Atletas olímpicos portugueses relataram hoje as suas experiências na conciliação da medicina com o percurso no alto rendimento, na apresentação de um livro dedicado ao tema, interpelando o Governo para que facilite a carreira dual.

“Recebemos e vamos tentar sair a jogar”, respondeu o secretário de Estado do Desporto, Pedro Dias, referindo-se ao desafio deixado por Marta Onofre durante a apresentação do livro e abertura da exposição ‘Atletas Olímpicos Médicos’, na sede da Ordem dos Médicos, em Lisboa.

Pouco antes, a atleta que representou Portugal no salto com vara no Rio2016 tinha revelado que, após regressar do Brasil, reuniu, na companhia dos também olímpicos Rui Bragança e Ana Rente, com responsáveis do Ministério da Saúde para abordar a possibilidade de ser dado aos atletas de alta competição mais tempo para concluírem a especialidade, sem que tivesse havido uma posterior resposta.

Depois de ouvir a recordista nacional do salto com vara dizer que espera que no futuro outros atletas tenham uma tarefa mais fácil na conciliação da carreira de alta competição com a medicina, Pedro Dias recordou que existe, neste momento, um projeto-piloto para “a extensão do programa” das unidades de apoio ao alto rendimento na escola.

“Seguramente temos de o reforçar, mas recentemente foi alargado ao Ensino Superior. Vamos necessitar do vosso apoio, nomeadamente da Ordem dos Médicos, na implementação deste piloto, porque sabemos que temos um número significativo de estudantes-atletas na medicina, que anualmente têm tido muitas dificuldades nesta conciliação”, declarou, prometendo que o Governo tudo fará para que este projeto-piloto “seja um sucesso” e que seja implementado “no ano seguinte em todas as instituições do Ensino Superior”.

O secretário de Estado do Desporto enalteceu “a excelência” do trabalho “como médicos e atletas” daqueles que ficaram perpetuados no livro, que reúne a história de 18 olímpicos com carreira na medicina.

Antes, tinham discursado os ‘protagonistas’ da obra, com Rui Bragança a ser o primeiro a tomar a palavra, para garantir que “se não fosse o taekwondo, não era médico”.

“Quem foi olímpico tem uma maneira diferente de ver as coisas e eu espero estar à altura, a trazer as aprendizagens de 20 anos de taekwondo para a medicina”, confessou, num contraponto com Francisco Belo, que espera tornar-se “tão bom médico” como é lançador de peso.

Além do recém-coroado campeão ibero-americano, que esteve em Tóquio2020, também Marta Onofre falou da ‘herança’ de “16 anos de conciliação da carreira dual”.

“Estes últimos 16 anos foram anos de muito trabalho, muita dor e muita frustração, que apesar de tudo são mais constantes do que os momentos em que nos sentimos realizados. Esses anos permitiram-me ser a pessoa que sou hoje”, afirmou, assumindo que conciliar a medicina e a maternidade “com uma carreira de alto rendimento é uma perfeita loucura”.

Na apresentação, estiveram presentes também o antigo bastonário da Ordem dos Médicos e atirador olímpico António Gentil Martins, Jacques Pena (tiro), Joaquim Ramada (vela) e o presidente da Federação Portuguesa de Vela, Mário Quina, em representação do pai e único médico que ganhou uma medalha olímpica: o velejador Mário Gentil Quina, prata em Roma1960.

“Todos os exemplos que temos neste livro são mais do que exemplos bem conseguidos”, defendeu, por sua parte, José Costa, secretário-geral da Comissão de Atletas Olímpicos, salientando ainda o facto de estes 18 casos serem exemplo de alguém que “teve a capacidade de conjugar dois mundos que muitas vezes não se tocam e são difíceis de coexistir”.

“Além da complexidade que acarreta a carreira dual, a medicina tem outra particularidade: permite que os atletas olímpicos possam exponenciar os valores olímpicos e a humanidade que adquirem enquanto atletas”, evidenciou.

Já depois de Artur Lopes, vice-presidente do Comité Olímpico de Portugal, ter instado também o Governo a olhar para a questão da carreira dual de modo a que seja proporcionada a estes atletas-médicos “a vida que permita ligar uma paixão à outra”, também o bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, defendeu que é preciso “fazer alguma coisa” e “desenvolver um caminho conjunto” para ajudar estes atletas.