Aurélio Afonso, indicado pelo Ministério Público (MP) para testemunhar no processo com 16 arguidos, disse que foi "prejudicado no ano anterior", mas que acabou por subir no seguinte ao segundo escalão nacional.

"Não sei quem foi prejudicado, eu fui beneficiado", disse, convicto, na inquirição do procurador do MP, revelando surpresa com a promoção, quando, frisou, teve um jogo que não lhe correu "razoavelmente bem" e teve "uma nota baixa".

"Em 140 árbitros da terceira categoria, apenas 10 subiam. Nenhum árbitro subiria com um relatório em que teve uma nota baixa. Eu fui o 10.º a subir, quando tinha tirado ilações de que não conseguia subir por causa desse jogo", disse Aurélio Afonso.

O árbitro, confrontado pela Polícia Judiciária (PJ) com duas transcrições de escutas telefónicas, confirmou em tribunal que num dos telefonemas soube que ia ser promovido por Nemésio de Castro, presidente do Conselho de Arbitragem (CA) da Associação de Futebol de Lisboa nos finais da temporada de 2002/03.

Referiu ainda que no outro telefonema entre Pinto de Sousa, presidente do CA da Federação Portuguesa de Futebol de 1983 a 1989 e de 1998 a 2004, e António Azevedo Duarte, membro do órgão na altura dos factos, ficou expresso que "um ou dois árbitros de Lisboa iam subir e havia um segundo quase a subir".

Afirmando desconhecer os factores de correcção das avaliações dos árbitros, Aurélio Afonso notou que sabia que "eram pedidos aos observadores que dessem boas ou más notas aos árbitros", mas que não fazia "ideia de que havia mexidas nas classificações".

Na audiência da parte da tarde - Gilberto Madaíl foi um dos inquiridos na da manhã - foram ouvidas mais testemunhas, entre as quais Isabel Damasceno, que, no final da temporada de 2002/03, presidia à Câmara Municipal de Leiria e que admitiu conhecer Pinto de Sousa.

Questionada sobre uma conversa telefónica com Pinto de Sousa, Isabel Damasceno confirmou ao colectivo de juízes o telefonema e esclareceu que apenas pretendeu realizar "um testemunho de carácter" do árbitro Carlos Amado.

"Conheço Carlos Amado, não como árbitro, mas como colaborador da Portugal Telecom. Ele pediu-me que telefonasse a Pinto de Sousa, porque Amado estava num concurso de árbitros. Não sabia, em concreto, as funções de Pinto de Sousa nem Carlos Amado me disse. Apenas fiz uma recomendação e Pinto de Sousa disse-me que iria ver o que podia fazer", explicou.

Isabel Damasceno referiu que não sabia "de todo de classificações de árbitros" e que desconhece o que aconteceu a Carlos Amado, notando que não mais teve contacto telefónico com Pinto de Sousa, um dos 16 arguidos neste processo indiciados da prática de crime de falsificação de documentos para a promoção e despromoção de categoria de árbitros.

Os advogados de três arguidos requereram a 3 de Fevereiro a anulação das escutas telefónicas utilizadas no processo, mas o colectivo de juízes, presidido por Clarisse Gonçalves, aguarda a certidão do processo de Gondomar do Apito Dourado para indeferir ou deferir as diligências.

Pretendem os advogados de Pinto de Sousa, de António Henriques, membro do CA nas épocas de 2002/03 e 2003/04, e do árbitro Manuel Cunha que sejam alterados os crimes de falsificação de documentos para abuso de poder, logo as escutas não se aplicariam neste julgamento, que prossegue na próxima quarta-feira.