Quando, no domingo passado, o mexicano César Ramos apitou para o pontapé de saída na Arena Rostov, um gigantesco país, tanto no seu tamanho como nos seus problemas, e os seus mais de 200 milhões de habitantes tiveram uma leve amnésia, por volta de duas horas, e se esqueceram da caótica realidade em que vivem. Foi a estreia do Brasil no Mundial da Rússia, contra a Suíça, e os brasileiros passaram a entrar num ‘modo Copa’.
Não foi a estreia dos sonhos, longe disso. Contra uma organizada e forte defesa suíça, valeu o abençoado pé direito de Coutinho, que acertou um belo remate de fora da área. A Suíça, que no primeiro jogo de apuramento para este Mundial’2018 venceu Portugal por 2-0, em setembro de 2016, mostrou-se destemida à medida que os comandados de Tite cediam espaços, e na sequência de um canto, Zuber marcou de cabeça, após um subtil empurrão no central Miranda. Os canarinhos protestaram pelo uso do VAR tanto no golo suíço como num lance posterior, em que reclamaram penálti sobre Gabriel Jesus. Empate sem muitas comemorações pelas ruas do Rio de Janeiro ou de São Paulo, e contas que já precisam ser feitas para a próxima jornada, contra a Costa Rica de Bryan Ruiz e Keylor Navas.
Tirando a festa que é o Campeonato do Mundo, os brasileiros não têm muito que comemorar neste ano de 2018. Talvez o fim do (des)governo Temer, mas sem grandes perspectivas sobre o que o futuro próximo nos reserva. As eleições presidenciais brasileiras, marcadas para outubro, não tem hoje um cenário definido, com o líder nas pesquisas Lula da Silva preso, e demais concorrentes à cadeira central em Brasília a não despertar grande clamor popular. Um militar altamente ‘inflamável’ (Jair Bolsonaro), uma ambientalista discreta nas suas ações políticas (Marina Silva), uma ‘velha raposa’ do Congresso (Ciro Gomes) e um recém-ex-ministro das Finanças bastante impopular (Henrique Meirelles).
Estamos em junho, a quatro meses de uma decisiva eleição para os rumos de um descarrilado país, que amarga há tempos uma crise socioeconómica e política que castiga a sua população mais vulnerável. Mas até ao fim do Mundial, ou da participação brasileira na Rússia, as campanhas políticas ficam em ‘stand by’. É já uma tradição brasileira, e creio mesmo que deveríamos mudar o pleito eleitoral para um ano antes ou depois do Campeonato do Mundo. Mas talvez essa seja mesmo uma estratégia política.
Corrupção, crise, desigualdade, violência, pobreza, política, greves. O vocabulário e o noticiário brasileiros não são os mais otimistas nos últimos anos. Porém, calma! A Seleção está em busca do hexa e precisamos de alguma tranquilidade para concentrar-nos nos jogos. O empate frente à Suíça foi dececionante, mas por algumas horas esquecemo-nos dos problemas que tanto maltratam os brasileiros. Até sexta-feira, voltamos à nossa confusa realidade, mas contra a Costa Rica, por mais duas horas, tentaremos estar apenas atentos ao que Neymar, Coutinho e Jesus podem (e precisam!) fazer. Para os brasileiros, o Campeonato do Mundo poderia nunca ter fim, pois assim viveríamos numa realidade distante, inebriados pela festa do futebol e nosso ainda protagonismo nessa reunião de cúpula das potencias futebolísticas.
* Yuri Bobeck é jornalista, com passagens por rádio UEL FM, jornal Lance!, TV Cultura e TV Globo. Escreve para o SAPO neste Mundial’2018.
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