A crescente impaciência proporcionou 20 trocas técnicas definitivas em 14 clubes na edição 2024/25 da I Liga de futebol, alerta o treinador Álvaro Pacheco, seguro de que deve haver tempo para criar uma identidade e cimentar rotinas.

“Os dirigentes têm de parar para refletir e perceber algo que é fundamental: ao longo da história do futebol, quais foram as equipas que tiveram mais sucesso com regularidade? Facilmente, percebe-se que são aquelas que conseguiram estabilidade e solidez e que, nos maus momentos, deram apoio às suas equipas técnicas para que as coisas fossem fomentadas. Sinto cada vez mais que isto está a perder-se no futebol nacional”, notou à agência Lusa o ex-técnico de Vizela, Estoril e Vitória de Guimarães no escalão principal.

O AVS, 16.º e antepenúltimo classificado e a caminho do play-off face ao Vizela, terceiro da II Liga, utilizou quatro treinadores, mais um do que o bicampeão Sporting, o Vitória de Guimarães, sexto classificado e fora das competições europeias da próxima época, o Gil Vicente e o despromovido Boavista - ‘galos’ e ‘panteras’ designaram ainda dois interinos.

“Infelizmente, os dirigentes querem tudo para o agora ou para ontem, mas não percebem que, por vezes, isso não é o mais vantajoso para a equipa. Claramente, têm de entender que perfil de treinador e ideia de jogo buscam. Depois, é preciso dar tempo, condições e estabilidade em vez de se andar sistematicamente a avaliar o trabalho em função de um, dois ou três jogos. Eu costumo dizer - e fui o espelho disso - que, por vezes, é importante que as equipas tenham resultados menos positivos para que, perante essas fragilidades, possam trabalhar e ficarem mais fortes. Para isso, é preciso ter estabilidade e confiança de quem as dirige”, disse Álvaro Pacheco, com 79 jogos nas últimas três épocas na elite.

O Sporting celebrou o 21.º título e festejou em edições seguidas pela primeira vez em 71 anos, sendo que não havia um campeão nacional com três treinadores na mesma edição desde 1967/68, quando o chileno Fernando Riera, Fernando Cabrita e o brasileiro Otto Glória participaram na conquista do 16.º troféu, e segundo de três seguidos, das ‘águias’.

Álvaro Pacheco vinca que os ‘leões’ tiveram dificuldades aquando da transição de Ruben Amorim, campeão em 2020/21 e 2023/24 e agora treinador dos ingleses do Manchester United, para João Pereira, mas estabilizaram com a contratação de Rui Borges ao Vitória de Guimarães, numa edição assinalada pelo inédito pleno de mexidas nos três ‘grandes’.

O Benfica, segundo, serenou com o regresso de Bruno Lage, sucessor do alemão Roger Schmidt, e foi aos oitavos de final da Liga dos Campeões, enquanto o FC Porto, terceiro, acusou os reflexos da transformação diretiva e técnica encetada com a eleição de André Villas-Boas, que despediu Vítor Bruno em janeiro e apostou no argentino Martín Anselmi.

“Sporting e FC Porto perderam treinadores carismáticos em relação à época anterior. Na minha opinião, toda a estrutura e ideia de jogo de cada clube andavam imenso à volta de Ruben Amorim e Sérgio Conceição, respetivamente. Quando se perde dois dos melhores treinadores portugueses e mundiais, é evidente que se sente essa transição”, enquadrou.

Questionado sobre a continuidade de Rui Borges, Bruno Lage e Martín Anselmi nos seus clubes, Álvaro Pacheco não faz prognósticos, mas fala em “três bons treinadores, com diferentes metodologias e formas de estar e operacionalizar, que requerem estabilidade”.

“Sinto que têm grande potencial para progredir e, se continuarem na próxima temporada, terão os seus clubes mais competitivos e preparados para lutar pelos objetivos”, projetou.

Dos 18 primodivisionários, só quatro não mexeram no banco, casos do Santa Clara e do Nacional, que regressaram à elite esta temporada - com os açorianos a rumarem às pré-eliminatórias da Liga Conferência, ao ficarem em quinto -, do Casa Pia e do Estoril Praia.

“O Nacional andou muito tempo na zona de descida e, quando toda a gente pensava que eles não atingiriam a meta, o seu presidente disse que o treinador teria tempo para impor as suas ideias e seriam feitos os ajustes necessários para tornar o coletivo mais forte. O que aconteceu? Conseguiram a permanência e mostraram futebol de alto nível”, ilustrou Álvaro Pacheco, inativo desde janeiro, quando abandonou o Al Orobah, da Liga saudita.