Os incidentes de racismo no futebol português acontecem com menor frequência do que em países como a Itália ou Espanha, mas continua a existir negação sobre o fenómeno, disse hoje uma organização que combate a discriminação na modalidade.
“Há alguma negação e falta de honestidade. Os adeptos podem ser racistas e por vezes a perceção [do incidente] é mais lenta do que em outros países”, destacou o diretor executivo da organização não-governamental (ONG) Fare Network, Piara Powar, que agrupa organizações dedicadas à luta pela igualdade do desporto.
O responsável falava durante um ‘webinar’ organizado hoje pela Associação dos Jornalistas de Desporto (CNID) e que teve moderação do presidente do CNID, Manuel Queiroz.
Piara Powar sublinhou que Portugal não é como países como a Itália ou Espanha, onde o número de incidentes relacionados com racismo “parece ser superior”, face aos casos que são reportados à ONG.
Numa abordagem direta sobre o ‘caso Marega’, o responsável da Fare Network explicou, no entanto, que a sanção aplicada foi “muito baixa e desapontante”.
Os factos aconteceram em 16 de fevereiro, no Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães, em jogo entre o Vitória de Guimarães e o FC do Porto da I Liga de futebol, quando por volta do minuto 70, pouco depois de ter marcado um golo, Marega pediu para ser substituído e acabou mesmo por abandonar o relvado, agastado com cânticos de natureza racista que lhe estavam a ser dirigidos por adeptos do Vitória, com sons a imitar macacos.
“Por vezes, mesmo que a intenção não seja de desvalorizar o ocorrido, o órgão disciplinar, que é independente, vê evidências que considera insignificantes. Isto significa que pode não estar treinado para lidar com o assunto e é ainda questionado se devia ter uma pessoa de uma minoria ou raça negra no órgão para poder falar por experiência própria”, salientou Piara Powar.
“Em Portugal a sociedade é avançada e não tem tantos incidentes como Espanha ou Itália, mas falham por vezes em lidar [com o incidente] de uma forma decisiva. Este caso permite todos crescerem e aprenderem para o futuro”, acrescentou.
Sobre o recente caso no encontro da Liga dos Campeões de futebol entre o Paris Saint-Germain e o Basaksehir, em 07 de dezembro, que foi interrompido por alegado insulto racista do quarto árbitro a um elemento da equipa técnica turca, Piara Powar realçou que a palavra utilizada pelo árbitro para identificar o treinador foi considerada racista.
“O Governo da Roménia [país do árbitro envolvido] tem uma instituição dedicada contra a discriminação e considerou a palavra utilizada como racista”, lembrou.
Piara Powar referiu ainda que o árbitro podia ter utilizado outro tipo de palavras para se dirigir a uma pessoa de raça negra, como apontando o lugar em que estava no banco de suplentes ou o seu cargo.
A atitude de jogadores ou elementos de equipas que se sentem alvo de racismo e que abandonam o terreno de jogo demonstram ainda “o poder” que têm na atualidade.
“Muitos jogadores estão a perceber a mensagem de que não têm de suportar insultos, sejam vindos das bancadas ou de árbitros”, vincou.
O responsável da Fare Network, sediada em Londres, explicou que a ONG se dedica a lidar com o racismo e outras formas de discriminação, como a homofobia ou o sexismo dentro dos estádios, contando atualmente com sistema de observação onde é feita a análise de risco de cada jogo internacional, de clubes e seleções, onde são observados ao vivo jogos classificados como de alto risco e em caso de discriminação é enviado um relatório para os órgãos responsáveis.
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