas desportivas, mais de metade feitas ‘online’, segundo números do Governo.

Em resposta ao grupo parlamentar do PS, sobre a evolução das verbas distribuídas às organizações desportivas, da Santa Casa da Misericórdia, com o jogo Placard, e do Turismo, com as apostas ‘online’, o Governo deu conta deste valor, que atingiu 61,7 ME em 2022, um valor substancialmente superior aos 35,7 ME do financiamento atribuído pelo Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) anualmente a todas as federações.

O ano passado e 2021, com 59,4 ME, foram largamente os anos mais ‘rentáveis’ nas apostas para as federações desportivas, que, segundo as portarias n.º 314 e 315/2015, recebem uma parte do imposto especial do jogo ‘online’ (37,5%) ou 3,5% da receita apurada, no caso das apostas à cota de base territorial.

Com um total de 151,7 ME, nos últimos cinco anos, as apostas nas competições desportivas através da Internet foram as principais responsáveis pelos valores distribuídos pelas federações desportivas.

Sem surpresa, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) é o organismo que mais lucra com as apostas desportivas, num total de 146 ME nos últimos cinco anos, praticamente 60% do montante total, verificando-se, também, um acréscimo de receitas do ‘online’ em 2021 (25,4 ME) e 2022 (23,7 ME), face ao Placard (11 e 10,9, respetivamente).

Segue-se a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), que arrecadou um total de 50,1 ME entre 2018 e 2022 – tendo também os últimos dois anos como os mais rentáveis, com 12,6 ME em cada –, mais de o dobro do total do que lucraram, no mesmo período, as federações de ténis (21,1 ME) e basquetebol (18 ME).

As outras modalidades coletivas conseguiram montantes mais modestos, casos do voleibol (1,6 ME), andebol (1,7) e râguebi (290 mil euros), enquanto o hóquei em patins tem como beneficiária a federação de patinagem (184 mil euros), todas aquém do assegurado pela federação de desportos de inverno, com um total de 4,3 ME em cinco anos, muito por causa das apostas em hóquei no gelo.

Bilhar, com 178 mil euros, badminton, com 105 mil euros, são outras federações beneficiárias das apostas, entre 2018 e 2022, à frente de modalidades mais tradicionais como ciclismo, com 6.862 euros, natação, com 4.702, e atletismo, com 112.