Habituais fãs de futebol ou não, dificilmente haverá portugueses que esqueçam o ano de 2016, o ano em que o "quase" ficou finalmente de lado e em que os "heróis do mar" foram-no por fim, conquistando o sonhado troféu internacional que tão bem fica na Cidade do Futebol.

Foi um ano de 17 entradas em campo da seleção de Fernando Santos, Cristiano Ronaldo e companhia. Nem todas elas foram vitoriosas, e o ano até começou com uma luz de alarme a acender no seio da seleção, mas entre trabalho e sofrimento tudo se encaminhou da melhor forma. De França veio o título europeu, conquistado em pleno Stade de France ante os anfitriões franceses numa partida digna de argumento de filme de grande orçamento.

Quanto ao caminho para o Mundial de 2018, entretanto iniciado, este contou já com um infeliz percalço frente à Suíça, mas a rota para a Rússia continua bem demarcada e o primeiro lugar não está de todo fora do alcance dos lusos, que venceram os restantes encontros disputados até agora e têm a Suíça a três pontos.

Altos e baixos na preparação para França

Ao longo dos meses que antecederam a participação no Campeonato da Europa, o sétimo da sua história, Portugal disputou cinco partidas frente a adversários de níveis distintos. A preparação começou no final de março, em Leiria, com dois jogos disputados no Estádio Municipal Dr. Magalhães Pessoa, e o desfecho foi misto.

A abrir a preparação, um encontro com uma Bulgária que surgia como um bom teste, mas frente à qual se esperava um triunfo. Aconteceu o oposto. Um golo de Marcelinho derrubou a equipa de Fernando Santos, à qual se pedia muito mais. Mas calma, a preparação estava a começar, e (muito) melhores dias viriam. Ainda em Leiria, a equipa das ‘quinas’ defrontou uma Bélgica desfalcada de várias estrelas e levou a melhor com uma vitória por 2-1, com golos de Nani e Cristiano Ronaldo.

Dois meses depois, a partir do fim de maio, arrancou a fase decisiva da preparação para França, com três jogos que terminaram com saldo positivo, mas não concludente. No Estádio do Dragão, Portugal começou por receber a Noruega e venceu sem problemas de maior, por 3-0, numa noite em que Quaresma, Raphael Guerreiro e até Eder (por esta altura ainda com o estatuto de ‘patinho feio’ na seleção) brilharam e encaminharam Portugal para a vitória.

Seguiu-se um voo para Londres, onde o nível de exigência aumentou. Frente à Inglaterra no mítico estádio de Wembley, Portugal manteve a tradição: voltou a não vencer a equipa dos ‘três leões’, perdendo por 1-0. Já perto do fim, Smalling cabeceou para o único golo do jogo, num encontro marcado pela entrada muito dura de Bruno Alves sobre Harry Kane, deixando a seleção a jogar com dez desde os 35 minutos.

Antes do arranque da aventura francesa, porém, haveria oportunidade para conquistar um resultado volumoso para reforçar as esperanças numa boa campanha, embora esse triunfo tenha sido conseguido frente à modesta Estónia. Uma goleada das antigas, por 7-0, no Estádio da Luz, a poucos dias do arranque da participação no Europeu.

De Saint-Étienne ao Stade de France, dos solavancos à glória

Colocado num grupo teoricamente acessível - se bem que em provas destas raramente o são na verdade - Portugal entrava no Europeu de França com obrigação de chegar à fase a eliminar. O objetivo “realista”, tendo em conta o que era habitual numa participação da seleção nos grandes torneios, era esse. Chegar com tranquilidade aos ‘oitavos’ e, com esforço, talvez passar mais uma ou duas etapas. Mas a estadia de Portugal em França acabaria por ser - felizmente - bem diferente do esperado pela maior parte dos adeptos.

