O Sporting partiu para a I Liga de futebol 'fora' da discussão para o título, mas deu-se a ‘tempestade perfeita’ e, 19 anos depois, é de novo campeão, de forma tão surpreendentes como justa: foi simplesmente o melhor.

Sob o comando de Rúben Amorim, e do seu ‘3-4-3’, os ‘leões’ não encantaram, não marcaram muitos golos, mas foram uma equipa difícil de bater, invencível até selar o 19.º título e que liderou desde que se apanhou na frente, à sexta jornada.

O segredo esteve também na coesão, determinação e competência, nomeadamente no aproveitamento das circunstâncias, colocando a seu favor aparentes desvantagens, como a ausência de adeptos ou o precoce adeus à Europa. E, quando foi ‘preciso’, também surgiu a ‘estrelinha’, em forma de vitórias ao ‘soar do gongo’.

A saúde do plantel, no que respeita a lesões e à covid-19 – quando teve muitos casos, o seu adversário também os teve e o jogo foi adiado – contribuiu igualmente para ter um ‘onze’ estável, que quase não mexeu, ao ritmo de um jogo por semana.

Sem os adeptos - muitas vezes foco de grande instabilidade interna - e as provas europeias a ‘atrapalhar’, o Sporting começou forte e conquistou a liderança após seis jogos, o que nessa fase parecia, ainda assim, conjuntural.

Mas, a ‘anunciada’ quebra não chegou e os ‘leões’, ‘empurrados’ por golos a ‘potes’ de Pedro Gonçalves, foram-se aguentando na frente, para, em janeiro, fugirem ao Benfica - que bateram em Alvalade por 1-0, selado nos descontos com o primeiro golo de ‘ouro’ de Matheus Nunes – e, em fevereiro, ao FC Porto.

Depois de escassas duas rondas da segunda volta, à 19.ª, a vantagem já era de 10 pontos e o Sporting começava a afirmar-se a campo – não no discurso – como o principal candidato ao título, muito também pelas fraquezas alheias.

O então campeão FC Porto teve a possibilidade de se reposicionar à 21.ª ronda, mas ficou-se por um ‘nulo’ na receção aos ‘leões’, que pareciam, então, em ‘ritmo de cruzeiro’ para o título. A ‘tremedeira’ acabou, porém, por surgir.

Entre as rondas 25 e 28, o Sporting cedeu três empates e, num ápice, os ‘dragões’, moralizados por grande campanha na ‘Champions’, que incluiu atirar para fora da prova a Juventus, de Cristiano Ronaldo, recolocaram-se a quatro pontos.

A jornada 29 acabou por decidir o título: em Braga, os ‘leões’, com um início errático, ficaram muito cedo com 10 e apostaram tudo em defender - liderados por um intransponível Coates, ou quase, porque Adán teve trabalho - e ficar à espera de um ‘milagre’, que chegou, em forma de novo golo decisivo de Matheus Nunes.

O FC Porto não só não se aproximou, como ‘escorregou’ em Moreira de Cónegos (1-1) e a diferença cresceu para seis pontos, que o Sporting já não ‘podia’ perder e não perdeu mesmo, selando o cetro a duas jornadas do fim, com um 1-0 ao Boavista.

A enorme temporada do ‘capitão’ Coates e os 23 golo de Pedro Gonçalves, 14 na primeira volta, pautaram o trajeto dos ‘leões’, cuja coletivo funcionou em pleno, nomeadamente a defesa, com o uruguaio a liderar os três centrais, ao lado de Feddal e Luís Neto (ou Gonçalo Inácio), respaldado por Palhinha e João Mário.

Com o meio bem guardado, e a segurança de Adán entre os postes, Pedro Porro e Nuno Mendes tiveram toda a liberdade para atacar e ajudar Pedro Gonçalves, Nuno Santos e Tiago Tomás, que, enquanto não foram ‘descobertos’, muito ‘chatearam’ as costas das defesas.

O ‘joker’ Matheus Nunes também foi muito importante no sucesso ‘leonino’, bem como Jovane Cabral, enquanto o reforço de ‘luxo’ Paulinho entrou para a história como o autor do golo que selou o título, sendo que pouco mais fez.

Se o Sporting surpreendeu, o FC Porto, que partiu em ‘direção’ ao ‘bis’, não foi tão forte como habitual na defesa e foi incapaz de fazer a diferença entre os ‘grandes’ – empatou os quatro, no que foi a primeira época sem vitórias desde 1982/83 -, de nada lha valendo o facto de não ter perdido após a sexta jornada.

