A Ice Arena, nas Penhas da Saúde, Covilhã, está a viver um ambiente fora do comum, com a organização do I Torneio Internacional de hóquei no gelo em Portugal, com seis equipas e jogadores de oito nacionalidades.
Além do barulho seco das pancadas no disco, dos tacos a tocarem-se, do som dos movimentos dos patins, dos encontrões contra as tabelas, da música dos AC/DC que serve de banda sonora e do ruído das palmadas contra as laterais cada vez que se marca um golo, fora do rinque falam-se várias línguas, enquanto algumas equipas tiram o volumoso e numeroso equipamento de proteção e outras se preparam para a partida seguinte.
Depois do I torneio nacional da modalidade, em fevereiro, esta é a segunda prova oficial organizada no país, na vertente ‘três para três’, numa pista com metade do tamanho olímpico.
Flávio Torres, de 37 anos, nasceu no Canadá, onde aprendeu a jogar, reside em Leiria e treina com os Vikings do Castelo, Sertã. Costumava praticar patins em linha, mas a possibilidade de competir no gelo “é nostálgico” e “mais emocionante”.
Ter em Portugal um torneio internacional é uma forma de “dar visibilidade” à modalidade, de a projetar também no estrangeiro e acredita que a prova disputada nas Penhas da Saúde “é um grande salto que se está a dar”.
O suíço Valentim, de 26 anos, está pela primeira vez em Portugal, com os Dahu, depois de ter visto numa rede social informação sobre a prova e destaca o “bom nível, para muitos jogadores que” não treinam habitualmente no gelo.
Patrick Bessa, nascido no país helvético há 28 anos, é o português da equipa, não habituada a jogar numa pista pequena e na vertente ‘três para três’, a que tiveram de se habituar na Serra da Estrela, mas competir no país de origem com os colegas suíços é algo que há algum tempo não imaginava.
“A nossa paixão na Suíça é jogar hóquei e, quando tivemos a oportunidade de vir a Portugal jogar, foi ótimo”, salienta, em declarações à agência Lusa.
Com o peitilho à mostra e a camisola dos Mad Cats ao lado, Killian Portales, de 31 anos, integra uma “equipa multicultural e mista”, que treina uma vez por semana numa pista em Madrid e se deslocou a Portugal para “acumular experiência e evoluir”, ainda que num recinto com um tamanho a que não estão habituados.
“Nós vamos onde podemos jogar hóquei no gelo”, referiu o espanhol. “Tem sido uma experiência diferente dos outros rinques que conhecemos”, acrescentou à Lusa Samanta Baragaño, de 28 anos e praticante há quatro.
Tiago, jogador da “primeira equipa oficial de hóquei no gelo em Portugal”, os Luso Linx, de Sintra, onde treinam em linha, estava habituado a ter de se deslocar ao estrangeiro para jogar, ou a aproveitar as pistas temporárias em épocas festivas.
“É muito especial, um orgulho enorme, receber em Portugal outros praticantes e esperamos por uma pista de dimensão normal no país. Nós somos tão fortes no hóquei em patins, porque é que não se pode apostar no hóquei no gelo”, questionou o jogador, de 28 anos.
Ivan Silva, guarda-redes da seleção nacional, também desespera por uma pista de gelo permanente, de tamanho olímpico, para que possam “treinar, competir a sério e representar Portugal”.
“Isto é o princípio de alguma coisa”, antecipou, sobre o torneio internacional, e manifestou-se satisfeito por, pela primeira vez, Portugal receber equipas estrangeiras, para os portugueses poderem “retribuir o carinho” com que são recebidos fora do país.
Residente na Suíça, Higino Ferreira, de 37 anos, sempre jogou hóquei no gelo e aproveitou uma deslocação com os irmãos ao Porto, alugou uma carrinha, dormiu na mala, viajou até Lisboa para participar num treino de observação da equipa nacional, que passou a integrar, e realçou esse “grande orgulho de vestir a camisola nacional”.
No torneio internacional em representação da formação World Team, Higino mostrou-se convicto de que “existe um movimento que já começou e se está a confirmar, falta uma verdadeira pista para se conseguir ir mais longe”.
João Miguel, de 17 anos, da Covilhã, aproveita os tempos livres para treinar na Ice Arena, aberta desde dezembro, e integra a equipa do Clube Nacional de Montanhismo, recentemente criada, com a consciência de que tem “muito a aprender com quem tem experiência”.
Ressalvando que “isso leva tempo”, aponta as aulas de formação da academia, onde vários jovens aprendem aos domingos a modalidade, para prever que vai ser possível no futuro ter mais equipas e jogadores, nomeadamente da sua região.
Para Jim Aldred, antigo jogador profissional, treinador, agora técnico nacional, também responsável por ensinar os mais novos e hoje vestido de árbitro, o torneio é “um acontecimento entusiasmante” e mais um passo “para o grande sonho” de desenvolver as modalidades de gelo em Portugal.
“Portugal precisa de uma arena maior. Esta pista é um bom começo. Podemos ensinar a muitos jovens os fundamentos do hóquei no gelo, mas, se queremos progredir, temos de ter um rinque maior”, preconizou o canadiano.
Segundo o presidente da Federação de Desportos de Inverno, Pedro Farromba, existe a vontade de ter um pavilhão na zona da Grande Lisboa e está-se “a caminhar de forma coesa e assertiva para que se concretize”, frisando que terá de ser “a curto prazo”, para que as modalidades no gelo evoluam.
As reações que tem tido à organização do I Torneio Internacional, vincou, “têm sido muito gratificantes” e espera que os ventos de dedicação que sopram na Serra da Estrela possam ser uma alavanca para levar o hóquei do gelo a outros patamares.
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