Com 23 jogos na Champions, entre Sporting e Dínamo de Zagreb, - a propósito da organização portuguesa da 'final 8' da liga milionária - convidámos Tonel, antigo internacional português, a reviver esses momentos na maior competição do mundo a nível de clubes. E logo a começar pelo hino, um momento que mexe com os jogadores e põe a sonhar todos os que anseiam chegar a esse patamar. Desde o Campeonato Nacional de Sénior à Champions foi um pulo. A estreia essa acabou por ser numa partida frente ao Inter, onde o ex-central fez mesmo uma assistência para a vitória histórica dos verdes e brancos por 1-0. Mas o momento que lhe ficou na retina foi mesmo um golo em Barcelona: "Não é para todos", recorda.
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Já mais no papel de treinador e de comentador, o antigo central destrinçou as diferenças entre jogar no campeonato e na Champions e lança o que poderá ser a 'final a 8' em Lisboa.
SAPO Desporto: Sempre foi um sonho jogar na Champions?
Tonel: "Sempre foi algo com que sonhei. Desde que eu comecei a jogar a um nível profissional. Comecei no CNS (Campeonato Nacional de Seniores), depois passei pela Segunda B até à Primeira Liga. E assim que cheguei à Primeira Divisão, lembro-me de pensar: 'Se algum dia ouvir o hino da Champions na minha carreira é sinal de que a minha carreira estava já num nível muito bom'. Quando eu estava a chegar à Primeira Liga e via jogos da Champions, um dos meus sonhos era disputar essa prova."
SD: É assim tão especial ouvir aquele hino?
Tonel: "É especial, eu felizmente tenho muitos jogos na Champions, mas foi sempre especial. Já tinha aquele sonho, antes de ter lá estado. É uma motivação extra. Quando os jogadores dizem que os jogos são todos iguais não é verdade. Há sempre algo de diferente. Nesses jogos há mais emoção e os jogadores vivem-nos de outra forma."
S.D: Há um grande diferença de nível entre os jogadores da I Liga e do nível Champions?
Tonel: "Nota-se uma enorme diferença no ritmo e intensidade, tirando os jogos com os grandes. Os jogadores são mais rápidos, são mais fortes. E o desgaste do jogo é muito diferente. Chegava ao final de um jogo da Champions e estava completamente esgotado. Em muitos jogos da I Liga, acabava os jogos cansado, mas não tinha nada que ver com o que ver com a intensidade da Liga dos Campeões."
S.D: Lembras-te do primeiro jogo na Champions? - creio que foi com o Inter, vitória por 1-0 com um golo de Caneira (2006/07) - num ano em que para além dos italianos, o Sporting tinha o Bayern e o Spartak de grupos da fase de grupos?
Tonel: "Lembro-me perfeitamente. Estava o Ibrahimovic na frente do Inter. Lembro-me do golo do Caneira, depois de um passe longo meu. Depois o Caneira com uma diagonal do lado esquerdo, domina de peito para a frente a dá-lhe um grande 'cacete', como se costuma dizer e faz um grande golo."
SAPO Desporto: Pois, de facto o grupo em que vocês estavam era muito complicado.
Tonel: "São sempre equipas muito fortes, e a dificuldade é sempre grande, em qualquer jogo da Liga dos Campeões."
S.D: Pergunta de algibeira: Porque é que as equipas portugueses têm tanta dificuldade em afirmarem-se na Champions?
Tonel: "Vemos a que velocidade e a que intensidade jogam as equipas portuguesas. Essa dificuldade e essa intensidade não é igual na Liga dos Campeões. Este ano notou-se isso. As equipas portuguesas tiveram muitas dificuldades, quer na Champions e na Liga Europa. A competitividade do nosso campeonato não é tão grande como em outros países e sabemos que os nossos melhores jogadores, mais tarde ou mais cedo acabam por sair."
S.D: E sobre os adversários, quais foram para ti os jogadores mais difíceis de defrontar na Liga dos Campeões?
Tonel: "Há vários como o Ibrahimovic, mas também do Luca Toni (antigo avançado italiano) que era do Bayern. Era muito alto e muito forte e [quando eu o enfrentei] também vinha de uma paragem, de cerca de dois meses sem jogar. E depois chegar e jogar um jogo com a intensidade que é a Champions e depois apanhar um avançado de quase dois metros 'de largo' como se costuma dizer. Depois se a equipa não está bem, é lá atrás que vão aparecer os erros, na defesa. E esse jogo foi de uma dificuldade enorme, também por eu não ter ritmo de jogo."
SAPO Desporto: Jogaste também contra o Ronaldo quando estavas no Dínamo de Zagreb. Certo?
Tonel: "Apanhei o Ronaldo, mas também o Benzema que está há 10/11 anos como titular do Real Madrid. Às vezes falo com pessoas amigas...que dizem 'o Benzema isto ou aquilo'. O que é certo é não houve um ponta de lança que chegasse ao Real Madrid e que o sentasse no banco. Não é por acaso, é porque é muito bom."
