A ginasta Beatriz Martins assume que a decisão de terminar a carreira desportiva, que anunciou na quinta-feira, “foi muito ponderada”, e prepara-se agora para iniciar o internato de especialização em pediatria, um sonho antigo que “sempre foi uma prioridade”.

“Todos sabemos que esta vida dupla tem que ter um fim. Sempre tive muito presente qual seria a minha prioridade chegando à fase de ter de começar a trabalhar”, conta Beatriz Martins à agência Lusa, admitindo que “a despedida custa”, mas deixando uma garantia: “Foi uma decisão muito ponderada e estou muito bem resolvida”.

Aos 27 anos de idade, e cerca de 22 depois de a mãe a ter levado a um treino de trampolins “só para ver se gostava”, Beatriz Martins, explica que o adeus à modalidade coincide também com o fim do ciclo olímpico.

“Tendo chegado o final do ciclo e estando prestes a iniciar o internato este foi o ‘timing’ mais acertado. Faltam três anos para os Jogos Paris2024 e seria muito tempo a tentar conciliar as carreiras”, garante.

Beatriz Martins, que fechou a alta competição com um bronze na final de trampolim sincronizado nos Mundiais, ao lado de Catarina Nunes, assume ter vivido muitas alegrias ao longo de mais de duas décadas como atleta e até sente dificuldade em escolher apenas um grande momento, mas consegue.

“Foi muito especial a primeira vez que fui convocada para uma Taça do Mundo, na realidade não é um apuramento normal, é uma seleção da equipa nacional. Foi aí que me ‘caiu a ficha’ e percebi que a minha carreira era a sério”, conta.

A entrada para o projeto olímpico em 2017, “algo que já ambicionava há muito” e “cada medalha conseguida” foram também, diz, “momentos muito marcantes”.

Do lado oposto, Beatriz não tem dúvidas sobre o momento menos bom que viveu nos trampolins: “Foi um novembro de 2011, em Birmingham no meu primeiro Mundial como sénior. A meio de um treino, numa passagem completamente rotineira, entro para um salto e não o consigo fazer, sem motivo aparente”.

“O que aconteceu foi um bocadinho semelhante ao que se que se tem vido a falar no mundo da ginastica depois do que aconteceu com a Simone Biles [nos Jogos Tóquio2020]. Tive aquela síndrome de que começamos a perder os saltos e a noção espacial. Tive de começar a lidar com esse problema no meu primeiro campeonato do mundo de sénior, tinha 17 anos”, conta.

A ginasta, que soma medalhas em campeonatos continentais e mundiais e nos Jogos Europeus, admite que a presença nos Jogos Olímpicos “foi o único objetivo que ficou por cumprir”.

A poucos dias de “trocar” os trampolins pelo Hospital de Santa Maria, onde fará o internato de especialização, a ginasta, natural de Sines, acredita que “a saudade das pessoas” vai ser o mais difícil de gerir.

“Acho que o mais difícil vai ser sentir saudades das pessoas, o estar em equipa e todas as emoções indescritíveis que se vivem numa competição, isso vai, sem dúvida, fazer-me falta”, diz, assumindo que pode ser um exemplo para gerações futuras, como antes outros foram para ela.

Beatriz Martins, que na mensagem de despedida garante que os “trampolins foram um amor à primeira vista”, garante que se um dia for mãe vai querer que o seu filho pratique desporto, mas “não quer incentivar mais uma modalidade do que outra”.

“Essa é uma questão sensível. Não queria muito incentivar mais um desporto do que outros. Claro que não vou esconder o meu passado, e se partir dele dizer que quer experimentar os trampolins não direi que não, mas não vou ser aquela mãe que diz eu fiz, vais ter que ir”, assegura.