O Campeonato do Mundo Feminino da FIFA de 2023 arranca esta quinta-feira na Austrália e Nova Zelândia. Será a edição do evento e espera-se um evento que venha confirmar o crescimento da variante feminina do desporto rei que se tem verificado ao longo dos últimos anos, com recordes de assistência a serem batidos um pouco por todo o lado.

Contudo, nem tudo são rosas no mundo do futebol feminino e na organização deste Mundial, apesar do seu inequívoco desenvolvimento.

O valor dos direitos de transmissão

Entre os vários dramas a envolver a competição, o presidente da FIFA, Gianni Infantino, chegou a ameaçar um boicote às transmissões televisivas dos jogos em grande parte da Europa face a uma crescente batalha sobre o valor dos direitos de transmissão.

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Há cerca de um ano, Infantino afirmou que as ofertas iniciais eram demasiado baixas e deixou uma espécie de ultimato, garantindo que a FIFA não permitiria que os jogos fossem exibidos na Europa se as cadeias emissoras não subissem a parada. "Não é correto subvalorizar o Campeonato do Mundo Feminino, porque se trata de uma competição de topo, com muito valor", sublinhou então o líder máximo do organismo responsável que futebol mundial. "Quem quiser adquirir os direitos de transmissão da prova, com base no número de espectadores que esta alcança, terá de pagar o valor que ela vale".

Apenas em junho surgiram as boas notícias, com a FIFA e a União Europeia de Radiodifusão a chegarem, enfim a um acordo que garante que os jogos serão transmitidos num total de 34 países europeus.

Conflitos com jogadoras levam à troca de selecionador na França

A França despediu a selecionadora Corinne Diacre na tentativa de travar uma revolta crescente entre as jogadoras, com algumas das mais importantes futebolistas a dizerem que abandonariam a seleção se Diacre continuasse no cargo.

A primeira foi a capitã, uma das jogadoras mais tituladas de sempre, Wendie Renard, que se queixou do "sistema longe do requerido ao mais alto nível". Juntaram-se à central do Lyon a defesa Perle Morroni, da mesma equipa, e as avançadas Marie-Antoinette e Kadidiatou Diani, do PSG. Diacre também tinha desentendimentos com Amandine Henry. Numa ocasião, a selecionadora deixou-a de fora de uma convocatória com a justificação de que estava de forma. A médio respondeu-lhe com um golo, no jogo seguinte do Lyon, e uma celebração a tapar os ouvidos.

Em comunicado, a Federação Francesa de Futebol (FFF) acabou por anunciar o despedimento, explicando que a decisão foi tomada após investigação de uma comissão e justificando-a com o conflito público entre Corinne Diacre e várias jogadoras. "A fratura atingiu um ponto de não-retorno que prejudica os interesses da seleção", explicou a FFF, que reconheceu, ainda, que "as disfunções observadas pareciam ser irreversíveis".

O conflito entre Corinne Diacre e o plantel era antigo. Certa vez, a selecionadora chegou a afirmar, com ironia, que as jogadoras eram "muito infelizes" na seleção e o copo acabou por transbordar em fevereiro.

Escolhido para suceder a Corinne Diacre foi Hervé Renard, treinador francês, conhecido como 'o mago branco', com um vasto currículo em seleções: Arábia Saudita, Marrocos, Costa do Marfim, Zâmbia. Esta será, contudo, a sua estreia no futebol feminino.

Canadianas em conflito com a Federação

O Canadá chega a este Mundial com as suas jogadoras ainda em conflito aberto com a sua federação. Um conflito que levou mesmo, recentemente, a que o anterior presidente da Federação Canadiana de Futebol resignasse ao cargo.

Em causa está o apoio que as jogadoras dizem não receber e o valor dos prémios que exigem receber. Um problema que não mostra sinais de ficar resolvido.

Christine Sinclair, capitã da seleção feminina do Canadá, chegou mesmo a anunciar que a equipa iria fazer greve, em protesto contra a Federação devido a cortes de financiamento, falta de transparência e falta de igualdade de pagamento. A decisão foi apoiada pela equipa masculina mas, pouco depois, as campeãs olímpicas em título desmarcaram a greve, perante uma ameaça, feita pela Federação, de ir para os tribunais, com Sinclair a dizer que as jogadoras "não poderiam tomar os riscos" associados à greve.

Durante a SheBelieves Cup, competição nos EUA envolvendo os dois países da América do Norte, as jogadoras do Canadá vestiram camisolas com a frase 'enough is enough' ("já chega"), num gesto de revolta contra a Federação. Uma iniciativa que contou com o apoio das compatriotas dos EUA, que se juntaram suas adversárias num abraço no campo antes do jogo.

As futebolistas canadianas apontam a uma "má gestão financeira", "falta de transparência" e "desigualdade de género", sublinando que nos últimos dois anos "houve discrepâncias significativas no financiamento das seleções feminina e masculina". Exigem padrões e práticas que assegurem igualdade de tratamentos e oportunidades.

Um suposto patrocínio...pouco desejado

Polémica foi também a notícia de que a FIFA teria fechado um acordo - que acabou por nunca ser oficialmente anunciado - que faria da Entidade para o Turismo da Arábia Saudita (Visit Saudi) um dos principais patrocinadores deste Mundial Feminino. Algo que, face às limitações aos direitos das mulheres naquele país do Médio Oriente, não caiu bem em muitos quadrantes.

Austrália e a Nova Zelândia, países organizadores, deram conta do seu desconforto. "Esta parceria não se enquadra na nossa visão coletiva para o torneio e não corresponde às nossas expectativas", disse na altura James Johnson, presidente da federação da Austrália. "Embora a parceria não tenha sido confirmada pela FIFA, com base nas nossas consultas, os principais interessados e a nossa própria posição, não nos sentiríamos confortáveis com esta parceria. Esperamos mais clareza e informação da FIFA", acrescentou, exigindo então explicações à FIFA.

Alguns dias depois, a FIFA veio a público afirmar que o Campeonato Mundial de Futebol Feminino 2023 na Austrália e Nova Zelândia não seria afinal patrocinado pelo turismo da Arábia Saudita, ainda que admitindo que chegaram a existir negociações.

"Houve conversações com a Visit Saudi, mas no final não se firmou um contrato", disse Gianni Infantino. "Foi uma tempestade num copo de água", acrescentou.