O espírito competitivo, a paixão pela comunicação e o “fascínio” pelo mundo dos esports juntam neste setor emergente várias funções, de jornalistas a profissionais do ‘marketing’ e a autodidatas apaixonados, à procura de o ‘alavancar’ enquanto mercado.

Numa área em crescimento, e que a nível mundial gera centenas de milhões de euros, o mercado português tem como principais comunicadores, em várias funções, fãs apaixonados pelo setor e pelos videojogos.

Pela frente, um “público muito exigente”, na comunidade, e “muito desconhecimento”, do ‘lado de fora’, no que é um ‘fosso’ que se começa a combater para permitir uma expansão do alcance.

Natural da Batalha, distrito de Leiria, Ana Guerra tem 25 anos e vive em Lisboa, prosseguindo na Braver uma carreira que já passou pela Microsoft, após formação superior em ‘marketing’ no Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE) e na Universidade de Southampton, em Inglaterra.

Além de fazer ‘streaming’ na popular plataforma Twitch, uma continuação de um caminho no qual sempre adorou, diz, “criar conteúdos”, como os vídeos que lançava no YouTube “em pequenina”, até artigos, podcasts, vídeos e uma ‘newsletter’ que ainda cultiva.

Com um mercado português “cerca de cinco anos atrás de outros como os Estados Unidos”, analisa, esse atraso não significa que seja preciso ‘disparar’, mas antes um “crescimento que faça sentido”.

“Tenho visto um progresso muito interessante, e é isso que é a pica e a vontade de quem trabalha nesta área. Um dos maiores prazeres de trabalhar em esports é que sentimos que todas as pessoas que o fazem é porque querem”, atira.

Sem ser “pelo dinheiro”, mas para “fazer coisas de fãs para fãs”, a comunicação vai ainda assim profissionalizando mais e mais trabalhadores, passa também pelo “caminho natural das coisas” na televisão, com mais competições e programas dedicados.

“É uma forma de entretenimento, como qualquer desporto, e tem uma data de singularidades que as outras não têm. Há, por parte dos jogadores, uma relação mais próxima dos fãs. (...) À medida que as gerações forem mudando... as crianças de agora, daqui a 10 anos, estão a ver esports em vez de futebol”, analisa.

Os “passinhos pequenos” vão-se dando, afirma, e passam por “mais meios de comunicação a apoiar o mercado”, mais marcas “dispostas a investir”, mais organizações a profissionalizarem-se e elevarem os padrões, para que se possa “atrair mais jornalistas” e depois, por atacado, mais público.

A RTP Arena, a Sport TV, “alguns pequenos exemplos” como a televisão do jornal A Bola, o Canal 11 ou a Eleven Sports, vão marcando um aumento de divulgação sobretudo após o período de confinamento devido à pandemia de covid-19, “porque os desportos tradicionais acabaram por ficar parados”.

“Acho que também é preciso que as próprias organizações do lado dos esports saibam trabalhar com jornalistas, o que partilhar, quando... é um caminho, e quando esse trabalho for feito, vamos atrair muito mais, porque muitas vezes não sabemos comunicar até quando temos números extraordinários”, refere.

O setor atravessa várias ‘barreiras’ neste campo: “muito desconhecimento” por parte das marcas, “pouca informação” sobre o estado e potencial de rentabilidade de um investimento ou patrocínio, falta de “compreensão” das agências de comunicação.

Do outro lado, um “público de esports super exigente quanto ao que quer”, que é “cético” mas sabe reconhecer “algo realmente bom”, trazendo a uma marca “uma gratidão e impacto muito maior” do que noutros setores.

Luís Silva, de 34 anos, é um analista de laboratório formado em química do Porto. No mundo dos esports, conhecem-no por ‘Moove’, e desdobra-se em funções, de apresentador a entrevistador e ‘caster’, alguém que lidera uma transmissão ou momento de análise.

Agora dedicado sobretudo ao videojogo emergente Valorant, dinamiza há vários anos o ‘talk show’ Late Night Moove, no qual entrevista profissionais da cena portuguesa sobre vários assuntos, do desempenho competitivo ao estado do setor como um todo.

A paixão pelos esports vem “desde muito novo” e levou-o a estas funções, até porque sempre se viu como “uma pessoa muito competitiva”, e assim chegou a um setor que vê em crescimento e a precisar de maior comunicação, de equipas a organizadores de torneios, e mais conteúdos para envolver a comunidade.

Um tema recorrente é a ‘conversão’ de pessoas que não jogam videojogos, e não estão tão naturalmente interessadas, em consumidores de conteúdos e em público para torneios e outros eventos, digitais ou presenciais.

Sara Lima, que é jornalista na RTP Arena, um projeto da estação pública de televisão dedicado aos esports e videojogos, ficou “fascinada” quando foi chamada a fazer reportagem na Moche XL Esports de 2018, acabando por continuar e chegar à apresentação do magazine semanal, emitido na RTP 1.

Para a jornalista de 32 anos, natural do Porto, é preciso “haver mais comunicação do que acontece nos esports por parte dos canais de comunicação” para diminuir um fosso de perceção entre desportistas e profissionais desta área.

“Estes jovens atletas e jogadores são autênticos desportistas, mesmo que assim não seja considerado. São muitas horas de treino, estando numa equipa, condicionando muito da vida em função deste trabalho... em equipas internacionais, vê-se muito um acompanhamento nutricional e psicológico”, exemplifica.

É preciso “deixar de olhar para os esports como algo negativo”, até pelos inúmeros estudos que, diz, “comprovam que o efeito dos videojogos é positivo”, e o teor comunicativo devia acompanhar esse lado, “para que mais jovens possam entrar no universo” e se retire o ‘estigma’ do setor.

O fundador e diretor da E2 Tech, uma das maiores empresas nacionais no setor, Pedro Silveira, explica à Lusa que trabalham cada vez mais na produção de conteúdos, não só pelos eventos e torneios, a área de ação principal, mas sobretudo para ir ao encontro de “uma comunidade, um público” que possa interagir e reagir a isso.

O que o setor dos ‘media’ já percebeu, diz, é “que há público, muito público”, que talvez tenha “deixado de alguma forma de ver televisão”, teoriza, e agora “está na Twitch ou no YouTube”, a ver vídeos ou transmissões em direto, seja a seguir ‘streamers’ em direto ou a acompanhar competições de esports.

“Existe uma aposta crescente por parte dos grandes grupos de media. Trabalhamos muito com a RTP, em muitos dos nossos conteúdos, mas existe uma grande vontade, e uma aproximação muito forte, dos grupos de media, seja em Portugal seja no mundo, aos grandes produtores”, comenta.