A Federação Portuguesa de Basquetebol (FPB) anulou todas as competições em 29 de abril, devido à pandemia de covid-19, sem títulos atribuídos nem despromoções, mas Ovarense e Carnide, os dois últimos classificados da competição feminina optaram pela descida.

Em declarações à Lusa, as jogadoras de Ovar dizem que o clube desistiu do principal escalão para poupar 23 mil euros, desvalorizando uma formação que, segundo os vareiros, em 30 de abril, "fez história ao atingir a ‘final four’ da Taça de Portugal", para manter as mais dispendiosas formações A e B masculinas.

Das 15 jogadoras da equipa sénior feminina, 11 já confirmaram a sua saída do clube e, a avaliar pelas quatro basquetebolistas entrevistadas pela Lusa, isso deve-se, por um lado, à consciência de que "ficar na Ovarense era aguentar mais do mesmo, sem evolução na carreira", e, por outro, à despromoção "totalmente injusta e desmotivante".

As gémeas Gabriela Raimundo e Ana Raimundo, ambas bases e duas das melhores jogadoras portuguesas da Liga, estão de saída do clube, tal como Sofia Pinheiro, que atribui a decisão sobretudo à necessidade de apostar na sua vida profissional como psicóloga.

Indecisa está a também base Bárbara Calvinho, admitindo que, "com toda a gente a sair", não se vê "a ficar numa equipa só com juniores" enquanto a masculina continua a fazer sucessivas contratações de norte-americanos.

As quatro jogadoras reconheceram que a decisão "até se compreende", tendo em vista a sustentabilidade de um clube que a direção diz em "muito débeis condições financeiras", mas confirmam o sentimento de que foram "desvalorizadas enquanto atletas e pessoas", ao longo dos anos.

"Para começar, nem nos deram oportunidade de arranjar pelos nossos meios os 31.000 euros que custava ficarmos na Liga. Podíamos ter feito um ‘crowdfunding', por exemplo, e se calhar até arranjávamos mais do que isso, para ajudar o clube nas contas gerais", afirmou Gabriela Raimundo, a jogadora portuguesa mais valiosa (MVP) de 2018/19.

A irmã Ana, considerada pelo Eurobasket MVP nacional de 2019/20, admitiu que essa hipótese "não interessava".

De início, Sofia exclui "desigualdade de género a sério", mas, acabou por assumir as diferenças: "A única coisa em comum com a equipa masculina é o emblema do clube, porque verbas, logística, regalias, apoio, não havia nada disso para nós".

Apesar de estarem há sete épocas na Liga, a formação feminina só esta época teve um balneário próprio, mas nunca teve equipamentos de treino, nem apoio na sua lavagem ou acompanhamento médico.

"Um dia eu sofri uma entorse, estava numa maca à espera de ser vista pelo fisioterapeuta da equipa masculina e ele deixou-me à espera porque tinha que preparar fruta e bolachas para a equipa dele”, recordou Bárbara Calvinho, acrescentando que fisioterapeuta e preparador físico são alguns dos ‘luxos’ das equipas masculinas.

As jogadoras também se sentiam prejudicadas nos horários para a utilização do pavilhão.

"No fundo, houve uma série de coisas que nós fomos deixando andar e não devíamos", reconheceu Ana Raimundo, antes de a irmã lhe completar o raciocínio: "Aproveitaram-se da nossa bondade e ingenuidade, do nosso gosto pelo clube".

As atletas admitiram que o que se passa na Ovarense "é reflexo da cultura nacional", mas esperavam valores mais altos no desporto.

"Em vez de nos dispensarem, deviam é apontar-nos como exemplo de luta e resiliência", lamentaram.