Os ‘dragões’ queixaram-se muito, mesmo tendo beneficiado da ‘enormidade’ de 16 grandes penalidades, e o treinador Sérgio Conceição quase só foi notícia pelos excessos, os vermelhos e as suspensões. O FC Porto europeu não se viu internamente.

O iraniano Taremi, contratado ao Rio Ave, foi um dos destaques dos portistas, juntamente com Sérgio Oliveira, que se afirmou como referência no meio-campo, ao lado de Uribe, outro destaque, tal como Pepe, o central de ‘ferro’, aos 38 anos.

Os portistas ainda salvaram o apuramento direto para a Liga dos Campeões, ao contrário do Benfica: Jorge Jesus voltou e prometeu jogar o “triplo” e “arrasar”, mas tudo isso não passou de um ‘conto de fadas’ e só ‘rimou’ com um dececionante terceiro lugar, que não se via na Luz desde Quique Flores (2008/09).

Os ‘encarnados’ até arrancaram com cinco vitórias, prometendo muito, mas foram só promessas, não cumpridas, numa equipa que também não teve sorte, perdendo André Almeida a abrir e sendo a maior vítima da pandemia da covid-19, com o cúmulo de ter recebido o Nacional desfalcado de 10 jogadores.

O investimento a rondar os 100 milhões de euros justificava, porém, outros resultados, numa equipa que foi a melhor da segunda volta, mas já chegou a meio com o campeonato perdido, a mais de 10 pontos do líder Sporting, ao qual roubaria a invencibilidade na penúltima ronda, com um 4-3 na Luz.

Os 22 golos de Seferovic, o ‘nascimento’ do lateral direito Diogo Gonçalves e a integração de Lucas Veríssimo em janeiro foram o melhor do Benfica, no qual se esperava mais dos reforços Everton, Waldschmidt ou Darwin Núñez, após grande arranque.

Se o Benfica foi o pior dos ‘grandes’, o Sporting de Braga foi o melhor dos ‘pequenos’, mas apenas isso, após uma trajetória falhada após a 22.ª jornada, que os ‘arsenalistas’ acabaram na segunda posição, para depois ‘tombarem’ para um distante quarto.

As lesões de jogadores importantes, como Iuri Medeiros, David Carmo e Francisco Moura, a venda de outros, casos de Bruno Viana ou Paulinho, também não ajudaram, num conjunto em que a fiabilidade de Fransérgio e Al Musrati foi determinante.

Enquanto o conjunto de Carlos Carvalhal, também finalista da Taça de Portugal, ruma à Liga Europa, para a nova Liga Conferência Europa segue o Paços de Ferreira, de Pepa, um ‘abastado’ quinto apesar de só ter somado dois triunfos nos últimos 10 jogos.

O conjunto da Capital do Móvel, que só não conquistou o título de equipa ‘sensação’ por culpa do Sporting, terá a companhia do Santa Clara, que depois de uma participação na ‘desinteressante’ Taça Intertoto (2002), qualificou-se pela primeira vez para a Europa, liderado por Daniel Ramos e os golos de Carlos Júnior.

A formação açoriana só selou o apuramento na última ronda, às custas do Vitória de Guimarães, que pagou cara a instabilidade, o recorde de quatro treinadores, numa prova em que esteve no ‘top 6’ desde a oitava jornada até à penúltima. Fechou em sétimo.

Nos lugares imediatos, ficaram o Moreirense, que ‘empatou’ em casa os três ‘grandes’, o Famalicão, com uma excelente ponta final sob o comando de Ivo Vieira, e, já na segunda metade, o Belenenses SAD, que Petit foi fazendo ‘crescer’ ao longo da prova.

O Gil Vicente, única equipa que bateu o Benfica na segunda volta e esteve a vencer o Sporting nos dois jogos, também se salvou antes da última ronda, tal como o Tondela, equipa em que Pako Ayestarán resistiu até ao fim, com Mario González a brilhar (15 golos).

Na última, salvou-se o Boavista, do veterano Jesualdo Ferreira, e o ‘repescado’ Portimonense, de Paulo Sérgio, juntando-se nos que conseguiram a manutenção ao Marítimo, saldo pela incorporação do espanhol Julio Velázquez.

Em ‘queda livre’ na parte final da época, o Rio Ave ficou no 16.º lugar, depois de ter sido quinto em 2019/20, e só não cairá se ganhar um ‘play-off’ com o terceiro classificado da II Liga, ao que tudo indica o Arouca.

Se os vila-condenses ainda podem cair, já estão certos na edição 2021/22 da II Liga o Farense e o Nacional, que voltam um ano após a subida ‘administrativa’, depois de a covid-19 ter inviabilizado o fecho da edição 2019/20.