Ambição no discurso, serenidade na quadra. As palavras do homem que pode levar Portugal ao topo do Mundo

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Jorge Braz, selecionador de futsal de Portugal, é um homem ambicioso, sereno nas palavras, como mostram as suas intervenções ao longo do Mundial de futsal.
Ambição no discurso, serenidade na quadra. As palavras do homem que pode levar Portugal ao topo do Mundo
Jorge Braz, treinador de Portugal, dá indicações aos jogadores LusaESTELA SILVA/LUSA

É o treinador com mais jogos a comandar a seleção principal de futsal de Portugal e aquele que está há mais tempo à   frente dos destinos do cinco nacional. Jorge Braz conhece o futsal português como poucos e a sua experiência tem sido crucial na caminhada de Portugal no Mundial da modalidade. Depois de ambicionar superar o 3.º lugar alcançado na Guatemala no ano 2000, o melhor resultado de Portugal até hoje, o selecionador reformulou a ambição e colocou a fasquia no ponto mais alto: ser campeão do Mundo. Tudo irá decidir-se hoje.

Frente as Ilhas Salomão, chegou ao jogo 154 ao comando da seleção principal de Portugal, deixando para trás os 153 encontros de Orlando Duarte, seu antecessor que treinou Portugal durante 10 anos, entre 2000 e 2010. Na final do Mundial de Futsal contra a Argentina, Jorge Braz poderá banhar a ouro o seu jogo 159 no comando dos lusos.

O seu trabalho à frente da seleção das quinas tem merecido o devido destaque e reconhecimento, cá e lá fora, como mostram as várias distinções. Jorge Braz tem sido, desde 2018, considerado o melhor selecionador do mundo, distinção que já venceu por três vezes consecutivas, fruto do reconhecimento do trabalho feito por Portugal, desde o Europeu conquistado.

"Serve para toda a gente que trabalha à minha volta perceber que podemos atingir grandes feitos. São muitos anos a tentar organizar e trabalhar todo este processo, para perceber que Portugal pode estar no topo do mundo, nas grandes decisões e vencer os melhores países do mundo. É preciso trabalhar mais que os outros e não pode haver limitações ao nosso trabalho, pois talento e ambição o futsal português tem", disse à Lusa, sobre os prémios que tem vindo a receber.

O técnico de 49 anos tem tido um discurso ambicioso mas puxando sempre os jogadores à terra, para mante-los focados no que podem controlar. Foi assim durante a ronda de elite, de apuramento para a prova, que termina este domingo em Kaunas, Lituânia. Foi assim também durante a preparação que decorreu em Rio Maior, com vários encontros amigáveis.

O sucesso recente da seleção de futsal não pode ser dissociada do trabalho nos clubes. Portugal deixou de ser concorrente para passar a candidato, deixou de apenas participar para ganhar. Benfica e Sporting já foram campeões europeus, com os Leões a terem mais que um título (é o atual campeão da Europa e dá sete jogadores à Seleção de Portugal).

Muitos dos melhores da modalidade a nível disputam a sempre complicada Liga Portuguesa, que atrai craques do Brasil mas também da Rússia e da própria vizinha Espanha. O Melhor Jogador do Mundo e um dos melhores de sempre - Ricardinho - é Português e tem sido o principal embaixador português da modalidade lá fora.

O primeiro título europeu no futsal em 2018 na Eslovénia veio mostrar que Portugal pode vencer qualquer seleção. O triunfo dramático frente a Espanha na final deixou claro que Portugal tinha mais que argumentos para bater uma fortíssima seleção espanhola, campeã europeia e mundial.

Na seleção, a inteligência de Jorge Braz a da sua equipa técnica têm permitido tirar partido do melhor que se faz nos clubes. O grupo que está a disputar o Mundial na Lituânia mistura veterania (Ricardinho, Bebé, João Matos e Vítor Hugo) com juventude (Afonso, Zicky e Tomás Paçó), num grupo que tem espalhado magia e alma lusitana nas quadras da Lituânia.

