No sábado, Espanha vai parar para assistir ao 'El clásico'. Neste choque cultural, regional, político, duas ideias de jogo vão estar frente a frente, num embate sem favoritos e que gera tanta paixão e rivalidade.

O embate já não conta com Ronaldo e Messi, e foi quando coincidiram os dois 'extraterrestes' que a rivalidade atingiu índices de paixão e rivalidade estratosféricos.

De ídolo a homem mais odiado de Barcelona

A rivalidade também se fez de polémica, e no entender dos blaugrana de algumas traições. Luís Figo, um dos melhores jogadores portugueses de todos os tempos, é talvez o símbolo maior das diferenças que dividem as duas regiões, no sentido mais polémico. Era um menino pródigo em Barcelona, antes de trocar os blaugrana em 2000. O que é certo é que foi no emblema madrileno onde somou as maiores conquistas tanto a nível individual como coletivo, com destaque para as conquistas da Liga dos Campeões e Bola de Ouro. A mudança gerou sentimentos controversos, sobretudo dos que o amavam, e que o viam agora como traidor. No regresso a Barcelona foi recebido com hostilidade, e foi apelidado de 'pesetero'. Afirmou-se nos merengues, formando a equipa dos galácticos, onde criou também o seu legado no emblema madrileno.

O artigo do jornalista Evandro Delgado recorda alguns dos momentos mais tensos dessa rivalidade. Pode ler aqui um excerto, ou clique no link para ler a reportagem na íntegra.

"São poucos os jogadores que tenham trocado diretamente o Real Madrid pelo Barcelona ou vice-versa. E quando aconteceu, acabou sempre em tumulto. Primeiro foi Alfredo Di Stéfano', 'roubado' pelo Real Madrid ao Barcelona com ajuda do Governo de Franco. Anos mais tarde, chegaria a traição de um português: Figo era ídolo em Camp Nou mas decidiu que era hora de mudar de ares, em 2000. Ia provocando uma guerra. Mas Figo sabia ao que ia: "Para o público será um belo espetáculo. Quem vai sofrer sou eu, porque é como estar na pele de um assassino", disse, antes do encontro da 6.ª jornada da Liga espanhola, entre 'blancos' e 'culés'.

21 de outubro de 2000. Nesse dia, jogou-se 'El Clásico' mais ruidoso da história do Barcelona vs Real Madrid. Foi o primeiro de Luís Figo pelo Real Madrid em Campo Nou. Um jogo tenso, disputado num ambiente de quase guerra. O Camp Nou estava cheio, quase 98 mil, todos a assobiar Luís Figo. O ruído era tanto que os jogadores tinham dificuldades em ouvir o apito do árbitro Alfonso Pérez Burrull. Nas bancadas havia cartazes com frases de ódios, queimavam-se camisolas de Figo. Assobios, insultos, gritos de 'Pesetero'. Um inferno.

No relvado voaram telemóveis, garrafas de whisky, pilhas, e até a cabeça de um leitão assado, em direção a Figo. O português passou a ser o marcador dos cantos do Real Madrid e sempre que se aproximava da bandeirola, era um pesadelo. Michel Salgado tinha desistido dessa tarefa.

"No mundo inteiro, nunca um desportista teve um ambiente como aquele, com tanta gente contra. Mas, ao mesmo tempo, sentia-me confortável com a pressão porque me mantinha desperto e concentrado. O pior foi o resultado, porque perdemos", disse o luso, ao site espanhol 'Grada 360'.

Quem vai sofrer sou eu, porque é como estar na pele de um assassino
O ambiente também afetou muito os jogadores do Real Madrid, que nunca tinham passado por algo semelhante. Luis Enrique e o português Simão Sabrosa fizeram os golos culés, mas foi Real Madrid a sagrar-se campeão no final do campeonato.

O ambiente tenso também se vivia nas ruas de Barcelona. Foi reforçado o dispositivo de segurança em torno do Real Madrid, algo nunca antes visto. Quando o autocarro dos merengues chegou ao estádio, foram atiradas pedras que partiram alguns vidros do mesmo. O jogadores refugiaram-se no corredor do autocarro, antes de entrar no estádio.

A história da traição de Figo começou num desentendimento com o presidente do Barcelona na altura, Joan Gaspart. O Real Madrid estava em eleições e o candidato Florentino Pérez tinha prometido contratar o craque principal do Barcelona. Se não conseguisse, pagaria a quota a todos os sócios do Real Madrid. José Veiga, empresário do jogador na altura, reuniu-se com Florentino Pérez e ficou acordado os trâmites da transferência, com o Real Madrid a bater a cláusula de rescisão do português, transformando-o no jogador mais caro de sempre. Nunca alguém tinha pago 60 milhões de euros por um jogador. O Barcelona nada podia fazer.

A saída de fico apanhou todos de surpresa na Catalunha. O português era uma referência no balneário, um dos melhores, se não, o melhor jogador do plantel e tinha acabado de se mudar para o arquirrival Real Madrid. Quando começaram os rumores da possível transferência (Figo queria um novo contrato que valorizasse a sua influência em campo, Gaspart, o presidente, não era da mesma opinião), ninguém no clube catalão acreditou que fosse possível. Abelardo, amigo de Figo, disse ter falado com o português durante o Euro2020 e este lhe tinha dito que não deixaria o Barcelona.

Mas deixou. E a Catalunha nunca o perdoou."

Nenhuma mudança foi tão polémica como a de Luís Figo, no entanto, houve outros craques que representaram os dois maiores clubes da La Liga.

Javier Saviola

'El Conejo', avançado argentino que também somou uma passagem pelo Benfica, assinou inicialmente pelo Barça em 2001, onde se manteve até 2007. Acabou por atuar uma temporada no Mónaco e outra no Sevilha, antes de se mudar para Madrid em 2007/08, mas sem grande sucesso.

Samuel Eto´o

Não alcançou o sucesso no Real Madrid, acabando por ser cedido ao Maiorca. Foi contratado pelo Barcelona, clube onde se manteve até 2009, e onde viveu os melhores momentos da carreira.

Ronaldo Nazário

Um dos melhores artilheiros da história do futebol aterrou com um estrondo em Barcelona, em 96/97, proveniente do PSV, onde deixou marca inolvidável. Experimentou a Série A ao serviço do Inter e regressou a Espanha para assinar pelos galácticos de Florentino Pérez, em 2002/03, onde se manteve até 2007.

Luis Enrique

Formado no Sporting de Gijón, Luis Enrique mudou-se para o Real Madrid em 1991/92, para uma casa que foi sua durante cinco temporadas. Trocou os blancos pelo rival em 1996/97, clube onde se manteve até 2004.

Michael Laudrup

O dinamarquês chegou a Barcelona para reforçar a 'Dream Team' de Cruyff em 1989, emblema que representou até 1994. Com alguma polémica, incorporou-se no Real Madrid, clube que representou até 1996.

Julien Lopetegui

O antigo técnico do FC Porto, durante a carreira de jogador, foi dono da baliza dos blancos entre 1989 e 1991. Sem espaço nos merengues, mudou-se para o Logroñés, antes de ser contratado pelo Barça onde atuou entre 1994 e 1996.

Bernd Shuster

Um dos poucos futebolistas da história a vestir as camisolas do Atlético de Madrid, Barcelona e Real Madrid. O alemão representou os blancos entre 1980 e 1988, e mais tarde vestiu a camisola culé entre 1988 e 1990.