“Na brincadeira, quando era mais novo, ainda nos infantis, gozávamos com a situação, de que um dia chegaríamos aos Jogos. Quase nunca dizia isso, porque tinha a sensação de que isso seria impossível para mim. Deu assim uma volta grande. Só ouvia os meus colegas a dizer que iam aos Jogos, eu pensava que era impossível. Mas depois a vida dá muitas voltas”, conta à Lusa o nadador, de 24 anos.
Nascido na segunda maior cidade do Malawi, Blantyre, a mais de sete mil quilómetros da Leiria, a que agora chama casa, o nadador não pensou mais cedo em representar a seleção daquele país africano porque não lhe tinha ocorrido que poderia ser “o melhor nadador do Malawi”.
“Em 2016, antes dos Jogos, um colega disse-me para ver se não seria o melhor e se não poderia ir aos Jogos. Mandei e-mails para a federação do Malawi, disseram-me que tinha tempos e que estava qualificado, mas tinha falhado o Mundial e era preciso ter feito isso”, revela.
Gorada a possibilidade do Rio2016, passou a ir “sempre às provas internacionais que havia” e, depois de conversas e conversas com a federação malawiana, foi chamado aos Nacionais, onde ganhou “tudo” o que nadou, e aos campeonatos africanos, CANA, no qual foi conseguindo “algumas medalhas”.
Foi nadando e lá chegou aos Jogos: sétimo na quinta eliminatória dos 50 livres, embora seja especializado em bruços, com um tempo de 24,00 segundos, tendo sido designado por convite, entregue ao país, que depois o nomeou, como atleta com mais pontos no ‘ranking’ internacional.
“Correu bem. Basicamente, fiz o meu recorde pessoal, que é 23,99. Na altura não fiquei triste, fiquei contente, mas ao chegar à aldeia comecei a pensar ‘fogo, por 0,01. Podia ter feito o recorde’. De resto, foi tudo espetacular”, resume.
A ligação da família começa com os avós maternos, que vivem e têm negócios naquele país, para o qual a mãe voltou após estudar e conhecer o pai em Portugal, tendo Filipe e a irmã nascido em África.
Veio para Portugal com 10 anos e viveu sempre em Leiria, onde é “treinador adjunto do Bairro dos Anjos” e ‘personal trainer’ ao domicílio, ou ao ar livre, conciliando o trabalho com o sonho olímpico.
“Gostava de voltar a viver esta experiência, mas sem covid-19. Gostava de chegar a Paris2024”, garante.
A experiência fora das piscinas em Tóquio foi muito marcada pela situação pandémica, acabando por falar apenas com um ou outro colega de seleção e “só olá e boa tarde, como correu a prova, boa sorte e coisas assim” com a seleção portuguesa, dado o necessário distanciamento e desfasamento dos atletas nas áreas comuns.
Dentro de água, “parecia que tinha voltado aos cadetes”, afirma, quanto ao nervosismo, confidenciando que “nunca” se sentiu assim. “Quando toquei na parede [no final], foi um alívio...”, desabafa o novo ‘herói’ olímpico do Malawi.
Integrado numa comitiva de cinco atletas, Gomes é agora um de menos de uma centena de atletas olímpicos daquele país, cuja capital é Lilongwe, e um de dois nadadores em Tóquio2020, a par de Jessica Makwenda.
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