Custou, mas foi. Num jogo estranho, das bancadas ao relvado, o FC Porto teve de suar (e muito) para se despedir do Dragão esta época com uma vitória. Apesar da superioridade desde o primeiro minuto, a excelente organização defensiva do Boavista deu pano para mangas aos azuis e brancos, que contra a corrente de jogo acabaram mesmo por sofrer primeiro.
Foi aí que começou uma recuperação apoteótica, alavancada pela expulsão de Pedro Malheiro pouco depois dos axadrezados chegarem à vantagem. Primeiro por Zé Pedro e depois, quando já poucos acreditavam na bancada, por Taremi.
Com este triunfo, o dragão chega à Pedreira na última jornada com dois pontos de vantagem sobre os arsenalistas, bastando-lhe um empate para garantir o terceiro lugar.
Quanto ao Boavista, a permanência - que esteve tão próxima - vai discutir-se em casa, diante do já despromovido Vizela.
Villas-Boas, Pinto da Costa e um dragão longe de estar 'Super'
Ainda o jogo não tinha começado e já tinha entrado na história.
Numa comunhão de salutar, pelo menos nas bancadas, o Dragão colocava-se de pé minutos antes do apito inicial para dar as boas-vindas a André Villas-Boas, pela primeira vez na Tribuna como presidente do FC Porto.
Pinto da Costa cumpriu a rotina dos últimos 42 anos, mas noutra cadeira. Uma imagem carregada de simbolismo e que marca o início de uma nova era no clube azul e branco. Entre o passado e o presente do clube, Pedro Proença, presidente da Liga Portugal, apadrinhou a estreia de Villas-Boas, na função que será sua - pelo menos - nos próximos quatro anos.
Ciente de que um resultado que não uma vitória deixava isolado no terceiro lugar o SC Braga, adversário da próxima e última jornada, na Pedreira, o Dragão encheu-se de alma, mas sem encher as bancadas. Num dia marcado por buscas ao Estádio do Dragão a envolver, novamente, Fernando Madureira e a sua família, figuras maiores dos Super Dragões, a claque ficou à porta. Sim, literalmente à porta. O topo sul, tradicionalmente ocupado pela maior claque portista, surgiu despido de adeptos, que na entrada, passados uns minutos do apito inicial, entoavam cânticos praticamente inaudíveis no relvado, mas que não passaram despercebidos aos milhares que assistiam à partida.
Quem ia aproveitando era o Boavista, muito bem representado na ruidosa bancada - a abarrotar - e na tribuna - com o novo presidente, Fary Faye, acompanhado pelo histórico líder axadrezado Major Valentim Loureiro.
Quanto ao jogo, falemos agora de futebol, os primeiros vinte minutos souberam a pouco. Aparentemente contagiados pelo estranho ambiente vivido no estádio - não raras vezes em silêncio, apesar do esforço da 'Claque Coletivo 95' - aos dragões foi faltando chama. A falta de discernimento é ilustrada na sua plenitude num lance do sempre irrequieto Francisco Conceição, que depois de um trabalho formidável acabou por se atrapalhar por completo, com um toque a mais que deixou a bola fugir-lhe em direção à linha de fundo.
Sem Taremi no onze e novamente com Martim Fernandes e Zé Pedro, Sérgio Conceição ia ajustando posições e puxando as orelhas a Otávio, que numa e noutra ocasião se ia precipitando a decidir sempre que a bola lhe caía nos pés. Parecia confortável o Boavista com o que o jogo ia oferecendo: nem sempre com bola, as panteras sabiam que a iniciativa do jogo não seria uma missão sua, preferindo antes organizar-se bem defensivamente - com um bloco muito baixo, tentando sair em contra-ataque sempre que possível. A somar a tudo isto, os axadrezados iam beneficiando de alguma lentidão na circulação de bola por parte do FC Porto, que lhes ia permitindo posicionarem-se com tempo e critério no momento defensivo.
