Os antigos dirigentes do Benfica António Sala e José Capristano desconheciam os movimentos financeiros do clube por confiarem em João Vale e Azevedo, acusado de alegada apropriação de quatro milhões de euros resultante de transferências de futebolistas.
Vale e Azevedo, detido desde segunda-feira no Estabelecimento Prisional de Lisboa, esteve ausente da terceira sessão, em que o antigo presidente do Benfica (1997 a 2000) é acusado também de branqueamento de capitais e falsificação de documento.
Na inquirição de hoje na 4.ª Vara Criminal de Lisboa, António Sala sublinhou que «a questão financeira» era uma «área muito secreta» da responsabilidade do presidente Vale e Azevedo, em que o então vice-presidente depositava «uma grande confiança», também pelo facto da «existência de um conselho fiscal».
Sala, que disse antes de entrar no tribunal que «quem tem problemas com a Justiça deve pagar», em alusão à extradição de Vale e Azevedo, referiu que o então presidente movimentava verbas do Benfica, mas disse que desconhecia na altura os montantes.
O antigo dirigente do Benfica lembrou que, de abril e junho de 1998, as contas do Benfica foram penhoradas, pelo que foi encontrada a solução de «algumas verbas serem pagas em contas pessoais dele e outras pagas em contas das empresas dele».
Afirmou desconhecer os negócios relacionados com venda e aquisição de jogadores, observou que, quando começou «a desconfiar», havia «uma confusão de contas».
«Mas a situação era apaziguada com relatórios e nas assembleias gerais as contas passavam», disse António Sala, que chegou a admitir a demissão (a direção ficaria sem quórum), mas que foi alvo de «chantagem emocional de Vale e Azevedo» para continuar.
Referindo que «a sustentabilidade do Benfica era criada pela conta ou conta de Vale e Azevedo», o antigo profissional da rádio referiu que, «no último ano, o presidente confirmava a existência de uma conta-corrente e continuava a dizer que as contas do Benfica com ele não estavam certas e que ele era credor».
Sala confessou que a situação era-lhe «desconfortável» e admitiu hoje ter ficado «chocado» por «embarcar naquilo».
Também José Capristano, vice-presidente da direção de Vale e Azevedo responsável pelo departamento de futebol do Benfica, disse que tinha uma «confiança ilimitada» no advogado e que o sentia «como parte da família».
Capristano revelou que a área financeira era exclusiva de Vale e Azevedo e António Leitão (também testemunha neste processo, com audição prevista para janeiro) e garantiu que desconhecia «o trânsito do dinheiro» do Benfica, declarando que «a confiança» que tinha no presidente «era total e absoluta».
Confessando que Vale e Azevedo lhe provocou «um grande desgosto», Capristano referiu que «se tivesse denotado qualquer suspeita de desonestidade» demitia-se «ou denunciava».
A testemunha confirmou que lhe chegou a emprestar dinheiro (e que apenas recebeu parte) e, confrontado com os contratos de transferência dos futebolistas Scott Minto, Gary Charles, Amaral e Tahar El Khalej, afirmou que eram «nulos» por apenas terem a assinatura do presidente (no clube era obrigatório duas).
Afirmou também desconhecer o circuito do dinheiro e nunca soube «o valor por que foram vendidos».
A próxima audiência está marcada para o dia 20, com a audição dos antigos dirigentes do Benfica na direção de Vale e Azevedo: José Andrade e Sousa, José Antunes e Mendes Pinto.
A sessão deverá ter a presença de Vale e Azevedo, mas, como referiu a sua advogada, Luísa Cruz, o arguido «não deverá prestar declarações».