Numa modalidade onde os pormenores contam muito, Jorge Braz tem mostrado pergaminhos. No seu discurso, antes e depois dos jogos, mas também nas suas intervenções nas pausas técnicas, o selecionador de Portugal tem-se mostrado muito sereno, dizendo apenas o essencial para aquilo que o momento pede. Um discurso tranquilo e uma confiança inabalável nas capacidades e qualidades dos seus jogadores. E isso vê-se na quadra.

O que disse Jorge Braz durante o Mundial2021

Jorge Braz, antes da final com a Argentina

"Estamos todos no mesmo barco. Preparar e refinar [a estratégia], com felicidade e alegria. Amanhã [domingo] é um dia de sorrisos. É sermos Portugal com o orgulho que temos tido até hoje. Vai ser dos jogos mais fáceis de preparar. São 16 homens fantásticos e não é preciso ‘clique’. Eles sabem"

"O desgaste emocional tem sido extremamente positivo e altamente preparador para amanhã [domingo]. Só olho para isso como vantagens. Fisicamente, vamos estar onde queria que estivesse toda a gente. Graças ao comportamento da equipa, passámos as etapas todas do percurso e estamos na última, a chegar ao cume da montanha. Vamos dar tudo. Sabemos muito bem o que queremos levar para Portugal".

Jorge Braz, após apuramento de Portugal para a final, ao bater o Cazaquistão nos penáltis

"Tínhamos um objetivo claro, que já está alcançado. Queremos sempre mais e já não chega este. Acreditava muito que iríamos chegar às medalhas, porque sabíamos que íamos ter um 'upgrade' em relação ao último Campeonato do Mundo. Uma medalha já levamos, mas já reformulámos o objetivo. Queremos vencer o Campeonato do Mundo. Parece-me que não é nada utópico. Temos toda a legitimidade para querer muito isso".

"Percebemos que Campeonatos do Mundo e da Europa têm obstáculos gigantescos para se chegar ao cume da montanha. Não nos pode atrapalhar. Esta equipa tem aprendido a saber viver com isso. É evidente que me enche de orgulho estar numa final do Campeonato do Mundo, mas enche-me muito por ver a felicidade que está dentro daquele balneário e por ver a felicidade dos portugueses e de toda a gente do futsal. Isso é que me deixa com um orgulho e felicidade imensa, pois todos fazemos parte do processo. É um orgulho brutal para mim e diz-me muito porque queríamos alavancar o futsal para este patamar. Dependeu de muita gente, não foi só do Jorge Braz."

"Tinha enorme confiança quando vi que empatámos e que íamos a penáltis. A única coisa que disse foi: ‘Vamos ganhar. Vai defender o Bebé dois, o Vítor [Hugo] três, e vai marcar este, este e este. O último vai ser este’. Tive sorte. É confiar e dizer assim: 'São vocês e siga'"

Jorge Braz, antes da meia-final com o Cazaquistão

"O nosso objetivo é muito claro. Chegámos até aqui e não é aqui que queremos parar. Para o atingir, temos agora mais um jogo importantíssimo. Sinto toda a gente com enorme vontade e ambição gigantesca. A este nível, tudo pode acontecer. Vamos atrás do que queremos muito”, realçou, em conferência de imprensa de antevisão à partida. A melhor lição de jogos deste tipo é que ainda bem que os ‘oitavos’ foram como foram e que os ‘quartos’ foram com a Espanha. Ajuda-nos a perceber onde estamos, que ambição temos e o que queremos daqui para a frente".

