Analistas ouvidos pela Lusa alertaram para a situação financeira "muito debilitada" das Sociedades Anónimas Desportivas (SAD) em Portugal, muito endividadas, e referiram que o problema surgiu logo na sua criação.

O economista da IMF - Informação de Mercados Financeiros, Filipe Garcia, advertiu para a situação financeira "muito debilitada" das SAD, uma vez que estas se encontram fortemente endividadas, o que arrisca a sua capacidade de solvência.

Segundo Filipe Garcia, alguns analistas falam mesmo em “falência técnica”.

Numa perspetiva de dividendos a receber, referiu, as SAD nunca pagaram dividendo, nem se espera que o façam ou possam fazer.

Numa perspetiva de valorização do capital próprio, acrescentou, "percebe-se que a trajetória de resultados dos exercícios ao longo do tempo é negativa, já houve necessidade de aumentos de capital para injeção de tesouraria e não é objetivo central das SAD o lucro e a valorização do seu capital".

Assim, sinalizou à agência Lusa, perante resultados positivos, as SAD têm optado por outros caminhos que não os da valorização do capital e do retorno ao acionista.

"O endividamento explícito e implícito das SAD é de grande dimensão, conferindo riscos de insolvência importantes. Portanto, é difícil, do ponto de vista meramente económico-financeiro, compreender a compra de ações de uma SAD numa perspetiva de longo prazo", disse Filipe Garcia.

Para o economista, deste modo, comprar ações de uma SAD poderá ter três dimensões lógicas.

Uma, sustentou, é ser um terreno especulativo em que quanto mais participantes, mais volatilidade e maior possibilidade de retorno.

"É um tipo de evolução em que se acredita que eventos como vitórias, prémios, transferências e rumores fazem variar as cotações. É também neste tipo de ambiente de mercado que alguns detentores de posições mais relevantes podem tentar criar tendências para conseguir comprar ou vender a melhor preço, mas estamos sempre a falar no domínio da especulação com base na variação das cotações e não por se entender que a SAD trará retorno para o acionista", indicou.

A segunda dimensão é a do prémio de controlo, ou seja, acreditar que pela posição adquirida ou por evolução da legislação (que não permite que o controlo saia dos clubes) as ações possam permitir uma guerra acionista pelo controlo das SAD, sendo que a questão do imobiliário detido pelas SAD é um aspeto a ter em conta.

A terceira dimensão, continuou, é a da influência nas decisões das SAD: "este aspeto seria sempre discutível, mas é plausível que uma determinada entidade entre ou tenha entrado no capital de uma SAD tendo em vista benefícios próprios decorrentes da gestão da SAD ou no seguimento de um protocolo anterior".

Lateralmente, conclui, há questões "emocionais e de desinformação".

Contactado pela agência Lusa, o diretor de negociação do Banco Carregosa, João Queiroz, concorda com a necessidade de se olhar para a situação financeira das SAD, mas lembrou que o problema surgiu logo de início, desde que surgiu o formato das SAD.

"Por isso é que são mais observadas e seguidas por um tipo de investidor menos avesso ao risco, mais complacente", disse ainda, lembrando o formato de “bola de neve de empréstimos obrigacionistas”, ou seja, pedir um empréstimo obrigacionista para reembolsar o empréstimo anterior.

As emissões obrigacionistas são, segundo os analistas, um instrumento muito utilizado pelas três sociedades ligadas a clubes de futebol (Porto, Sporting e Benfica) e destinam-se normalmente a investidores individuais (adeptos, simpatizantes, sócios do clube), mas não só, investidores estratégicos ou os que estão à procura de taxas de rendibilidade elevadas ('yelds'), já que este tipo de investimento paga um juro acima do oferecido pelos depósitos e tem-se apresentado como um investimento historicamente seguro.