O futebolista Bruno Fernandes disse hoje ter ficado “mais nervoso” e com “mais ansiedade” após o ataque à academia do Sporting, em que viu agressões a Rui Patrício, William Carvalho, Acuña e Bataglia.

O capitão do Sporting foi ouvido esta tarde na 11.ª sessão do julgamento da invasão à academia ‘leonina’, em 15 de maio de 2018, que decorre no Tribunal de Monsanto, em Lisboa, com 44 arguidos, incluindo o antigo presidente do clube Bruno de Carvalho.

O médio assumiu que após a invasão ficou “mais nervoso” e com “mais ansiedade” antes dos jogos, além do receio que afirmou sentir que esta situação volte a acontecer se a equipa “tiver um resultado menos positivo”.

“Contratei segurança pessoal, na sequência destes factos”, revelou Bruno Fernandes, que a manteve entre “quatro a seis dias”, até ir para a concentração na seleção nacional, que ia disputar o mundial.

A nível pessoal, referiu, este episódio teve influência na vida familiar, revelando que, após a invasão, teve “medo” do que pudesse acontecer à sua família.

"Mais do que a minha vida, temi pela vida dos meus familiares, principalmente a minha filha e a minha mulher. Pedi à minha mulher que fossem para o Porto, para que nada lhes pudesse acontecer", contou o médio, antes de recordar o que se passou nesse 15 maio de 2018.

O jogador contou ao coletivo de juízes que estava no balneário quando se apercebeu da presença dos invasores por causa do barulho, acrescentando que, no balneário, estavam 24 a 25 jogadores e toda a equipa técnica, exceto o treinador Jorge Jesus, que estava no relvado.

"Entraram 20 a 25 adeptos, foram entrando gradualmente. A porta do balneário estava aberta, o nosso team manager [Vasco Fernandes] estava a tentar fechá-la mas não conseguiu, porque entretanto chegaram os adeptos. Os primeiros foram diretos ao Rui Patrício e William e depois outros ao Acuña e Battaglia. O Ricardo Gonçalves tentou segurá-los, mas não conseguiu. Gritavam pelo nome do Acuña, do Battaglia, do William e do Patrício", recordou.

No seu depoimento, o Bruno Fernandes contou que tentou impedir os adeptos de baterem em Battaglia, mas sem sucesso.

"O Battaglia tentou vir para perto de mim, que estava na zona das macas, e eu tentei pegar na máquina do gelo para impedir que lhe acertassem. Atiraram-lhe um garrafão de água na zona dos braços. Eu e o Sebá [Coates] tentámos impedi-los, mas não conseguimos, disseram que não era nada connosco. Depois um outro agrediu o William. Disseram-nos que não merecíamos vestir a camisola do Sporting, que éramos uma m.... e uns filhos da p... Um deu um soco nas costas ao William", recordou.

De acordo com o jogador, os invasores gritaram ainda frases como "'vamos matar-vos, tirem essa camisola, vocês não merecem essa camisola'", acompanhadas de injúrias aos atletas.

Bruno Fernandes disse ainda que viu Jorge Jesus "com sangue na boca" e Bas Dost com "a cabeça já a ser tratada, a levar pontos".

Sobre a mudança do treino desse dia, que estava marcado para a manhã, há várias versões, mas Bruno Fernandes confirmou que foi Bruno de Carvalho a mudar o horário da sessão para a tarde.

"O presidente Bruno de Carvalho é que disse que o treino seria à tarde. Não deu explicação nem disse a hora. Foi especificada mais tarde pelo Vasco Fernandes [team manager]", esclareceu, antes de confessar que até hoje tem receio que o mesmo se volte a repetir.

O médio explicou que ele e o defesa-central Sebastian Coates tentaram demover os elementos, os quais afastaram os dois capitães do Sporting, dizendo: “'Isto não é nada convosco, afastem-se’.”

“Não tive reação. O momento foi demasiado rápido para reagir, ou sequer pensar. Não era comigo, ninguém me tocou”, referiu.

O internacional português lembra-se de ter visto alguns dos elementos a bloquear a porta do balneário.

“Fiquei com a convicção de que ficaram ali [à porta do balneário] para impedirem a saída. Ficaram lá alguns parados. Ninguém saiu, ninguém conseguiu sair. No fim, há um grito de um deles: ‘vamos embora, vamos embora’ e começaram a sair. Nesse momento ainda dizem a frase: ‘não ganhem no domingo que vocês vão ver o que vos acontece, e lançaram uma tocha”, relatou o jogador.

Bruno Fernandes explicou que ainda hoje sofre com os acontecimentos desse dia 15 de maio.

"Obviamente, ainda hoje, quando temos os jogos, sinto ansiedade que caso as coisas não corram bem possa acontecer novamente".

No final da sessão, Miguel Fonseca, advogado de Bruno de Carvalho, requereu a acareação de Bruno Fernandes com Vasco Fernandes, secretário técnico do clube, por apresentarem versões diferentes sobre as circunstâncias e o momento em que os atletas foram informados da hora do treino do dia do ataque.

Contudo, Sílvia Reis, juíza presidente, indeferiu o requerimento.

O julgamento prossegue na quinta-feira com as inquirições do médico Virgílio Abreu, de manhã, e, à tarde, serão ouvidos o jogador Daniel Podence, via Skype, e Ricardo Vaz.

O ataque a Alcochete

Os futebolistas encontravam-se na academia do clube, em Alcochete, em 15 de maio de 2018, quando a equipa do Sporting foi atacada por elementos do grupo organizado de adeptos da claque Juventude Leonina, que agrediram técnicos, jogadores e outros funcionários do clube.

O processo, que está a ser julgado no Tribunal de Monsanto, em Lisboa, tem 44 arguidos, acusados da coautoria de 40 crimes de ameaça agravada, de 19 crimes de ofensa à integridade física qualificada e de 38 crimes de sequestro, todos estes (97 crimes) classificados como terrorismo.

Bruno de Carvalho, à data presidente do clube, ‘Mustafá’, líder da Juventude Leonina, e Bruno Jacinto, ex-oficial de ligação aos adeptos do Sporting, estão acusados, como autores morais, de 40 crimes de ameaça agravada, de 19 crimes de ofensa à integridade física qualificada e de 38 crimes de sequestro, todos estes (97 crimes) classificados como terrorismo.

Os três arguidos respondem ainda por um crime de detenção de arma proibida agravado e ‘Mustafá’ também por um crime de tráfico de estupefacientes.

*Artigo atualizado