Os adeptos de espetáculos desportivos apresentaram no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa uma intimação para declarar a ilegalidade do cartão do adepto, anunciou hoje a Associação Portuguesa de Defesa do Adepto (APDA).

A ação “para proteção de direitos, liberdades e garantias fundamentais” tem como objetivo “declarar a ilegalidade das normas da Portaria n.º 159/2020”, que regulamenta o cartão do adepto, cuja implementação, segundo o Governo, visa controlar e promover as boas práticas de segurança e combater o racismo, xenofobia e intolerância nos eventos desportivos.

A APDA considera, no entanto, que a portaria “bloqueia desproporcionalmente direitos, liberdades e garantias fundamentais dos adeptos” e que o faz de uma forma “flagrantemente inconstitucional”.

“Não podem ser os adeptos em geral e os Grupos Organizados de Adeptos (GOA) em particular a ser constantemente estigmatizados através da imposição de um cartão que é um mero sucedâneo de um vulgar ‘chip’ que se implanta nos animais perigosos, com vista ao seu controlo, muito menos pode ser à custa de um atropelo da Constituição da República Portuguesa que esta medida é implantada”, justifica a APDA em comunicado.

Contactada pela Lusa, a presidente da APDA considerou que este é “um momento histórico, independentemente do desfecho” que venha a ter, porque se trata de uma ação que abrange “todos os adeptos em uníssono”, incluindo “não só os GOA e a APDA, como também outros adeptos que não fazem parte dos GOA”, o que constitui “um passo muito importante na construção de uma mentalidade diferente em relação aos adeptos”.

“Não compreendemos como uma medida que falhou nos últimos 15 anos noutros países da Europa continua a ser apresentada como ‘a última batata do pacote’. Apenas continua em vigor em Itália e na Turquia, sendo que em Itália vai deixar de estar brevemente e a Turquia não pode ser considerada propriamente um exemplo na gestão destas matérias”, acrescentou Martha Gens.

De acordo com a intimação apresentada pela APDA, a portaria publicada em Diário da República, em junho, viola os direitos constitucionais de “livre desenvolvimento da personalidade”, de “liberdade” e da proibição de “acesso a dados pessoais de terceiros, salvo em casos excecionais previstos na lei”.

A ação apresenta ainda como violações constitucionais da portaria o “direito de reunião e manifestação”, que consagra o direto de “reunir pacificamente e sem armas, mesmo em lugares públicos, sem necessidade de qualquer autorização”, o direito de “exprimir e divulgar livremente o pensamento pela palavra, imagem ou qualquer meio” e ainda a “liberdade (negativa) de associação”.

“Indo ainda mais longe”, a APDA considera que a portaria “contraria de forma desproporcional” tudo o que é “preconizado na Convenção do Conselho da Europa sobre uma abordagem integrada da segurança, proteção e dos serviços” por ocasião de jogos de futebol e outras manifestações desportivas.

A portaria que regula o novo cartão do adepto, documento que visa a “promoção da segurança e do combate ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos" foi publicada em Diário da República em 26 de junho.

Segundo nota divulgada pelo Governo, a utilização do cartão do adepto "permite o registo e a identificação dos seus titulares para efeitos de dimensionamento e gestão do acesso às zonas com condições especiais de acesso e permanência de adeptos".

O cartão do adepto pode ser requisitado por qualquer pessoa acima dos 16 anos, terá a validade de três anos e serve para conceder acesso a zonas identificadas nos estádios, normalmente associadas à presença de claques.

No início de outubro, segundo declarações à agência Lusa do presidente da Autoridade para a Prevenção e Combate à Violência no Desporto, Rodrigo Cavaleiro, já tinham sido emitidos cerca de 400 cartões do adepto.