Matej Mohoric deixou hoje um recado a todos aqueles que duvidam dos resultados da Bahrain Victorious, ‘calando’ os críticos ao ‘bisar’ na 108.ª Volta a França em bicicleta, numa 19.ª etapa em que o pelotão descansou.
Ao aproximar-se da meta, sem adversários no horizonte, o esloveno ergueu-se na bicicleta, apontou para o nome da equipa, inscrito no seu equipamento, sublinhou-o, pôs o dedo indicador em frente à boca, antes de imitar um fecho diante dos lábios, num recado para todos aqueles que questionam a Bahrain Victorious, alvo de buscas policiais há dois dias, após a primeira de duas chegadas em alto nos Pirenéus.
“Quando cruzei a meta, pensei, essencialmente, naquilo que aconteceu há dois dias, durante a noite. Senti-me como um criminoso quando a polícia veio ao nosso hotel”, disse o primeiro corredor a repetir a vitória no prémio da combatividade nesta edição da ‘Grande Boucle’.
Apesar de acreditar que é positivo que as autoridades estejam a vigiar todas as equipas – a procuradoria de Marselha abriu uma investigação preliminar à formação do Bahrain por suspeitas de “aquisição, transporte, posse, importação de uma substância ou método interdito para uso de um desportista sem justificação médica” -, Mohoric confessou-se “desapontado com o sistema”.
“Não é a coisa mais simpática teres a polícia a entrar no teu quarto e a revistá-lo e aos teus pertences. Quando não tens nada a esconder, é um bocado estranho. Nunca me tinha acontecido. E, quando vasculham as tuas fotos pessoais, as fotos da tua família, o teu telefone, as tuas mensagens…”, revelou o jovem campeão esloveno de 26 anos.
Quer pela celebração, quer pelas declarações, a segunda vitória de Mohoric no Tour, após a conquistada na sétima tirada, igualmente com um ataque solitário vindo da fuga, e a 14.ª do seu currículo, no qual constam ainda triunfos numa etapa do Giro2018 e outra na Vuelta2017, ficará indelevelmente ‘manchada’ pela ‘sombra’ que paira sobre a Bahrain Victorious, tal como a jornada de hoje ficará marcada pelo adormecimento do pelotão.
E a 19.ª etapa até começou agitada, mesmo antes de os 207 quilómetros entre Mourenx e Libourne começarem a ser percorridos, com o anúncio dos abandonos do ‘flop’ Miguel Ángel López – o colombiano da Movistar, sexto classificado do Tour2020, passou ao lado desta edição e soma duas desistências consecutivas em grandes Voltas, após ter abandonado também no Giro – e de Michael Woods (Isral Start-Up Nation), o primeiro canadiano a vestir a camisola da montanha na Volta a França.
Mal o diretor do Tour, Christian Prudhomme, acenou com a bandeira para dar a partida real, o eterno combativo Thomas De Gendt (Lotto Soudal), profundamente dececionado com a sua performance nesta ‘Grande Boucle’, ao ponto de sugerir que esta será a sua última participação, saltou do pelotão, pouco antes de uma queda derrubar, entre outros, Geraint Thomas (INEOS) – e já vão quatro ‘trambolhões’ para o vencedor do Tour2018.
Os sobressaltos não ficariam por aí e, ao quilómetro 38, caíram o camisola verde Mark Cavendish, Enric Mas (Movistar), sexto da geral, e Guillaume Martin (Cofidis), oitavo, numa altura em que a numerosa fuga do dia ainda não se tinha ‘encontrado’.
Foi a 100 quilómetros da meta que os primeiros aventureiros da jornada, Mohoric, Franck Bonnamour (B&B Hotels), Julien Bernard (Trek-Segafredo), Jonas Rutsch (EF Education-Nippo), Georg Zimmermann (Intermarché-Wanty Gobert) e Simon Clarke (Qhubeka-Nexthash), receberam a companhia de outros 14 ciclistas.
Eram eles Mike Teunissen (Jumbo-Visma), Jasper Stuvyen e Edward Theuns (Trek-Segafredo), Davide Ballerini (Deceuninck-QuickStep), Nils Politt (Bora-hansgrohe), Christophe Laporte (Cofidis), Silvan Dillier (Alpecin-Fenix), Michael Valgren (EF Education-Nippo), Élie Gesbert (Arkéa-Samsic), Casper Pedersen (DSM), Brent Van Moer (Lotto Soudal), Ion Izagirre (Astana), Max Walscheid (Qhubeka-NextHash), e Anthony Turgis (TotalEnergies).
Talvez devido aos efeitos da queda, ou à presença de Eddy Merckx na caravana, Cavendish e Deceuninck-QuickStep ‘abdicaram’ de tentar desempatar o recorde de vitórias em etapas do Tour, que o britânico e o ‘Canibal’ detêm ‘ex aequo’ com 34 triunfos, e deram ‘luz verde’ à fuga, que, de um momento para o outro, mais do que quintuplicou a vantagem.
Com o pelotão apostado em recuperar das exigentes etapas pirenaicas, e das duas chegadas em alto dos dias anteriores, a vitória na etapa foi discutida entre os fugitivos, que se desdobraram em ataques e contra-ataques, até que Mohoric se isolou a 26 quilómetros da meta, replicando a estratégia vitoriosa da sétima tirada.
O esloveno fez o seu contrarrelógio particular até à meta, que cortou com o tempo de 4:19.17 horas, beneficiando do desentendimento no grupo perseguidor, incapaz de juntar esforços para alcançar o homem da Bahrain Victorious - Nils Politt bem tentou, mas sozinho nada pôde fazer para evitar que Mohoric erguesse novamente os braços na 108.ª edição, 58 segundos diante de Laporte e Pedersen.
“Não posso acreditar, só estava a tentar fazer o meu melhor”, disse o vencedor, enquanto o pelotão, comandado pela UAE Emirates de Tadej Pogacar, ainda pedalava, para cortar a meta 20.50 minutos depois, integrando os portugueses Ruben Guerreiro (EF Education), ainda 18.º da geral, a 52.26 do camisola amarela, e Rui Costa, 78.º, a 2:56.07 horas do seu líder.
O ‘adormecimento’ do pelotão manteve intactas as contas da geral e, assim, o campeão em título vai partir para o derradeiro teste à sua liderança, o contrarrelógio de 30,8 quilómetros entre Libourne e Saint-Emilion, com 5.45 minutos de vantagem sobre Jonas Vingegaard (Jumbo-Visma) e 5.51 sobre o equatoriano Richard Carapaz (INEOS), que discutirão entre si a ordem dos lugares do pódio, atrás do esloveno.
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