Quarenta e seis anos depois o Estoril volta a vencer o FC Porto em sua casa para o campeonato, sendo a única equipa, até ao momento, a derrotar os dragões nos dois embates para a Primeira Liga esta época.
Para que tal acontecesse, foi preciso um conjunto de circunstâncias que, num curto espaço de tempo, alteraram por completo um jogo que os dragões dominavam desde o apito inicial, e onde a única dúvida seria sobre quando surgiria o primeiro golo azul e branco.
Três momentos quase consecutivos transformaram uma provável e inquestionável vitória numa derrota que deita praticamente tudo a perder no que ao título, e até à Liga dos Campeões diz respeito.
O jogo: O efeito dominó
Após três vitórias consecutivas para o campeonato, Sérgio Conceição fez alinhar de início o mesmo onze que começara diante do Vizela. Já do lado do Estoril, Vasco Seabra viu-se obrigado a duas alterações, trocando os lesionados Guitane e Pedro Álvaro por Tiago Araújo e Mangala.
Os dragões entraram em campo a assumir o controle da partida desde o minuto inicial; os bons resultados recentes davam aos azuis e brancos a confiança para partir para cima do Estoril, e mostrar que a pausa das seleções não tinha alterado a dinâmica da equipa. Contudo, a primeira oportunidade de golo foi mesmo dos da casa quando Cassiano, servido por Tiago Araújo na esquerda, obrigou Diogo Costa a defesa apertada.
Vendo por onde os estorilistas chegavam junto da sua área, Sérgio Conceição secou o filão, ao colocar Pepe a ajudar na cobertura do lado direito, anulando assim os desequilíbrios causados pela dupla Tiago Araújo/Rodrigo Gomes. A partir daí os canarinhos não mais criaram perigo, e o resto da primeira parte foi de sentido único em direção à baliza de Marcelo Carné.
O jogo ocorria num espaço de cerca de 50 metros, ou seja, o meio-campo estorilista. Através dos corredores, o FC Porto chegava frequentemente e com cada vez mais perigo junto da baliza adversária. O primeiro aviso foi dado por Wendell com um remate dentro da área que obrigou Carné a defesa de recurso, pouco depois foi Mangala a opor-se a um forte remate de Alan Varela e a desviar a bola da direção da baliza.
Mas a oportunidade mais flagrante surgiu aos 33 minutos quando Evanilson isola-se, tira Marcelo Carné do caminho, mas acaba por atirar contra Mangala, que também se colocou à frente da recarga de Francisco Conceição. Até ao intervalo manteve-se a mesma toada e o golo portista parecia apenas uma questão de tempo, tal foi o domínio dos azuis e brancos; em sábado de aleluia, o Estoril bem que podia dar graças por não estar a perder no final dos primeiros 45 minutos.
A segunda parte começou exatamente da mesma forma: FC Porto a dominar...e o Estoril a assustar; tal como fizera no primeiro tempo, a equipa da Linha teve a primeira oportunidade, quando Rodrigo Gomes cruzou para o coração da área, mas nem Cassiano, nem Heriberto, conseguiram finalizar uma jogada clara de golo.
Susto ultrapassado, os portistas voltaram à carga, empurrando o Estoril para a sua zona mais recuada. Os comandados de Vasco Seabra procuravam, ao contrário da primeira parte, esticar o seu jogo, mas apenas em momentos esporádicos.
Aos 57 minutos deu-se o grande caso do jogo; António Nobre assinala grande penalidade a favor do FC Porto, por considerar que Mangala derrubou Francisco Conceição; contudo, após (mesmo) muita conversa e a consulta das imagens, o juiz acabou por reverter a decisão...estava aberta a caixa de Pandora.
Revoltados pela decisão da equipa de arbitragem, os dragões perderam a calma, a concentração e, a partir daí, o controlo do jogo. Exemplo paradigmático foi o lance que levou à expulsão de Diogo Costa.
Uma bola aparentemente controlada por Otávio Ataíde é atrasada quase em balão para o guarda-redes azul e branco que, por melhor que seja a jogar com os pés (e é), deixou fugir o esférico, sendo assim obrigado a travar Wágner Pina em falta, quando este se preparava para atirar para a baliza deserta. Cartão vermelho direto, FC Porto com dez e perante um livre muito perigoso.