Jorge Braz, após a vitória contra a Espanha nos quartos de final, após prolongamento

"Ando há 11 anos a dizer que é este o nível onde temos de estar e competir. Senti a equipa em todos os momentos, do início ao fim, com enorme vontade e ambição de vencer. Isso é que temos de levar e sentir cá dentro. O nosso nível é este. Andamos muitos anos a trabalhar para estar neste nível. Era esse o objetivo, mas ainda não ganhámos nada. Passámos uma etapa muito difícil, mas vem aí a etapa ainda mais difícil. Não há pontos de viragem. É a construção que se vai fazendo. Queríamos chegar a este nível e sentir o respeito de Espanha ou Brasil. Agora todos os países nos respeitam, pelo trabalho e processo. Isto foi o que nós construímos e para onde estamos a ir."

"Temos de pensar jogo a jogo e, agora, vamos pensar no próximo, com esta ambição e alegria, a tentar superar tudo o que nos aparecer pela frente. Disso ninguém nos pode acusar, da ambição, do crer e de orgulhar os portugueses. Quem vier, vai ter de levar connosco."

Jorge Braz, antes do jogo contra a Espanha

"Atingir objetivos e superarmo-nos depende da coragem e ambição. Quando alguém nos quer pressionar muito, é não nos intimidarmos e irmos nós para a frente. Temos de ser extremamente racionais, mas altamente ambiciosos. Para ir atrás do nosso objetivo, temos de passar esta etapa e estamos com ambição de a passar. [...] Temos gente altamente criativa, que vê coisas momentâneas e curtas e que abrem espaço. É importante, mas é muito importante o plano e as coisas simples bem feitas. Se todos exercermos as nossas funções bem, somos uma equipa fortíssima".

"Confio muito na nossa equipa e no que cada um fez até aqui. O presente constrói-se com o que se trabalha. Se acreditarmos muito nisso, geralmente as coisas caem mais para o nosso lado. Com competência e organização, as coisas vão funcionar".

Jorge Braz, após Portugal eliminar a Sérvia nos oitavos de final, após prolongamento

"Estamos no topo da hierarquia mundial, mas jogo é jogo. Várias seleções cresceram imenso. A Sérvia é uma seleção de topo europeu, que já nos enganou outras vezes. Acho que estivemos, em largos momentos do jogo, por cima e demonstrámo-lo, mas o jogo é isto. Há momentos de instabilidade e erros que podem permitir que eles entrem no jogo, especialmente seleções com esta qualidade".

"A única coisa que eu quero é que consigamos acreditar no trabalho desenvolvido e chegar a estes momentos tendo enorme orgulho no que fazemos. Houve momentos em que deixámos uma ou outra coisa por fazer. Acho que a vitória é incontestável, não há dúvida de que fomos melhores e somos nós que merecemos estar nos quartos de final. Foi equilibrar as emoções e trazer toda a gente à razão novamente. No prolongamento, foi chamar novamente à emoção. Quando se está no limite para acabar, ou queremos ou não queremos, e a equipa quis muito. Todos acreditaram muito e todos foram para cima. A acreditar assim, venha quem vier, vai ter de levar connosco."

Jorge Braz, antes do jogo com a Sérvia

"Vai ser um jogo muito interessante, de certeza absoluta, mas estou extremamente confiante de que vamos fazer um bom jogo e saber ser Portugal, que é fundamental e a principal questão para passar esta fase e estar nos 'quartos', como queremos. Continuo a achar que pode haver aqui uma ou outra surpresa, mas nós queremos é olhar para o nosso percurso. Não queremos surpresas connosco. Sabemos muito bem qual é o objetivo e onde queremos chegar, para continuar o nosso percurso".

Jorge Braz, após o jogo com Marrocos (3-3), que encerrou a fase de grupos

"Sabíamos que era a seleção mais difícil, mas nós é que complicámos num ou noutro momento. Após sofrer um golo, reagir como reagimos, a qualidade que tivemos a seguir, quer a pressionar, quer a jogar, quer a construir, fizemos o 2-1 e podíamos ter feito o terceiro ou o quarto. Acho que foi um período muito bom no jogo. Na segunda parte, entrámos bem, sofremos o empate num livre esquisito, mas, mesmo assim, reagimos e permitimos o empate no fim.

