Amilcar Djau Codjovi esperava pelo reinício do campeonato ucraniano para finalmente mostrar o seu valor. Mas, aos 20 anos, feitos no dia 22 de fevereiro, o médio nascido em Espanha, filho de pais da Costa do Marfim e da Guiné-Bissau estava longe de imaginar que a sua carreira seria interrompida pela guerra. O pai, Amadou, fugiu da guerra na Guiné-Bissau para que o filho pudesse ter um futuro. Mas a guerra não larga a família.

Recentemente, Amilcar Codjovi esteve na Turquia onde a sua equipa, o Vorskla Poltava, preparava-se para o reinício do campeonato ucraniano. Na altura, já havia relatos de uma possível invasão russa à Ucrânia. Os pais, Amadeo Sika Marie, e o seu agente Soriebah Kajue, pediram-lhe para não voltar a Ucrânia. Mas Codjovi não lhes deu ouvidos até porque os colegas ucranianos asseguraram-lhe que as notícias de uma possível invasão era mais uma manobra de propaganda da Rússia, contou à CNN.

De repente, tudo mudou.

"No dia 22 de fevereiro, foi o meu aniversário. Ouvimos alguns tiros e disse aos meus colegas, 'olha, fogo de artifício'. E depois fui dormir", conta. Na mesma noite, foi acordado com os bombardeamentos da Rússia à Ucrânia. Codjovi tinha cinco chamadas não atendidas dos seus pais no seu telemóvel. Não sabia o que se passava. Foi quando percebeu que a invasão era real.

"Comecei a entrar em pânico. Abri a minha mala e meti tudo lá dentro. Quando sai do meu quarto, nas instalações do clube, encontrei os meus colegas cá fora, a dizerem que a Ucrânia tinha sido invadida", contou à CNN.

Com as forças russas a atacaram Kharkiv, uma cidade a 160 km de Vorskla, Amilcar Djau Codjovi sabia que tinha de mexer-se. O seu treinador Iurii Maksymov aconselhou-o a esperar no centro de treinos do clube, já que o Vorskla Poltava estava a tratar de tirar todos dali. Mas cedo percebeu que tinha de ter iniciativa, já que alguns colegas já estavam a tratar da sua fuga e disseram-lhe que era "cada um por si".

Com a mala cheia de chocolates, batatas fritas e água, o jovem médio de 20 anos juntou-se a um grupo de outros nove jogadores e respetivas famílias, incluindo um bebé, numa fuga de 1500 metros até a fronteira com a Hungria. Inicialmente a Polónia seria o destino mas, quando ouviram que havia quilómetros de fila de carros à caminho do país, optaram por outra solução. Pelo meio cruzaram-se com veículos de combate do exército ucraniano, que, no início, pensavam ser russos.

Na jornada até a fronteira com a Hungria, tiveram um furo, à noite, numa altura em que também tinham pouco combustível nos depósitos. O medo de ficar entre fogo cruzado de russos e ucranianos esteve sempre presente.

Depois de dois dias de viagem, chegaram à fronteira com a Hungria. Quando pensavam que o pesadelo tinha terminado, eis que começou outro.

"Estávamos muito felizes por finalmente chegar à fronteira mas alguém nos disse, 'Não, vocês não podem entrar a pé, tem de ter um carro. Estávamos presos no lado de fora da fronteira, cheios de frio, já que a sensação térmica era de 20 graus negativos. Algumas pessoas estavam do lado de dentro da fronteira com carros e minivans mas a cobrar 1600 euros por pessoa. Nessa altura, estava quase a desistir", conta o médio espanhol, filho de guineense e costa-marfinense.

Amilcar Djau Codjovi e o seu grupo foram salvos pelo seu colega croata Ivan Pesic, que ligou à embaixada do seu país, que entrou em contacto com o Primeiro-ministro do país. Plenkovic falou com Kiev, que ligou para a fronteira para que deixassem entrar o grupo.

Codjovi vai juntar-se aos pais em Inglaterra, onde aguarda pela definição do seu processo. Para já, o sonho passa por jogar em Espanha e Inglaterra, onde representou o Morecambe.

A Rússia lançou na madrugada de 24 de fevereiro uma ofensiva militar com três frentes na Ucrânia, com forças terrestres e bombardeamentos em várias cidades. As autoridades de Kiev contabilizaram, até ao momento, mais de 2.000 civis mortos, incluindo crianças, e, segundo a ONU, os ataques já provocaram mais de um milhão de refugiados na Polónia, Hungria, Moldova e Roménia, entre outros países.

O Presidente russo, Vladimir Putin, justificou a “operação militar especial” na Ucrânia com a necessidade de desmilitarizar o país vizinho, afirmando ser a única maneira de a Rússia se defender e garantindo que a ofensiva durará o tempo necessário.

O ataque foi condenado pela generalidade da comunidade internacional, e a União Europeia e os Estados Unidos, entre outros, responderam com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas para isolar ainda mais Moscovo.