Um dos arguidos no processo relativo ao atropelamento mortal de um adepto italiano junto ao Estádio da Luz, em Lisboa, em 2017, garantiu hoje na segunda sessão do julgamento não ter estado no local do crime.

No Campus de Justiça, em Lisboa, só estiveram presentes hoje três dos 22 arguidos no processo: Danilo Ossuman, Diogo Medeiros e Luís Pina.

Marco Ficini morreu atropelado nas imediações do Estádio da Luz, em abril de 2017, na sequência de confrontos entre apoiantes de Benfica e Sporting, antes do dérbi entre as duas equipas, em Alvalade.

Luís Pina, suspeito de ter atropelado Ficini, é o principal arguido deste processo, que junta 10 adeptos com ligação aos No Name Boys e 12 afetos à Juventude Leonina.

“Estive em Alvalade, não na altura em que os adeptos do Benfica lançaram os ‘verylights’. Fui depois do jantar e saí de lá por volta da 01:30/02:00. Fui para casa depois, não fui ao Estádio da Luz”, explicou Danilo Ossuman, um dos arguidos com ligações à claque do Sporting.

O seu advogado, Aníbal Pinto, confrontou-o com a observação de três fotogramas para ver se se reconhecia em alguma delas. O arguido respondeu que não: “A minha fisionomia é diferente, aquela pessoa é mais larga”.

A sessão continuou depois com a audição de vários agentes da PSP da Unidade Metropolitana de Informações Desportivas, conhecidos como ‘spotters', já que trabalham em conjunto com as claques dos principais clubes.

Paulo Martins, que integra a equipa desde 2005, revelou ter ido “de forma informal” à Polícia Judiciária “para visualizar as imagens das câmaras do Estádio da Luz”, acrescentando não ter tido acesso às das câmaras do Estádio de Alvalade.

Questionado se nas imagens tinha identificado o adepto italiano que morreu, Paulo Martins explicou que “não tinha como o conhecer, já que nunca tinha lidado com ele”.

Também Nuno Leandro garantiu que a PSP “não fez investigação", tendo apenas colaborado com a Polícia Judiciária no visionamento das imagens.

O agente da PSP referiu ter ido “uma ou duas vezes” visionar as imagens no “programa media player e não no bose” [que dá para fazer zoom às imagens].

“A investigação foi da PJ, nós dissemos que nos parecia este ou aquele”, frisou Nuno Leandro.

Luís Pereira foi o primeiro inspetor da Polícia Judiciária a tomar contacto com o corpo de Marco Ficini, quando passava perto das imediações do Estádio da Luz, e viu “bastantes indivíduos a correr até ao [Centro Comercial] Colombo”.

“Havia bastante lixo espalhado, copos de plástico e pedras. No lado esquerdo da Avenida Lusíada vi um indivíduo caído, de barriga para baixo, bastante sujo”, disse Luís Pereira, acrescentando que não mexeu no corpo, mas que seguiu os protocolos de emergência médica e viu que este “não tinha sinais vitais no pulso e no pescoço”.

Luís Pereira explicou ainda ter visto um carro “que pela volumetria parecia um BMW” e ouviu um comentário vindo daquela direção: “Vamos embora que é um dos dele”.

O agente contou que ligou para o 112 para dar conta do cadáver, mas como não foi atendido ligou para a sua unidade, tendo depois entrado no carro e dado “duas a três voltas” para ir atrás do carro que tinha arrancado porque tudo indicava que “tinha sido um atropelamento”.

“Quando lá cheguei já lá estava a PSP e o INEM. Estiveram quase uma hora em manobras de reanimação. Disseram que o corpo estava muito sujo com marcas de um veículo que teria passado por cima. Que teria sido um atropelamento com fuga”, continuou.

Luís Pereira explicou também ter parado o carro junto ao homem caido no chão porque “estava um carro a descer de marcha atrás do acesso ao Eixo Norte-Sul, logo após a rotunda Cosme Damião”, referindo, igualmente, que o carro em questão bateu no lancil de cimento.

Já António Rajada, igualmente ‘spotter’ da PSP, testemunhou que fazia a monitorização dos adeptos juntos aos dois estádios e garantiu não ter visto “nenhum acidentes até terminar o turno”.

Por seu turno, João Fernandes, inspetor da PJ, na altura dos incidentes na secção de homicídios, explicou que quando chegou à rotunda nas imediações do Estádio da Luz o corpo ainda lá estava.

“Foram recolhidos exames. Na cabeça, tronco e membros havia marcas de atropelamento e do corpo ter sido arrastado”, explicou João Fernandes, avançando haver vidros partidos e objetos pertencentes a viaturas à frente do corpo.

No tribunal estiverem ainda presentes familiares de Marco Ficini, nomeadamente o irmão e a cunhada, uma amiga de infância e o pai desta e uma amiga da família “há mais de 40 anos”.

Todos atestaram que a mãe de Marco dependia financeiramente do filho, já que este vivia com ela em Roma e que era um “trabalhador exemplar”.

“Marco vivia com a nossa mãe Gabriela. Voltou para Roma para viver com ela porque a sua reforma não era suficiente. Ele tinha um contrato por tempo indeterminado com a empresa que lhe pagava cerca de 39 mil euros ano”, disse Andrea Ficini, de 51 anos, irmão da vítima.

Hoje, o julgamento prossegue durante a tarde com a audição de testemunhas, estando já agendadas uma nova sessão para 18 de fevereiro.

Em 16 de abril de 2018, o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa decidiu levar a julgamento Luís Pina pelo homicídio de Ficini e por outros quatro homicídios na forma tentada, enquanto os restantes 21 arguidos são julgados pelos crimes de participação em rixa, de dano com violência e de omissão de auxílio.