"Acabámos em primeiro, que era o que eu queria. Agora, venha quem vier, vai ter de levar connosco. Nós, agora, é para passar os ‘oitavos’ e ir para os quartos de final.

Jorge Braz, antes do jogo com Marrocos

"Disse, antes de vir, que Marrocos poderia ser uma surpresa no Mundial. Estamos atentos e sabemos o que temos de fazer. Connosco é que nem pensar, mas que é uma seleção que pode fazer surpresas, claramente, pela qualidade individual, ambição que tem e pelos jogadores, muitos deles habituados a jogar em ligas competitivas […].  Foi um jogo típico de Marrocos, extremamente atrevidos e com transições de enorme qualidade, e um jogo típico da Tailândia, altamente organizada e a saber o que tem de fazer. O equilíbrio nestes jogos do Mundial vai ser cada vez maior e vamos ter um jogo competitivo e equilibrado".

Jorge Braz, após vitória frente as Ilhas Salomão

"Foi um jogo diferente, uma oposição diferente e um confronto mais irrealista, com toda esta exuberância e atrevimento das Ilhas Salomão muito interessante e que ainda criaram problemas na primeira parte. Estivemos mais confiantes e mais seguros do que temos de fazer. É normal e o próximo jogo ainda será melhor, mas mais difícil. Com duas vitórias, queremos a terceira".

"É sempre importante sermos melhores que os outros. Chegámos aos 7-0 com alguma naturalidade, mas nunca pode ser o objetivo primário. O objetivo é vencer, consolidarmos a equipa e usarmos a nossa forma de ser e de estar. Surgiu o sexto golo, o sétimo e parece-me que podiam ter surgido muitos mais. É uma vantagem, mas o terceiro jogo, fosse o que fosse, é para vencer igual."

Jorge Braz, após Portugal vencer a Tailândia no primeiro jogo do Mundial

"Os tailandeses alteraram algumas coisas e criaram-nos dificuldades no início do jogo. Alteraram um bocadinho o que vinha a ser a lógica deles. A Tailândia criou-nos, e bem, dificuldades. Sofremos um golo em que sabíamos que podiam ter aquele tipo de movimento, estávamos identificados para isso."

"Posteriormente, percebemos que tínhamos de acalmar e organizar, ser um bocadinho mais objetivos e adaptar-nos ao jogo. Chegámos ao empate e terminámos a primeira parte já bem melhor, a querer alterar. Depois, a segunda parte foi a continuação da lógica e da ambição de perceber que estamos aqui para ganhar os jogos todos. Foi essa resposta fantástica que a equipa deu. Ao intervalo Ajustámos uma ou outra questão a defender alguns esquemas, tentámos ser mais claros e objetivos no processo ofensivo, com mais alguma profundidade, e orientar as nossas ações de acordo com a nossa ambição para virar o jogo. Queremos que seja um caminho longo e o primeiro jogo caracterizou o que é iniciar uma competição destas. Agora, é crescer e melhorar ainda mais já para o segundo jogo."

Jorge Braz, antes do início do Mundial

"Sabemos que é muito difícil, mas é algo que ambicionamos muito. Acho que é um objetivo realista, extremamente ambicioso, mas extremamente difícil. Gostamos de coisas difíceis e de nos superarmos. Temos de superar o resultado do último Mundial. É em busca disso que vamos. [...] O passado não nos desvia do que temos de fazer atualmente. As outras seleções estão muito mais atentas a Portugal e vão estar com mais um ‘upgrade’ de concentração, agressividade e vão tentar vencer Portugal, que é campeão europeu. Só temos de estar preocupados connosco".

A final do Mundial de futsal, entre Portugal e Argentina, disputa-se no domingo, às 20h00 (18h00 em Lisboa), na Zalgiris Arena, em Kaunas, na Lituânia, após Brasil e Cazaquistão decidirem o terceiro e o quarto lugar do torneio, com início às 18h00 (16h00 em Lisboa).

 

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