Enquanto tudo isto, registe-se, os Super Dragões iam cantando a plenos pulmões no exterior do estádio, fazendo uso das habituais bandeiras e apetrechos pirotécnicos utilizados nos jogos. Lá dentro, a habitual facha da claque, por norma situada junto ao relvado, lá continuava enrolada para dentro, do avesso, como anda a vida do seu líder ao longo dos últimos meses.
As melhores oportunidades da primeira parte estavam guardadas para os últimos instantes do primeiro tempo. Do lado do FC Porto, Pepê atirou com estrondo à barra (ainda deve estar a pensar no enorme golo que ficou por acontecer) e pelos axadrezados, um minuto antes, Salvador Agra deixava um aviso real de perigo, travado a tempo por Alan Varela, primeiro, e por Diogo Costa, depois.
Da primeira parte ficava a superioridade do FC Porto, inquestionável, mas também a incapacidade de a traduzir em golos. Pepê esteve muito perto, mas quase sempre à boleia do suspeito do costume: Francisco Conceição. Sempre procurado pelos colegas, o jovem extremo nunca deixou a equipa adormecer, faltando-lhe somente a frieza necessária para definir melhor no último passe. A redenção ainda estava para vir, mas antes o dragão teria de penar.
Um jogo mau para quem sai mais cedo por causa do trânsito
O segundo tempo começou como acabou. Um FC Porto autoritário, mas algo impaciente, mantinha-se incapaz de dar sequência à evidente superioridade em campo. O insólito ambiente nas bancadas pareia estender-se ao relvado. Faltava alegria ao dragão, que ficaria ainda com menos motivos para sorrir aos 60 minutos. O culpado? Bruno Lourenço. Depois de um lance algo confuso com vários ressaltos, o avançado boavisteiro atirou de longe, colocadíssimo, sem hipóteses para Diogo Costa. Mehdi Teremi tinha entrado no minuto anterior e foi sobre o avançado iraniano a falta que valeu a Pedro Malheiro o segundo amarelo a a consequente expulsão, quatro minutos depois do 0-1.
O ímpeto do golo sofrido, que tinha tudo para abalar (ainda mais) a equipa liderada por Sérgio Conceição, atenuou a provável depressão portista, contrariada com ajuda da superioridade numérica. Mas desengane-se se pensa que a partir daqui tudo foi um mar de rosas. Não foi. Não foi por falta de oportunidades, mas o golo do empate tardou em surgir. Só a dez minutos do fim, e depois de uma sequência avassaladora de ataques, foi depois de uma remate absolutamente falhado de Otávio, que a bola caiu milagrosamente em frente a Zé Pedro, que cabeceou para o fundo das redes sem hesitar.
Uma enorme explosão de alegria deixava o Dragão em alvoroço, sedento de uma reviravolta épica que se vislumbrava perante um ambiente absolutamente frenético, por oposição ao vivido até então. O empate interessava ao Boavista, mas não interessava mesmo nada do FC Porto, que não deixava os axadrezados respirarem neste período. Completamente sufocados, iam valendo às panteras as enormes intervenções do guardião João Gonçalves.
Com sete minutos de compensação, a equipa azul e branca espumava por uma 'remontada', enquanto o Boavista fazia o que podia para impedir a reviravolta. O grito de revolta do dragão chegou mesmo no fim, no último suspiro. Nos últimos segundos, um cruzamento genial de Francisco Conceição encontrou Taremi, que numa espécie de reconciliação com os adeptos, cabeceou isolado para o fundo das redes. Uma despedida de sonho do iraniano, 90 golos depois ao serviço dos dragões.
No final, ficará nos livros o jogo épico que deixa o FC Porto de novo em terceiro lugar e, mais do que isso, com a faca e o queijo na mão na sempre exigente deslocação à Pedreira no próximo fim-de-semana. Jogo em que Sérgio Conceição não poderá estar presente no banco, depois de ter visto amarelo após os festejos do golo. Foi o quinto, ficando assim de fora no último jogo do campeonato por acumulação de amarelos.
Quanto ao Boavista, adia a decisão da manutenção para a última jornada, depois de estar tão perto de assegurar a permanência do principal escalão do futebol português.
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