Um Benfica de quase desconhecidos conquistou há meio século a sua primeira Taça dos Clubes Campeões Europeus de futebol, ao dar a volta ao colosso FC Barcelona, numa final em que todos apostavam nos catalães.

O Estádio Wankdorf, em Berna, foi o palco para receber a 31 de Maio de 1961 um Benfica que chegara à final sem contestação, mas que era um autêntico intruso perante o favorito FC Barcelona, a equipa que fora capaz de eliminar o pentacampeão Real Madrid.

Cinquenta anos depois, a história é contada na primeira pessoa por alguns dos jogadores “encarnados”, unânimes em reconhecer que «não passava pela cabeça de ninguém» que a equipa treinada por Bélla Guttmann fosse capaz de vencer.

«Ninguém pensava que o FC Barcelona, os reis do futebol, fossem derrotados por uma equipa praticamente da província», lembrou à Agência Lusa o defesa direito Mário João, um dos escolhidos para o “onze” que venceu os catalães por 3-2.

A exigência da final, na qual o Benfica mediria forças com alguns dos melhores jogadores daquele tempo – Czibor, Kubala, Suarez, Evaristo ou Kocsis –, levou a comitiva a viajar para Berna com uma semana de antecedência.

Bélla Guttmann procurou relaxar e ambientar os jogadores e todos os dias, num local rodeado de montanhas e lagos (em Interlaken), entre treinos e preparação, ocupava os jogadores com visitas a fábricas, sobretudo de chocolates.

O pensamento não deixava, no entanto, de estar virado para a gigantesca empreitada que a equipa tinha pela frente:

«O FC Barcelona era uma das melhores equipas do mundo, éramos os intrusos da final», lembrou o médio direito José Augusto.

Na hora das decisões, os catalães estiveram em vantagem, com um golo de Kocsis, aos 20 minutos, mas pouco depois da meia hora já o Benfica marcara pelo capitão José Águas (30) e tivera a sorte de um auto-golo do guarda-redes Ramallets (32).

Foi preciso chegar ao intervalo para o treinador húngaro do Benfica dizer aos jogadores que estavam a um passo de um sonho inesperado e impensável para muitos.

«Ao intervalo disse: o jogo está ganho. O FC Barcelona não pode com as pernas, vamos para cima deles e vamos ganhar», recordou Ângelo, o lateral esquerdo, que fez praticamente toda a campanha europeia, falhando apenas o jogo inaugural (com o Hearts).

Na segunda metade, com um golo de fora da área (55), foi Coluna a agravar o pesadelo dos ‘culés’ (3-1) – que viram duas bolas salvas na linha de Costa Pereira e várias na trave -, e mesmo o golo de Czibor (3-2, 75 minutos) não seria suficiente.

«Foi uma alegria indescritível. Não só dos benfiquistas e portugueses que nos acompanharam, mas de todos os emigrantes nessa final», disse José Augusto, numa antevisão do que seria a chegada a Lisboa.

Para Artur Santos, jogador que esteve em Berna na condição de adepto e que apenas fez um dos nove jogos da campanha europeia, na Luz, com o Ujpest, o título europeu teve o efeito de o honrar até aos dias de hoje.

«A honra mora cá, certamente», disse, com o orgulho próprio de quem fez parte de um grupo de 14 jogadores que passo a passo conduziu o clube “encarnado” aquele que foi um dos melhores resultados da sua história.

Na chegada a Lisboa, as ruas encheram-se de gentes, num percurso de quase três horas do autocarro benfiquista entre o aeroporto e a baixa.

«Foi extraordinário. Por onde passámos foi indescritível, de milhares e milhares de pessoas», disse José Augusto, lembrando o cenário com que os jogadores se depararam naquela que seria a primeira grande comemoração europeia... e que viria a repetir-se no ano seguinte.