"Face a tudo o que atrás se afirmou, não se crê que as normas questionadas sejam passíveis de gerar uma invasão da esfera de competências do Ministério Público pela atuação dos serviços e órgãos de polícia integrados no PUC-CPI em termos tais que configurem uma violação da separação de poderes, ou uma afronta à sua autonomia, contrárias à Constituição da República Portuguesa", lê-se na fundamentação dos juízes do TC, no acórdão hoje publicado.
O TC considerou hoje constitucional o decreto sobre o Ponto Único de Contacto para Cooperação Policial Internacional, após o Presidente da República pedir a fiscalização preventiva do diploma.
O Presidente do TC, João Caupers, declarou na sede do TC, em Lisboa, que analisadas as duas normas em causa, o tribunal decidiu "não se pronunciar pela inconstitucionalidade".
No acórdão, os juízes conselheiros reconhecem que "nem todos os elementos do PUC-CPI são agentes da autoridade ou pertencem ao quadro dos órgãos de polícia criminal" e sublinham que os serviços de apoio do PUC-CPI "não têm poderes de direção das atividades ou ações de cooperação policial, limitando-se a assessorar no cumprimento da missão e objetivos estabelecidos para o PUC-CPI, e funcionam na dependência direta do coordenador-geral que, como se viu, é sempre um elemento do quadro de uma força policial".
"Na verdade, a integração na mesma entidade dos vários pontos de contacto acima elencados como unidades orgânicas do PUC-CPI não pretende representar uma alteração drástica do ponto de vista da repartição de competências entre órgãos de polícia e autoridades judiciárias (em particular, o Ministério Público), nem retirar aos órgãos de polícia criminal os poderes e competências que lhes são próprios", argumenta o TC.
No entender do tribunal, tal integração numa única entidade visa dar cumprimento a recomendações da União Europeia e "coordenar formas distintas -- e dispersas -- de cooperação internacional, conferindo-lhes maior eficácia e coerência, através da reunião de distintos pontos de contacto internacionais (...) num único centro operacional".
De acordo com o TC, a estrutura orgânica do PUC-CPI evidencia que mesmo com as alterações introduzidas pelo diploma do Governo, a cooperação internacional coordenada por este organismo "continua a ser estritamente policial", sendo realizada por autoridades policiais sob direção de um coordenador-geral que é quadro de um órgão de polícia.
"Pelas razões explanadas", o TC concluiu que "do ponto de vista orgânico, as alterações introduzidas pelas normas questionadas" pelo Presidente da República "não representam uma alteração significativa", pelo que "o princípio da divisão de poderes, nos termos do artigo 111.º da Constituição, não é, pois, posto em causa".
Quanto à questão de saber se deste diploma pode resulta "um aumento significativo do controlo direto da atuação das várias unidades orgânicas do PUC-CPI por parte do Governo, na medida em que ficam na dependência do SGSSI [Secretário-geral do Sistema de Segurança Interna]", o TC rejeita a possibilidade.
"Não se vê, porém, que assim seja, posto que, em qualquer dos casos, a atividade de tais serviços se organiza de forma hierárquica, estando na dependência última de um membro do Governo. É esta a situação que se verifica, hoje, em relação à Polícia Judiciária", lê-se no acórdão.
Para o TC, com este diploma "o quadro não se altera significativamente com a deslocação da Unidade Nacional Europol e do Gabinete Nacional Interpol para uma unidade orgânica do PUC-CPI", afirmando que não existe diferença entre a dependência do SGSSI em relação ao primeiro-ministro daquela que existe do diretor nacional da Polícia Judiciária em relação ao ministro da Justiça "no que respeita ao potencial de intrusão, condicionamento ou cerceamento das atividades da polícia, em particular no âmbito da investigação criminal".
"A solução de desenho institucional quanto às unidades orgânicas do PUC-CPI, designadamente a opção pela integração, nessa esfera, da Unidade Nacional Europol e do Gabinete Nacional Interpol, deve ser considerada uma opção legítima do legislador, dentro da considerável margem de conformação que a Constituição lhe confere neste tipo de matérias", concluiu o TC na fundamentação do acórdão.
O acórdão é acompanhado de duas declarações de voto, uma das quais, da juíza Maria Benedita Urbano, que votou favoravelmente a decisão, mas afirmou não acompanhar a fundamentação "na sua integralidade", e outra, do juiz António José da Ascensão Ramos, que teve um voto vencido parcialmente.
FC/IMA // JMR
Lusa/fim
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