Os teus colegas do Dínamo perguntaram-te sobre o Ronaldo, sobre a melhor forma de o defender?
Tonel: "Sim, sim (risos). Perguntaram, mas toda a gente o conhece. Mas dentro de campo as coisas são diferentes, por muito que conheças o jogador, ele também conhece os adversários. Também pode ir para a direita, como pede na profundidade, como pede no pé, como joga em apoio. Depois são as dinâmicas do jogo que dizem. No futebol não há movimentos padrão. Há vários combinações e padrões e depois no jogo é necessário saber lidar com elas.
SAPO Desporto: Lembra-se de outro momento na Liga dos Campeões?
Tonel: "Lembro-me de jogar em Barcelona e fazer o golo do Sporting. Na altura, estava 2-0 e fiz o 2-1. E era o Barcelona de Samuel Etoo, de Messi. Era um Barcelona top e eu fiz o golo. Marcar em Camp Nou, não é para todos, e é um momento que sempre me vou lembrar."
SAPO Desporto: Lembro-me de um golo, no jogo em Alvalade, em que há um livre rápido e o Barcelona marca e os jogadores do Sporting ficam a protestar. Revela bem a falta de experiência e falta de matreirice das equipas portuguesas não?
Tonel: "Sim, verdade. Às vezes falta essa matreirice que obriga muitas vezes os jogadores a terem quando jogam em campeonatos mais fortes. Lembro-me de uma contra o Atlético de Madrid. Fizemos lá um jogo fantástico, em que empatamos 0-0, era o Aguero o ponta de lança. O Grimi foi expulso aos 25´ da primeira parte. Ficámos com 10 jogadores, fizemos um jogo espectacular em que não sofremos nenhum golo frente ao Atlético. Mas mesmo a acabar há uma falta da área e eu ponho-me à frente da bola para não deixar marcar rápido. E o Aguero, sem o árbitro ver, pisa-me o pé, e eu por instinto dou-lhe um pequeno empurrão e o árbitro deu-me cartão vermelho. Isto aos 88/89 minutos. Isso é uma situação que podia acontecer em Portugal, mas era difícil. E são estes pequenos detalhes em que se notam as diferenças. Por isso é que eu digo que a Champions é outro nível. Depois nas decisões, o peso dos países também é importante."
SAPO Desporto: Será difícil lutarmos por esta competição nos próximos anos?
Tonel: "Infelizmente para o nosso futebol, não vamos ter capacidade para disputar meias-finais ou finais nos próximos anos. Vamos ter muito dificuldade, porque os clubes já não estão bem e os melhores jogadores são para sair. Sentia essa dificuldade também quando estive no Dínamo de Zagreb. Jogas a uma velocidade e na Champions é outra e no Dínamo ainda notava mais isso. Porque o campeonato é mais fraco que o nosso, e com menor ou maior dificuldade acabas por ganhar os jogos. Depois chegas à Champions e não é um degrau acima são dois ou três. Por isso é que o Dínamo normalmente faz poucos pontos na Champions, com excepção de na última época em que fez cinco pontos, creio. Normalmente há muito dificuldade em competir. Ninguém dá pontos na Liga dos Campeões."
SAPO Desporto: O que podemos esperar agora dos jogos que faltam disputar?
Tonel: "As equipas para já, em termos físicos, não estão ao nível desejado. Foi um campeonato tremendamente desgastante para estas equipas, que tiveram que terminar os seus campeonatos, o PSG não, mas a Champions sim. Não sei até que ponto pode ser uma vantagem ou desvantagem. Só o tempo é que vai dizer se foi bom para o PSG ter jogos ou não. Isso é muito aleatório. Espero que sejam bons jogos de futebol. São equipas com jogadores do melhor a nível mundial. As equipas de top, mesmo não estando no melhor, em qualquer momento um jogador 'saca' um grande golo, faz uma grande jogada. Isso é, espectacularidade que os jogadores dão a qualquer momento, mesmo não estando no seu melhor. Acho que vamos perder muito da intensidade do jogo, não vai ser ao longo dos 90 minutos. Pode ter períodos mais ou menos intensos, mas a competitividade não vai faltar."
SD: Há alguma equipa que veja que está mais forte nesta fase para conquistar a Champions?
Tonel: "É difícil prever, o PSG creio que não vai ter o Mbappé e não tendo Mbappé... Penso que ele a seguir ao Ronaldo e Messi está nos três melhores mundiais nos próximos anos, no mínimo. Tem outros, Neymar e outros que conseguem desequilibrar. Há também a Juventus, não me parece estar um grande momento, mas também tem jogadores como o Cristiano, Dybala. Mas lá está, um jogo mau pode deitar tudo a perder. Um erro individual pode condicionar. Tudo isto é muito aleatório e é difícil estar a prever."
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