![Reportagem: Dragão ferve entre expectativa e incerteza antes da receção à Roma](/assets/img/blank.png)
Não são tempos fáceis que se vivem para os lados do Dragão. No percurso sinuoso com demasiadas pedras pelo caminho, o FC Porto continua a palmilhar espaços e direções na busca de encontrar o equilíbrio e a glória de outrora.
Hoje a artéria das Antas ferve de expectativa e nervosismo. A poucas horas do apito inicial para o duelo entre FC Porto e Roma, a contar para a primeira mão do playoff de acesso aos oitavos de final da Liga Europa, os arredores do Estádio do Dragão são um misto de ansiedade e incerteza.
Os cânticos das claques ecoam, cachecóis são erguidos ao vento, e o sentimento geral entre os adeptos é claro: a paixão continua inabalável, mas a paciência começa a a ceder. Com a época a avançar e os resultados positivos a tardar, a contestação tem feito parte da realidade do clube.
Após a mudança profunda, que tirou do ‘trono’ Jorge Nuno Pinto da Costa, ao final de 42 anos na liderança, o caminho da reestrutura está a revelar-se muito complicado. André Villas-Boas, que assumiu a presidência do clube há quase um ano, sente já, de muito perto (e com alguma intensidade) o peso da exigência portista. Entre elogios às mudanças estruturais e críticas à falta de vitórias, os adeptos dividem-se.
Num café perto do estádio, ponto de encontro de muitos adeptos que vão assistir à partida, encontrámos Tiago Silva, de 32 anos. Sócio desde a infância e presença assídua no Dragão, destacou o impacto emocional que o novo dirigente causou ao assumir a presidência, ainda assim, frisou que os portistas não estão (nem têm que estar) habituados a não vencer. “O Villas-Boas é um de nós, sente o clube e quer fazer diferente. Mas isto é o FC Porto, e aqui não há paciência para períodos de transição longos. Precisamos de ganhar, ponto final”, disse entre um punhado de tremoços e um fino.
Na mesa ao lado, Ricardo Teixeira, 27 anos, abana a cabeça e acrescenta: “A aposta na formação é bonita, mas não chega. Precisamos de um plantel competitivo para ganhar agora, não daqui a três anos. Se queremos jogar com mecos, basta trazer os que usam no Olival para treinar”. Mas nem só de impacientes e descrentes vive a falange portista. Ao balcão, e a comer uma sopa que “aquece o estômago” para o frio que se faz sentir no Porto, Miguel Soares, 45 anos, vê nas mudanças algo bom e necessário. “Acabou o marasmo. Ele está a tentar reorganizar o clube, equilibrar as contas, modernizar a SAD. A nível financeiro já se vê a luz ao fundo do túnel e acredito que quando isso estabilizar vamos conseguir construir uma equipa estrondosa”, salientou a sorrir com essa perspetiva futura.
O enigma Martín Anselmi
Se Villas-Boas ainda tem o benefício da dúvida para alguns, o novo treinador, Martín Anselmi, a viver na sombra das memórias de Sérgio Conceição, está longe de conquistar consenso. Escolhido recentemente para comandar a equipa, o técnico argentino gera curiosidade, mas também muita desconfiança. “É um tiro no escuro. Pode ser um novo Abel Ferreira ou pode ser um novo Ruben Amorim, nunca se sabe… Mas para já, o futebol que jogamos não me convence. Nem percebo nada do que ele faz com a equipa… aquela forma de jogar… nunca vi”, desabafou José Ferreira, 63 anos, sócio há mais de quatro décadas.
Já André Neves, 22 anos, é mais paciente. “Gosto de treinadores modernos e ofensivos. Acho que temos de dar tempo, mas sei que isto no Porto não funciona assim. Mas temos que acreditar que isto é uma pequena fase”, disse enquanto caminhava em passo apressado para dentro do estádio.
Autocarros chegam e a multidão explode
Enquanto as discussões continuam, o frenesim atinge outro nível. Os autocarros do FC Porto e da Roma acabaram de chegar ao estádio. Dezenas de adeptos reúnem-se para receber os jogadores portistas entre aplausos, cânticos e alguns petardos. Depois do empate caseiro com o líder Sporting, num jogo em que, principalmente na segunda parte, foi possível vislumbrar um pouco da garra do Dragão, os sócios fizeram (sabe-se lá até quando) as pazes com a equipa. Os gritos são de incentivo para repetir a exibição.
O Dragão é impaciente, exigente, implacável. Mas acima de tudo, é leal. Entre reticências sobre o arranque de Villas-Boas, incerteza sobre Anselmi e frustração com os resultados, há algo que nunca muda: a união dos adeptos em torno do clube. Hoje, quando os jogadores entrarem em campo, sentirão o peso da história, mas também a força inabalável de um estádio inteiro que empurra a equipa. Porque pode faltar paciência, mas nunca paixão. E enquanto houver essa chama, tudo ainda é possível.
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