Ato contínuo e Cassiano, com a ajuda de um desvio em Wendell, converteu o pontapé livre da melhor forma, colocando, inesperadamente, o Estoril em vantagem no marcador. Depois de mais de uma hora a alta velocidade, e que parecia levar os dragões pela autoestada da vitória, o FC Porto era vítima de um acidente em cadeia que deitou por terra os índices anímicos da equipa.
Para tentar controlar danos e evitar que os azuis e brancos entrassem numa espiral descendente, Sérgio Conceição refrescou a equipa com as entradas, primeiro de Sánchez e Iván Jaime, e depois de Eustáquio e Namaso; contudo o mal já estava feito e os jogadores viam o seu esforço tolhido por uma aparente revolta contra o que acontecera naqueles breves minutos.
Até final pouco ou nada se jogou. António Nobre ainda mostrou mais dois cartões vermelhos, um por acumulação, a Francisco Conceição, por colocar a mão na cara de Pina, e outro direto a Bernardo Vital, ao travar Namaso quando este se isolava.
O relvado da Amoreira tornava-se num barril de pólvora que esperava o apito final para explodir, e nem a chuva forte que caiu nos últimos minutos do jogo ajudou a resfriar os ânimos. Mal após António Nobre ter dado o jogo por terminado, aconteceu aquilo que todos esperavam, com jogadores e 'staff' do FC Porto a expressar veementemente o seu desagrado ao árbitro António Nobre.
Contudo o mal já estava feito, os dragões sofriam a sua terceira derrota esta temporada diante do Estoril e, salvo um conjunto totalmente inusitado de circunstâncias, diziam adeus ao título e, muito provavelmente, também à Liga dos Campeões. A sete jornadas do final, o FC Porto está a nove pontos do segundo, o Benfica, e a dez do líder Sporting, que tem um jogo a menos.
Do lado estorilista, a vitória permitiu à equipa saltar para o décimo lugar, com os mesmos 28 pontos do Gil Vicente, afastando-se um pouco mais da zona perigosa da tabela.
O momento: E de repente tudo mudou
Minuto 65, o FC Porto acabara de lhe ver negada uma grande penalidade e procurava recuperar a concentração para voltar à carga em busca do golo. Pressionado por um adversário, Otávio Ataíde faz um mau atraso para Diogo Costa; o guarda-redes, conhecido pelo bom jogo de pés, não consegue dominar em condições uma bola difícil, permitindo a Wagner Pina roubá-la. Perante este erro e a baliza totalmente aberta, o guardião portista faz falta sobre o adversário, acabando por ver o cartão vermelho direto; era o início do fim para os dragões no jogo.
O melhor: Rodrigo é um perigo
Rodrigo Gomes alinhou, como de costume, como extremo esquerdo, com Tiago Araújo nas suas costas. Nos minutos iniciais da partida, foi precisamente através do corredor canhoto que os estorilistas canalizaram o seu jogo, e de onde saiu a grande oportunidade desperdiçada por Cassiano logo aos sete minutos.
Na segunda parte, e apesar do constante domínio do adversário, o Estoril procurou ser mais afoito no ataque, procurando frequentemente a velocidade do extremo português para chegar perto da baliza portista. Rodrigo Gomes foi o principal catalisador do ataque canarinho, e que ganhou mais preponderância a partir do momento em que a sua equipa ficou em vantagem numérica e no marcador, utilizando a sua grande velocidade para frequentemente deixar para trás os seus adversários. Teve o golo nos pés aos 74 minutos, mas acabou por falhar por muito pouco; certamente estará no plantel principal do SC Braga na próxima época.
O pior: Descoberto o filão do lado do João
O FC Porto dominou a esmagadora maioria do encontro, beneficiando de mais posse de bola e oportunidades. Contudo, não esteve imune às rápidas transições ofensivas do Estoril, e que eram mormente feitas pelo corredor esquerdo. Aí João Mário não foi capaz de fechar a porta do seu lado, por onde os canarinhos conseguiam aproximar-se mais facilmente da área adversária.
Se na primeira parte se pode atribuir esta dificuldade do lateral direito ao pouco apoio que teve de Francisco Conceição nas tarefas defensivas, na segunda parte o internacional português mostrou enormes dificuldades em travar Rodrigo Gomes que, justificadamente, continuou a insistir sobre o adversário. Deu o seu lugar a Jorge Sánchez, numa altura em que os dragões procuravam chegar ao empate.
O que disseram os treinadores:
Vasco Seabra, treinador do Estoril
Pinto da Costa, presidente do FC Porto
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