O ex-administrador da SAD do Benfica Nuno Gaioso Ribeiro admitiu hoje ter receado uma intrusão na sua caixa de correio eletrónica, após divulgação na Internet de emails do advogado João Medeiros, que representou os ‘encarnados’ no processo E-toupeira.
Ouvido como testemunha na 24.ª sessão do julgamento do processo ‘Football Leaks’, no Tribunal Central Criminal de Lisboa, o antigo dirigente do clube da Luz explicou que o acompanhamento do processo E-toupeira ficou sob a sua alçada e da do colega de direção João Costa Quinta em setembro de 2018, “na sequência da constituição da Benfica SAD como arguida”, quando o clube decidiu rever a estratégia e a comunicação em torno desse caso.
“Há um momento em que as inquirições de testemunhas de representantes legais começam a ser divulgadas, o que gerou um enorme mal-estar”, afirmou o gestor, de 49 anos, sublinhando: “Tínhamos um grupo de trabalho no Whatsapp e, obviamente, fomos trocando mensagens. Há um alarme generalizado, porque todos nós nos achámos possíveis alvos de intrusão. Assim que aconteceu aquilo a João Medeiros, era possível que acontecesse a todos.”
Nuno Gaioso Ribeiro recusou que João Medeiros fosse alvo de suspeitas como responsável pela fuga por parte dos outros advogados que representavam igualmente a SAD ‘encarnada’, Paulo Saragoça da Mata e Rui Patrício. Contudo, notou que “só passou a ser percetível mais tarde” que os ficheiros alegadamente acedidos por Rui Pinto e divulgados no blogue ‘Mercado de Benfica’ tinham origem na sociedade em que trabalhava João Medeiros, a PLMJ.
“Se para nós sei o que foi o stress e as implicações [desta situação], para João Medeiros foi dramático, que tinha um problema laboral, com os seus pares, os amigos e a família”, vincou o antigo vice-presidente do Benfica, no qual exerceu funções entre 2012 e este ano, acrescentando: “Ninguém imagina o que é viver isto. Entre a gestão de danos, a gestão reputacional e a gestão do pequeno conflito, João Medeiros viveu numa ansiedade enorme.”
Uma descrição que foi repetida e acentuada pela mulher do advogado, Catarina Medeiros, que, ao coletivo de juízes, revelou que “a vida nunca mais foi a mesma” depois do ataque informático e consequente publicação da caixa de correio eletrónica do marido na Internet, resumindo esse período a “semanas horríveis” e os últimos dois anos a uma sensação de ter “sempre uma espada em cima da cabeça” do antigo profissional da PLMJ.
“Estava de tal maneira ansioso, que não conseguia trabalhar ou deixar de pensar no que estava a acontecer, sempre com medo de os clientes deixarem de confiar nele e de novos clientes não irem ter com ele. Começou a apoderar-se da cabeça dele, e tem cinco filhos para sustentar. O meu marido até andou numa psicóloga por causa disto”, referiu, sem deixar de garantir que “os acontecimentos ainda pairam na vida dele” e alimentam um sentimento de “insegurança”.
Também os depoimentos da advogada e ex-colega Filipa Cotta Salgado e da ex-secretária Maria João Domingos corroboraram o impacto sentido por João Medeiros com a publicação de informações profissionais e pessoais na Internet, em linha com as audições das testemunhas de Inês Almeida Costa, igualmente assistente neste processo, que hoje se fez ouvir pelo marido e arquiteto Tiago Almeida e pela amiga Joana Boaventura Martins.
A próxima sessão do julgamento está agendada para quinta-feira, dia para o qual estão previstas as inquirições do advogado Pedro Melo e do diretor de informática da Federação Portuguesa de Futebol, Hugo Freitas.
Rui Pinto, de 32 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.
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