Desde logo, a participação nessa tal fase de grupos foi…peculiar. Com três empates em três jogos, Portugal pôde agradecer às novas regras da FIFA que lhe permitiriam seguir em frente como um dos melhores três classificados. O primeiro jogo tinha um adversário vindo da fria Islândia, que gelou Portugal em Saint-Étienne com um empate a uma bola. Nani marcou primeiro mas Bjarnason acabou por impôr um surpreendente empate na jornada inaugural.

E assim de rompante, o entusiasmo dos adeptos esmorecia. O segundo encontro, um empate a zero frente à Áustria no Parque dos Príncipes, bem perto do quartel-general criado em Marcoussis, baixou ainda mais a moral, mas Fernando Santos, como bom comandante, reuniu as tropas e passou uma mensagem ambiciosa para o exterior: “Só volto no dia 11 para Portugal”, disse então o selecionador, perante uma incredulidade quase geral.

A verdade é que, passo a passo, Portugal ia de facto adiando o regresso a casa. O emocionante empate a três bolas diante da Hungria - com “aquele” calcanhar de Ronaldo - permitiu à equipa lusa esgueirar-se para os oitavos-de-final, ficando do lado mais acessível do quadro de jogos, permitindo evitar os grandes tubarões até à reta final do torneio. A Croácia foi o primeiro adversário na fase do “mata-mata”, citando Scolari, e caiu em Lens perante o golo de Ricardo Quaresma a fechar o prolongamento.

Ficavam a faltar apenas dois passos para a final sonhada do Stade de France. Uma viagem até Marselha, com a Polónia como adversário, terminou com um triunfo nas grandes penalidades, num jogo em que Renato Sanches conquistou em definitivo o estatuto de nova estrela da equipa lusa. “De empate em empate”, dizia-se, Portugal sobrevivia, mas as meias-finais trouxeram uma bem mais conclusiva vitória por 2-0 diante do País de Gales, selando em Lyon a presença no jogo decisivo.

E quanto a esse jogo decisivo…não haverá por aí um português que não o recorde como se tivesse sido ontem, mas nunca será demais lembrar. O adversário? Quis o destino, ou o acaso, que fosse a anfitriã França, para deleite dos emigrantes portugueses que apoiavam a seleção lusa em Marcoussis desde o dia 1. O jogo das nossas vidas aconteceu no Stade de France, teve Cristiano Ronaldo a lesionar-se no arranque - quem esquece as lágrimas do capitão? - e a regressar para comandar as tropas desde o banco de suplentes. Teve Eder a assumir o papel de herói improvável e a marcar o golo mais marcante de sempre da seleção lusa. E teve o erguer da Taça por Cristiano Ronaldo, que há doze anos chorara a derrota frente à Grécia em Lisboa. Desta vez, um triunfo catártico e inesquecível.


O início da caminhada rumo à Rússia

Depois de um mês tão brilhante por terras gaulesas, Portugal regressava em setembro à realidade das qualificações, agora tendo em vista a participação no Mundial2018. Todos queremos lá estar e exibir com orgulho o título de campeões europeus, mas pelo que já foi possível ver, o caminho não será linear, em grande parte pelo tropeção inicial.

Depois de uma simples vitória por 5-0 frente a Gibraltar em jogo de preparação, a equipa das ‘quinas’ foi à Suíça perder por 2-0, logo diante do principal adversário no grupo de qualificação. Embolo e Mehmedi sentenciaram um encontro que, no seu todo, foi uma desilusão e um duro confronto com a realidade: títulos à parte, Portugal tinha mesmo de voltar à estaca zero para assegurar a presença no Campeonato do Mundo.

E desde então houve mais três capítulos, felizmente vitoriosos na totalidade. Duas gordas goleadas pelo mesmo resultado (6-0) frente a Andorra e Ilhas Faroé antecederam o encontro deste último domingo com a Letónia, que terminou com uma vitória por 4-1 em que o resultado escondeu o nível de dificuldade da partida.

Com esse triunfo, a seleção disputou o seu último encontro no melhor ano da sua história. 2016, um ano que, venha o que vier daqui para a frente, estará sempre gravado na memória de todos.